OPINIÃO
Fernando Haddad dá uma rasteira nos setores que mais empregam no País
Mudar as regras do jogo em pleno 29 de dezembro é, no mínimo, uma irresponsabilidade do ministro que fez um bom ano na condução da economia
Última atualização: 29/12/2023 12:22
Não há dúvidas de que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), foi um dos principais personagens deste primeiro ano do governo Lula 3. Contrariando previsões negativas que vinham de todos os lados – inclusive de dentro do PT –, conduziu a economia de forma que o País chegasse ao fim do ano com inflação controlada, juros em queda, emprego em alta, expectativa razoável para 2024 e, o mais importante, reformas aprovadas – a tributária era uma briga de 30 anos.
Antes de sair de férias, porém, Fernando Haddad deu uma rasteira nas empresas dos setores que mais empregam no País. Somadas, elas respondem por algo como 10 milhões de postos de trabalho. É quase um Rio Grande do Sul inteiro de gente trabalhando e, com seus salários, ajudando a movimentar a economia.
Fernando Haddad anunciou na manhã de quinta-feira (28) e publicou no Diário Oficial desta sexta (29), em pleno início de feriadão da virada de ano, medida provisória com a reoneração gradual da folha de pagamento. Lembrando que medida provisória tem validade imediata, ou seja, a partir do dia 1º de janeiro de 2024. É verdade que alguns dos efeitos da MP passam a valer a partir de 1º de abril, mas ainda assim é uma mudança muito grande e pouco tempo.
Se na economia doméstica o planejamento é fundamental, imagina em uma empresa com dezenas de empregados e negociações de toda ordem com fornecedores e clientes, muitas vezes até de fora do País? Qual a chance de isso dar certo?
É grave que essas empresas partam para o recesso de fim de ano com uma regra de jogo e retornem no primeiro dia útil de 2024 com outra. Insumos foram contratados, produtos foram vendidos e orçamentos definidos a partir de um cenário. Só que, literalmente de um dia para o outro, o cenário mudou. O governo não pode agir assim.
Ao desfazer na canetada aquilo que o Congresso Nacional aprovou dias atrás por ampla maioria – a prorrogação da desoneração até 2027 foi promulgada pelo Congresso nesta quinta-feira (28) –, Fernando Haddad criou um cenário turbulento para os negócios neste início de ano. Amplia a insegurança jurídica, reduz a competitividade, incentiva o desemprego e o aumento de custos – transporte coletivo e de cargas estão entre os setores impactados.
A preocupação do ministro em aumentar a arrecadação para zerar o déficit público em 2024 é correta e necessária. Mas, nesse caso, os fins não podem justificar os meios. A empresa não pode, em menos de 100 dias, ter seu custo com pessoal ampliado de forma significativa sem qualquer negociação ou período de transição razoável. É irresponsável. Estamos falando em cerca de R$ 100 mil a mais por mês no caso concreto de uma empresa com pouco menos de 200 funcionários.
E a situação fica ainda mais absurda porque qualquer medida provisória do governo precisa ser mantida ou derrubada pelo Congresso Nacional em até 120 dias. Ou seja: em quatro meses, no máximo, deputados e senadores vão votar e, muito provavelmente, derrubar as medidas de Haddad. E no meio disso tudo estará o setor produtivo, tentando escapar desse tiroteio.
O governo precisa arrecadar mais? Sim. É bom para a economia quando as contas públicas estão ajustadas? Sim. Há empresas e setores que se manteriam sem a desoneração ou com auxílio bem menor do governo? Sim. Tudo isso é verdade. Mas também é verdade que há setores mais sensíveis, que vão perder competitividade e até entrar em crise com as regras de Haddad. Uma rodada de conversa e uma transição mais razoável não fariam mal a ninguém.
O ministro mandou bem em 2023, mas poderia terminar o ano sem essa.
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