A Alemanha está procurando novos profissionais qualificados estrangeiros, que não sejam de países da União Europeia (UE). Para isso, um novo sistema de vistos foi lançado no início de junho. Para quem quer ir para fora do Brasil, esta pode ser uma ótima oportunidade. Mas como é trabalhar por lá?
Essa novidade com os vistos, que visa mitigar a escassez de mão de obra que o país enfrenta, facilita a entrada de estrangeiros desde que atendam aos pré-requisitos estabelecidos.
Especialistas em TI e enfermeiros são os profissionais mais demandados. Mas muitos brasileiros já consideravam a Alemanha um destino atraente para viver e trabalhar mesmo antes dessa mudança.
É o caso do engenheiro mecânico Igor Teles, de 28 anos. Em 2015, o cearense participou de um intercâmbio de um ano no país por meio do programa Ciência Sem Fronteiras.
Após a experiência, retornou ao Brasil, finalizou a graduação e começou a trabalhar em sua área. Insatisfeito com o rumo da carreira, decidiu cursar mestrado em Munique, na Alemanha, onde reside desde 2018.
Teles é um dos 160 mil brasileiros que vivem atualmente na Alemanha, segundo dados do Ministério das Relações Exteriores.
“O que me motivou a voltar para a Alemanha foi a experiência positiva que tive aqui anteriormente, e as oportunidades na minha área”, diz Teles. “Além disso, o trabalho em Fortaleza (CE) não foi como eu esperava. Esses fatores me incentivaram a tentar e deu certo.”
Teles trabalha desde 2021 em uma empresa que presta consultoria e desenvolve planejamento técnico para prédios industriais e comerciais. O departamento em que atua é responsável pelo fornecimento de energia e descarbonização de indústrias.
Como funcionam as férias e carga horária na Alemanha
O esquema de férias é um ponto positivo, revela o engenheiro. O período é de 30 dias úteis a cada ano e pode ser dividido em vários períodos. “Eu já dividi minhas férias em seis vezes, acabei emendando com alguns feriados”, diz. Aqui, a Consolidação de Leis Trabalhistas (CLT) dá direito a 30 dias corridos de féria.
Em relação à carga horária, a Alemanha está entre os três países com as menores jornadas de trabalho no mundo – são 34,4 horas semanais, atrás apenas da Dinamarca e da Holanda. Segundo a OCDE, somente 4% dos trabalhadores cumprem períodos muito mais longos. Igor Teles tem jornada de 40 horas semanais.
Segundo ele, empresas maiores têm participação de sindicatos fortes nas negociações de acordos coletivos, o que ajuda nos direitos em geral e nos aumentos de salários. E há a flexibilidade.
“No meu caso específico, preciso viajar bastante a trabalho. Mas, no geral, os empregos aqui são bem flexíveis quanto ao home office”, diz Teles.
A empresa em que Teles atua não cobra horários fixos. Em dias mais ensolarados, por exemplo, ele e outros colegas de trabalho costumam sair mais cedo para aproveitar o clima.
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Carreira e salário
Teles considera ainda que a sensação de segurança, a qualidade de vida, a infraestrutura das cidades e o poder de compra são aspectos favoráveis. Mas ele faz um alerta a profissionais sem qualificação.
Estes devem avaliar com cuidado a ideia de mudar para a Alemanha, já que o custo de vida é alto. “Brasileiros que imigram sem tantas qualificações talvez não tenham uma vida tão confortável. Sugiro pensar melhor se vale a pena.”
O salário mínimo na Alemanha é calculado com base no número de horas trabalhadas. A remuneração mínima por hora é de 12,41 euros (R$ 73,12). Para um emprego de 40 horas semanais, o salário bruto mensal gira em torno de 1.985,60 euros (R$ 11.699).
Foi exatamente o quesito financeiro que chamou atenção da gestora de redes sociais Débora França, 30. Ela mora na Alemanha desde 2020 depois de uma temporada de sete anos em Portugal. A mudança foi influenciada pelo marido, que é alemão.
Logo que Débora chegou, em plena pandemia, dedicou-se a aprender o idioma local. No segundo ano, fez trabalho voluntário em uma creche, depois, trabalhou num restaurante, onde recebia 13 euros por hora, e só este ano decidiu atuar na área de social media. Desde abril, ela trabalha em uma startup do setor de saúde. Ela não quis revelar o salário.
Cultura de trabalho é o equilíbrio
Assim como o engenheiro Igor Teles, Débora também avalia que a cultura de trabalho valoriza o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. “Se o seu horário de saída é até 17 horas, você vai embora e ninguém vai questionar ou pensar que é preguiçosa.”
Em busca de melhores oportunidades na carreira, a farmacêutica Dulce Coelho, de 30 anos, também decidiu mudar-se para a Alemanha em 2022. Depois de estudar alemão, ela conta que teve que aprender do zero como montar um currículo, já que o processo seletivo é um pouco diferente do Brasil.
Para todas as vagas a que se candidatou teve de enviar uma carta explicando as razões para querer trabalhar na companhia. “É um documento exigido pela maioria das empresas alemãs”, diz.
Custo de vida
Há pouco mais de dois meses Dulce ingressou na área de pesquisa e desenvolvimento de suplementos alimentares de uma empresa farmacêutica. Porém, mesmo com mestrado, ocupa um cargo de estagiária. “Na Alemanha, é muito difícil entrar na indústria farmacêutica sem experiência.”
Tomando como referência que mora na cidade de São Paulo e ganhe R$ 15 mil por mês, para manter o mesmo padrão de vida em Berlim seria necessário ganhar cerca de R$ 29 mil (5.023,7 euros), conforme o site Numbeo, especializado em custo de vida. O custo de vida em Berlim, incluindo aluguel, é 95,8% maior do que na capital paulista.
Os brasileiros reclamam ainda do sistema de saúde. No Brasil, o engenheiro Igor Teles tinha o hábito de realizar exames de rotina, o que não é simples por lá.
“Como a população é muito velha e há poucos médicos, eles reservam serviços de rotina para os idosos. Então, se você (jovem) for ao hospital com o intuito de fazer um exame de rotina, o médico vai rir da sua cara.”