Quadrinhos
Sombrio e noir, Demolidor completa 60 anos nos quadrinhos
Personagem dos quadrinhos da Marvel foi criado em 1964 por Stan Lee e Bill Everett, mas sua a fase de ouro foi com Frank Miller
Última atualização: 26/04/2024 18:33
Um dos principais personagens da Marvel está virando sexagenário em 2024. Demolidor (Daredevil), o Homem sem Medo, debutou na editora norte-americana em abril de 1964, em sua própria revista, a Daredevil. Ele foi originalmente criado pelo argumentista Stan Lee e pelo artista Bill Everett. Jack Kirby participou com ideias gráficas.
Nos primórdios, o Demolidor tentava surfar na onda do sucesso do Homem-Aranha. A origem era muito parecida. Assim como Peter Parker, Matthew Murdock era um jovem de Nova York que desenvolvia poderes a partir de um acidente científico. No caso, o garoto, morador do bairro Hell's Kitchen, foi exposto a lixo radioativo enquanto tentava salvar um transeunte de um caminhão desgovernado. Ele ficava cego, mas todos os seus demais sentidos ficaram aguçados. Eventualmente, passava a usar seus poderes para combater o crime, depois que seu pai, um boxeador, foi morto por gângsteres ao se recusar a entregar uma luta.
O Demolidor teve altos e baixos editoriais. Seu primeiro visual, amarelo e vermelho, foi modificado para um uniforme vermelho logo nos primeiros números. Embora tenha seguido em publicação, passando pelas mãos de grandes artistas como Marv Wolfman e roteiristas como Jim Shooter, o personagem conheceria seus anos de ouro apenas na década de 1980, quando começou uma fase mais sombria, iniciada pelo artista Roger McKenzie. Mas foi o arte-finalista dele, Frank Miller, que eventualmente assumiria sozinho o argumento e arte e elevaria o Demolidor ao status de personagem cultuado.
Miller ficou na série entre 1980 e 1983. Além da arte de alta qualidade e da narrativa inovadora, o Demolidor de Frank Miller tinha uma forte inspiração no policial noir e um clima sombrio, com um herói amargo cercado de gângsteres, assassinos e figuras desesperadas. O trabalho na série acabou rendendo a Miller a missão épica de refazer Batman, na concorrente DC. Lá, ele criou a minissérie Cavaleiro das Trevas e reformulou a origem do homem-morcego (só como argumentista) em Batman: Ano Um.
O Demolidor seguiu cultuado na Marvel mesmo após a saída de Frank Miller, mas, curiosamente, não conseguiu atingir o mesmo sucesso no universo cinemático. Um filme com o personagem com Ben Affleck no papel principal desagradou público em crítica em 2003, quando a moda dos super-heróis ainda estava começando. O herói foi retomado em uma série da Netflix de 2015 a 2018, mas a produção foi cancelada. A Marvel incluiu Matt Murdock no MCU, em pontas no Homem-Aranha, na série da Mulher Hulk e em Eco, sempre com o mesmo ator da série da Netflix, Charlie Cox. Uma nova minissérie da Marvel sobre o Demolidor, Daredevil Born Again, está atualmente em pós-produção.
Independentemente de sua carreira nas telas, o Demolidor teve influência importante nos quadrinhos norte-americanos e na própria cultura pop. Os experimentos gráficos e temáticos de Frank Miller com o personagem, além de eventualmente influenciarem Batman, também ajudaram a criar toda uma fase de ouro das graphic novels - como eram chamadas as publicações especiais de quadrinhos, feitas em papel nobre. Com argumento de Miller e arte em aquarela de Bill Sienkiewicz, a graphic novel Amor e Guerra pavimentou o caminho para a minissérie da Elektra com o mesmo desenhista, uma de muitas propostas graficamente ousadas tanto da Marvel quanto da DC.
Elektra, a vilã que eventualmente virava interesse amoroso do Demolidor nas histórias de Frank Miller, também fez parte de um fenômeno cultural mais amplo. Fã da cultura japonesa, Miller criou a personagem imersa em uma cultura bélica do Japão feudal. Curiosamente, graças à popularidade das histórias do Demolidor na época, algumas das antigas armas japonesas que ela usava chegaram a se popularizar nas ruas.
Além de tudo isso, o Demolidor também foi um pioneiro tematicamente. Foi um dos primeiros protagonistas PCD no universo mainstream dos quadrinhos norte-americanos. Décadas antes de virar moda incluir personagens com limitações físicas, Matt Murdock já era um super-herói mesmo com deficiência visual. E, além disso, também era de origem humilde. Diferentemente da DC, onde havia milionários como Batman ou princesas como a Mulher Maravilha, a Marvel tinha personagens comuns às voltas com falta de dinheiro e problemas sociais. Desde sua origem, nos anos 1960, Demolidor era um morador de bairro barra pesada provindo de família pobre e que passou a vida no meio de uma vizinhança perigosa. Não é à toa que seu epíteto, na Marvel, era "o homem sem medo".