Um mistério zoológico gaúcho acaba de virar notícia internacional, depois de ter originado um artigo científico publicado em um periódico global. Um animal que foi recolhido em Vacaria em 2021, depois de ter sido atropelado, havia intrigado os especialistas do Núcleo de Conservação e Reabilitação de Animais Silvestres, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Estava difícil classificar o bicho, que tinha traços tanto de um cachorro quanto da espécie selvagem chamada raposa-do-pampa. O animal já morreu, mas depois de exames que envolveram duas universidades, os especialistas acreditam que era um híbrido entre as duas espécies. Um fenômeno raríssimo.
Foto: Reprodução/Thales de Freitas
Os resultados foram publicados agora em agosto de 2023 na revista científica internacional Animals. O artigo se chama “Hybridization in Canids—A Case Study of Pampas Fox (Lycalopex gymnocercus) and Domestic Dog (Canis lupus familiaris) Hybrid” (“Hibridação em canídeos: um estudo de caso de híbrido de raposa-do-pampa (Lycalopex gymnocercus) e cão doméstico (Canis lupus familiaris).”)
O artigo é assinado por um grupo de cientistas: Bruna Elenara Szynwelski, Rafael Kretschmer, Cristina Araujo Matzenbacher, Flávia Ferrari, Marcelo Meller Alievi e Thales Renato Ochotorena de Freitas. O trabalho explica como ocorreu a classificação e menciona que o caso é muito raro. Há outros exemplos de híbridos canídeos entre cães e animais silvestres, mas nenhum havia sido reportado ou estudado na América do Sul, só na África e Europa.
O artigo explica que “Na América do Sul, os habitats naturais dos canídeos selvagens sofreram grandes perturbações ambientais, o que levou a interações entre esses animais e cães domésticos (Canis lupus familiaris). Estudos anteriores documentaram a hibridização entre canídeos selvagens e cães domésticos na América do Norte e na Europa. No entanto, não há relatos de tal hibridização na América do Sul até agora”.
Como foi a pesquisa
O artigo segue explicando como uma fêmea canídea foi encaminhada, após ser encontrada atropelada em Vacaria, para o Centro de Conservação e Reabilitação de Animais Selvagens da UFRGS. “Este animal exibia características fenotípicas incomuns, apresentando características intermediárias entre cães domésticos e canídeos selvagens”, menciona o texto. “Nossa análise sugere que o canídeo sob investigação é um híbrido entre a raposa-do-pampa e o cão doméstico, mas estudos futuros são necessários para investigar outros casos dessa hibridização na natureza”, aponta o texto.
O processo de identificação incluiu a observação e classificação nas instalações da UFRGS e também mobilizou especialistas da Universidade Federal de Pelotas. Além das características do animal, como latido, hábitos alimentares e aspecto morfológico, também houve análise de DNA. O animal não sobreviveu, apesar dos cuidados, mas um exame posterior indicou que o número de cromossomos ficava entre o dos cães e o da raposa-do-pampa. Com base nisso, o grupo concluiu que é um híbrido.
Agora estão sendo realizados novos estudos e também pesquisas de campo para determinar se há outros animais semelhantes na natureza. Muitas vezes, híbridos não se reproduzem, como é o caso das mulas (híbrido de cavalo e burro). Entretanto, os especialistas acreditam que o animal fosse capaz de se reproduzir.
Após a publicação, o artigo científico despertou curiosidade da imprensa internacional. Entre os destaques estão os apelidos provisórios dados pela equipe para o bicho: “graxorra” ou”dogxim”, mesclando os nomes “graxaim” e “cachorro” ou “dog”.
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