Tem um personagem dos quadrinhos de aniversário agora em agosto. Mas não cante parabéns, porque o cara não é de brincadeira e não gosta de perder tempo com futilidades. O guerreiro puritano Solomon Kane acaba de virar cinquentão na Marvel, onde começou a ser publicado em agosto de 1973. Ele apareceu pela primeira vez em Monsters Unleashed, em aventura com argumento de Roy Thomas e desenho de Ralph Reese.
Solomon Kane é um puritano, pertencente a um grupo religioso radical inglês do século 16. O personagem é um espadachim amargo que percorre o mundo combatendo o mal em diversas manifestações. Enfrenta demônios, bruxas, combate possessões e luta contra feiticeiros.
Na Marvel, Solomon Kane veio na mesma senda de espada e magia que consagrou Conan, o Bárbaro e Kull. Assim como os dois personagens, ele foi originalmente criado nos livros, ainda na década de 1920, por Robert E. Howard. O escritor era um dos chamados autores de pulp, contos vendidos em revistas baratinhas de terror, aventura e ficção científica nos Estados Unidos. Foi lá que nasceram Conan e Solomon Kane. O puritano surgiu em 1928. Apesar de relativo sucesso no mundo das pulps, Solomon Kane só ganharia mais destaque público a partir dos quadrinhos da Marvel, de 1973 em diante. Mesmo assim, tornou-se figura menos conhecida que Conan e Kull.
Enquanto Conan ficou mais famoso, teve evolução editorial pródiga na Marvel e ganhou filme ainda nos anos 1980, Solomon Kane sempre foi mais cult. Diferente do bárbaro Conan, Solomon Kane não era um personagem tão simpático ou carismático. O puritano não tinha muitos amigos e era sempre descrito como um fanático religioso extremamente violento. Era o anti-herói por excelência.
Outro detalhe curioso das histórias fica por conta da própria constituição do personagem. Como puritano, Solomon Kane não acreditava em relações efêmeras. Era solteirão convicto e recusava-se a ter qualquer envolvimento romântico. Entretanto, nas histórias em quadrinhos da Marvel, tradicionalmente voltadas para o público adolescente masculino, este traço do herói podia representar problemas mercadológicos. Assim, Solomon Kane sempre vivia cercado de mulheres, que geralmente o procuravam como guerreiro, mas nunca com qualquer insinuação romântica. As capas mostravam Solomon em volta de algumas divas, e até carregando beldades nos braços, no melhor estilo Conan. A diferença era que enquanto o bárbaro era mostrado como conquistador, Solomon Kane era bem mais recatado e quadradão.
Seja como for, apesar de não ter alcançado o sucesso editorial das outras adaptações da Marvel para os personagens de Robert E. Howard, Solomon Kane colecionou uma galeria impressionante de artistas. Chegou a ser desenhado por Barry Smith, Ernie Chan (famoso como arte-finalista de Conan), Bernie Wrightson, Greg Staples, Jeff Jones, Steve Gan, Howard Chaykin, John Buscema e até Richard Corben.
Com a popularização das adaptações cinematográficas de super-heróis, Solomon Kane ganhou filme em 2009, vivido por James Purefoy. Entretanto, não decolou. Porém, em tempos de personagens cada vez mais violentos nos quadrinhos e no cinema, a chance é grande de que cedo ou tarde Solomon Kane seja redescoberto e vire astro no streaming ou em alguma adaptação animada.
Legado nos quadrinhos e impacto na cultura pop
Como personagem de ficção popular, Solomon Kane fez parte da primeira geração dos anti-heróis. A cruza de temática religiosa ou folclórica com ação, que era um dos ingredientes do gênero espada e magia, influenciou personagens posteriores, como o italiano Zagor. No cinema, a tentativa de transformar Van Helsing em um justiceiro com moral religiosa, no filme de 2004, é ainda hoje acusada por fãs de copiar descaradamente o universo de Solomon Kane.
Solomon Kane também inspirou toda uma geração de anti-heróis com tendências radicais. Outras figuras populares dos quadrinhos e do cinema também seguem a fórmula de adotar códigos pessoais de ética inflexíveis, não raro reforçados por violência exacerbada. É o caso de outra das figuras da Marvel, o Justiceiro (Punisher), praticamente um Solomon Kane transplantado para o meio urbano. Como Kane, o Justiceiro não tem envolvimentos românticos, não faz acordos, não sorri e persegue obstinadamente um código moral, geralmente de forma violenta.
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