Opinião
CATÁSTROFE NO RS: Uma tragédia ainda longe do seu fim
Previsão de mais chuva e o recuo lento das águas mostra que cenário dramático se estenderá por dias
Última atualização: 09/05/2024 22:37
Para quem não teve a casa afundada nas águas dos rios e arroios nesta que é maior tragédia climática do Rio Grande do Sul é difícil imaginar o que milhares de famílias desabrigadas estão passando neste momento.
E talvez até as pessoas desabrigadas ou desalojadas também ainda não tenham ideia do que elas ainda vão passar daqui para frente. Que o retorno para o lar (ou para o lugar onde ficava o lar) talvez demore muito mais que o esperado e que, quando ocorrer, será em meio a uma realidade dolorosa de perda, de impotência e até raiva. Sentimentos que terão que dar lugar à força para se reerguer.
Depois de uma pandemia como a da Covid alguém poderia pensar que nada pior pudesse acontecer. Mas esta catástrofe é devastadora para quem foi atingido e perdeu tudo. Tudo mesmo. De roupas, móveis e eletrodomésticos a documentos, fotos objetos e recordações afundadas em águas fétidas.
E estamos falando de milhares e milhares de pessoas. Famílias que hoje vivem da caridade para poder comer, dormir se aquecer e até beber água. Milhares em abrigos públicos. Outras milhares em casas de amigos, conhecidos ou até de pessoas que abriram suas portas para quem precisasse sem importar quem eram os necessitados.
A realidade desta devastação que atingiu centenas de cidades é desoladora. Incalculável dor.
Nos resta acolher neste momento, ajudar na recuperação e, então, buscar junto às autoridades os recursos necessários para viabilizar soluções que evitem algo assim de novo. E sem esta história de que foi algo que nunca se viu e que dificilmente irá acontecer.
É preciso entender que vai acontecer de novo. Talvez não brevemente ou até demore mais 80 anos como ocorreu com até então cheia histórica gaúcha e mais trágica em 1941.
Sim, foram executadas obras pensando nesta antiga enchente. Mas, na esperança de que nunca mais fosse acontecer algo igual ou pior, casas foram construídas em locais alagadiços e de risco; asfalto e concreto tomaram conta das nossas cidades sem pensar em questões ambientais ou até mesmo de escoamento e drenagem.
Fomos tomando as áreas próximas dos rios e arroios sem se importar que estávamos limitando o curso das águas, sem respeitar a natureza.
Bombas de água que são proteção contra cheias e que têm que ser desligadas por causa de uma cheia parece algo inaceitável. É preciso repensar os sistemas, que, é bem verdade, por incrível que pareça, evitaram algo que poderia ser ainda pior.
Não se trata de eleger culpados, mas de avaliar o que deu errado e o que é preciso fazer para que isso não se repita, inclusive, agora, pensando em que vivemos tempos em que a tendência é tudo piorar devido ao desenfreado processo de crescimento populacional (algo que é preciso ser avaliado também, para o bem do planeta) e habitacional.
Não dá mais para permitir que áreas de risco sejam habitadas. A ação do poder público deve ser imediata neste sentido. Ao sinal de ocupação irregular, reassentamento em outra área. É preciso planejar. É preciso prevenir. Remediar é viver o caos que estamos enfrentando. Isso não é mais aceitável.
Se temos 50 bilhões de reais para sanar o caos, é porque tem dinheiro "em caixa público". Ou seja, poderíamos ter aplicado tudo isso em sistemas mais eficientes de combate às cheias no Rio Grande do Sul.
Não é possível que depois de uma Boate Kiss, tenhamos outro incêndio como aquele.
Não é possível que depois do que houve em Brumadinho (MG), tenhamos outra barragem de dejetos soterrando uma cidade e vidas.
Não é possível que depois de toda esta devastação das cheias no RS, com mortes e perdas, tenhamos outra cheia para lamentar.
Não, não é mais possível.
Esta tragédia está longe do fim (levaremos dias, semanas, meses e até anos para superar), mas é preciso acabar com esta nossa atitude de achar que o pior não está por vir.
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