A terça-feira (30) foi marcada por uma despedida precoce e dolorosa para a dona de casa Sirlei Ranson Padinha, de 54 anos, e a sua família. O neto dela, Miguel Henrique Padilha dos Santos, de 2 anos, foi sepultado pela manhã no Cemitério Municipal de Novo Hamburgo.
A volta para a casa, na Rua Pedro Petry, no bairro Rondônia, foi carregada de indignação, tristeza e lembranças do pequeno Miguel, especialmente, pelos últimos momentos antes da morte do menino no último domingo (28).
“Passou o dia rindo e brincando. Correu e jogou bola. De repente, ficou quietinho, até verifiquei se estava com febre, mas não”, lembra. Instantes depois, as convulsões começaram. “Peguei ele no colo e corri para a Brigada Militar, eles sempre nos ajudaram ali”, relata. Ela conta que buscavam ajuda no quartel da BM pela proximidade e porque a família não possui carro.
A dona de casa mora a cerca de 300 metros da sede do 3º Batalhão de Polícia Militar (3º BPM) que fica na Avenida Coronel Travassos. Segundo a mulher, desde que a família mudou-se para o local, em outubro do ano passado, já buscaram ajuda em outras ocasiões em que Miguel teve crises convulsivas.
Na residência, que fica nos fundos de outra casa, também residem os pais do menino falecido, de 21 e 28 anos, e o irmãozinho de apenas seis meses. No pátio, funciona uma oficina de veículos, que pertence ao dono da casa alugada pela família.
Na noite do domingo, pelo quadro da criança optaram mais uma vez em ir com a viatura da BM, pelo receio da demora da ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). Sirlei embarcou com o neto no carro da polícia, uma Duster, em direção ao Hospital Municipal. Ela lembra que além do giroflex, a sirene estava ligada.
No caminho, na esquina da Rua Bento Gonçalves com a Rua Flores da Cunha, a viatura foi atingida por um Prisma bordô. Com o impacto o carro da polícia bateu em outros dois veículos estacionados na rua antes de capotar. Sirlei conta que enquanto a viatura girava só rezada pelo seu neto, que estava no colo de um dos brigadianos. “Só escutei o barulho da batida e pedia pra Deus cuidar do meu neto”, recorda com os olhos cheios de lágrimas. Ela frisa que “foi tudo muito rápido. Só vi o impacto que deu e a viatura começou a capotar.”
Na memória, ainda cheia de tristeza, recorda do desespero dos policiais que tentavam salvar Miguel. “Quando a viatura parou de capotar, ele [policial que carregava a criança no colo] disse ‘meu Deus, cadê o bebê?’, daí olhei para o chão e ele [neto dela] estava embaixo da viatura, todo ensanguentado”, conta Sirlei.
De acordo com ela, o policial pegou a criança e com um motorista que passava pelo local, seguiu até ao hospital. Quem ajudou foi o enfermeiro Roberto Tyska Bueno, 50, que retornava da praia com a família e quando viu o acidente e parou para ajudar. “Foi uma fatalidade gigantesca”, disse à reportagem do ABC Mais.
Momentos de aflição
Sirlei conta que não sabe quem a ajudou a sair da viatura capotada, mas que viu o brigadiano ajoelhado pegando o neto dela para tentar salvá-lo. “Eu só queria saber para onde levaram meu neto”, lembra. A mulher conta, que em pouco tempo outros policiais militares chegaram no local do acidente e tentaram acalmá-la. “Me disseram que ele tinha ido para o hospital e estava sendo atendido.”
A dona de casa conta que teve pequenas escoriações e que a BM a levou para o hospital. “Quando cheguei, ele [soldado que socorreu Miguel no acidente] me abraçou. Se ajoelhou nos meus pés e disse: ‘me perdoa, minha senhora, me perdoa, não foi culpa minha’. Aí ele me abraçou e a gente chorou”, recorda. “Eu disse: ‘eu sei. A única coisa que eu quero que tu me diga é que meu neto está bem’”, complementa.
“Não me falaram nada. Só me deram a notícia [do óbito] quando meu filho e a minha nora chegaram”, diz emocionada. “Ele não tinha nenhum outro problema de saúde além da convulsão. Fazia os tratamentos e estava aguardando a consulta com o neuropediatra. Antes desse dia, fazia tempo que não tinha crises”, lamenta.
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O menino que completou 2 anos no último dia 8, chegou no Hospital Municipal com parada cardiorrespiratória e politraumatismos, conforme apontou o atestado de óbito. O laudo encaminhado ao Instituto Médico Legal (IML) aponta que Miguel teve fratura no pescoço, na perna, afundamento no crânio, além de outras lesões na cabeça, entre outros. A causa da morte será esclarecida pela perícia.
“Todos veículos deram passagem, nas vezes anteriores também, menos esse motorista. Até agora não sabemos quem é, nem o sexo da pessoa que estava guiando o carro nos disseram”, lamenta. A reportagem apurou que condutor do Prisma era um homem de 62 anos, morador de Novo Hamburgo. Procurado pela reportagem, disse que estava em reunião com a advogada e preferiu não se manifestar.
A família afirma que lutará por justiça. A Polícia Civil instaurou um inquérito para apurar o caso e nos próximos dias ouvirão os parentes de Miguel, envolvidos no acidente e testemunhas.
Reencontro com os brigadianos
Sirlei revela que a família ainda tem o desejo de reencontrar com os três policiais que socorreram Miguel quando estava em crise convulsiva. Ela conta que após o acidente e a confirmação da morte do neto, não tiveram a oportunidade de se falar. “Todos eles foram heróis”, destaca. Ela salienta que o objetivo é agradecê-los pela tentativa de salvar o seu neto.
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