Vítima de hemorragia cerebral, um menino de cinco meses é levado às pressas de uma creche para o hospital e imediatamente transferido a outro com UTI pediátrica, no Vale do Sinos. A causa é desconhecida, mas laudos médicos apontam “maus-tratos” e cogitam a “síndrome do bebê sacudido”.
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Os pais suspeitam do atendimento na escola infantil e a acusam de contradições, enquanto a direção da creche se resume em dizer que fez um ágil socorro. A criança se recupera, ainda com sangramento encefálico e nas retinas. A Polícia apura responsabilidades do caso, inicialmente tratado como lesão corporal.
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“Ainda não sabemos o que realmente aconteceu com o nosso filho. Já choramos muito, pensando no pior e com medo de sequelas, mas vai dar tudo certo”, relata um editor de vídeos de 30 anos. Ele conta que, no início da tarde de 6 de dezembro, ele e a esposa, uma assistente comercial de 28 anos, foram avisados de uma emergência com o filho na creche, na área central de Estância Velha.
Sem hematomas
“Recebemos a ligação da escolinha de que nosso filho havia sofrido uma queda do bebê conforto e batido a cabeça no chão. Foi levado às pressas ao Hospital Getúlio Vargas, aqui em Estância, e logo removido de ambulância para a UTI do Hospital Regina, em Novo Hamburgo.” Segundo ele, os médicos constataram, pela bateria de exames, entre eles tomografia, que não havia hematomas ou lesões externas.
“Nenhum roxo, nenhuma fratura no crânio, nada que indicasse uma queda. No dia seguinte, a gente foi à escolinha para entender o que de fato aconteceu. A professora e a diretora confirmaram, na nossa frente, que foi uma queda.” O pai foi depois à delegacia, onde fez boletim de ocorrência, e levou o caso também ao Ministério Público.
Pai questiona o atendimento, falta de imagens e mudança de versão
Segundo o pai, no momento do fato, o bebê era atendido por uma auxiliar de 16 anos. “Essa adolescente cuidava de uma turma de sete crianças.” A professora titular estaria fora da sala. “Não há câmera no cômodo onde estava meu filho. Somente na sala principal do berçário, onde aparece sendo socorrido pelas duas.” Ele frisa que o surgimento de uma nova versão da escola aumenta a suspeita de que algo possa estar sendo escondido.
“Para nossa surpresa, no depoimento à Polícia, a diretora disse que não houve queda, que não teve tombo. Agora falam que a professora estava com ele e outro coleguinha quando percebeu que meu filho estava se revirando no bebê conforto e passou mal. É uma incógnita muito angustiante para nós, pais, não saber o que de fato aconteceu com nosso filho.”
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Delegado aguarda definição da causa
O delegado de Estância Velha, Rafael Sauthier, expõe que falta esclarecer o principal ponto para avançar nas investigações. “É um caso complexo, delicado. Enquanto não tivermos uma definição médica sobre o que a criança sofreu, não podemos afirmar se houve ou não responsabilidade da escola. Algumas situações já foram descartadas e outras seguem sob apuração.”
A creche se posiciona de forma sucinta. “O bebê passou mal na escola e foi prontamente atendido e levado à unidade de saúde mais próxima.” O nome da instituição, que é privada mas atende crianças também por meio de convênio público, não é informado porque a investigação está na fase inicial. O bebê lesionado estava matriculado há um mês e meio de forma particular.
Menino recebeu alta neste domingo
Depois de nove dias na UTI, o bebê foi para um quarto na sexta-feira (15). Na tarde deste domingo (17), recebeu alta. Vai precisar fazer fisioterapia e terá acompanhamento de neurologista e oftalmologista. “A hemorragia nas retinas vai saindo aos poucos, da mesma forma que o sangramento na cabeça. Segue com dificuldade na visão e está fraquinho”, comenta o pai. A família pede para não ser identificada.
Sociedades médicas alertam para traumas em bebês
O relatório da alta médica não dá diagnóstico, mas menciona “maus-tratos”. Laudos dos primeiros atendimentos e durante a fase da UTI indicam “provável síndrome do bebê sacudido”. A pediatra responsável pelo atendimento não quis falar sobre o problema nem passar orientações para prevenção.
A Sociedade Brasileira de Pediatria coloca que o nome pode parecer inusitado e até engraçado para quem não conhece, mas observa que a síndrome do bebê sacudido se trata de uma situação séria capaz de severas consequências.
Movimentos bruscos, conforme a Sociedade Brasileira de Ortopedia Pediátrica, é uma das formas mais graves de agressão à criança pequena, pois leva a lesão cerebral e é capaz de deixar sequelas de acordo com a força e intensidade.
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“Pode desencadear desde micro hemorragias no sistema nervoso central, por ruptura de vasos sanguíneos, formação de hematomas e rompimento de fibras nervosas, lacerações de tecido cerebral até hemorragias maciças e morte, sem que haja fratura de calota craniana.”
A entidade salienta a fragilidade física das crianças, principalmente até os 2 anos. “O tamanho da cabeça relativamente grande em relação ao corpo, a anatomia de coluna cervical, a fraqueza de musculatura cervical e o menor grau de mielinização (desenvolvimento do cérebro) fazem com que possa haver lesão de massa encefálica, sem que se evidenciem sinais externos evidentes de trauma.”