PENA CAPITAL
Entenda a polêmica da execução por nitrogênio nos EUA
Estado do Alabama, nos Estados Unidos, usou nesta sexta-feira (26), pela primeira vez, método por asfixia
Última atualização: 26/01/2024 14:54
Uma polêmica interna e internacional marcou um novo método de execução aplicado pela primeira vez nos Estados Unidos nesta sexta-feira (26). Foi no estado do Alabama, onde foi executado o condenado à morte Kenneth Smith.
A controvérsia não envolve questões legais nem ideológicas, embora muitas vezes existam questionamentos sobre condenações específicas e, também, existam opositores à própria instituição da pena de morte. Smith foi condenado à morte por um crime de 1988. Ele e um comparsa mataram uma mulher após serem contratados pelo marido dela, então endividado. O crime envolveu métodos cruéis e motivo torpe. O marido tirou a própria vida antes de ser preso e o comparsa já havia sido executado. Todas as instâncias de revisão jurídica haviam sido esgotadas.
A polêmica foi o método de execução. Smith foi executado por hipoxia com nitrogênio. Basicamente, trata-se de asfixia. Ele foi amarrado em uma maca e recebeu uma máscara ligada a um cilindro de nitrogênio puro. O gás é inerte e consiste na maior parte do ar que os humanos respiram. Porém, o corpo necessita do oxigênio do ar, não do nitrogênio. Respirar nitrogênio puro equivale a ficar sem ar, mesmo que os pulmões estejam absorvendo um gás.
Os motivos do método
O método de execução foi criado porque, assim como outros estados, o Alabama está tendo dificuldades em obter produtos químicos para as injeções letais que eram empregadas. Sob pressão internacional, laboratórios não têm mais produzido o composto usado nas injeções. O governo estadual investigou outros produtos e sistemas de execução, mas optou pelo nitrogênio.
O método foi aprovado pelo Legislativo e as autoridades afirmavam que a execução seria suave, com perda de consciência seguida de interrupção das funções vitais. Entretanto, médicos questionaram esta versão. A pesquisadora e advogada Olivia Ensign, da organização sem fins lucrativos Human Rights Watch, classificou o método de "inumano". Ela equiparou o sistema a "sufocamento" e mencionou que veterinários, por exemplo, não usam este método para sacrificar animais por considerá-lo um sofrimento desnecessário.
Entendendo a polêmica
A polêmica tem vários níveis. Por um lado, há a controvérsia natural sobre a pena de morte, que envolve convicções que, muitas vezes, podem ser exacerbadas tanto contra quanto a favor. O Instituto Gallup recentemente apontou em pesquisa que 50% dos norte-americanos questionam a pena de morte.
À parte a pena capital, a polêmica mais forte envolvida no caso de Smith é a forma de execução. Em Vigiar e Punir, o filósofo Michael Foucault explicava como, durante muito tempo na história humana, o sistema penal incluía a aplicação de castigos não corretivos, mas cruéis, como uma forma de vingança contra os infratores. Na Antiguidade, os romanos possuíam pena de morte, mas ela não era a pena mais grave. Os que houvessem cometido crimes considerados mais graves, como o parricídio (matar o próprio pai), eram condenados ao suplício, que era a morte por tortura.
Variantes do suplício existiram na Europa até o fim da Idade Média e mesmo na Era Moderna. Foucault descreveu uma execução na Europa, já na Idade Moderna, onde um condenado teve os membros amarrados a cavalos, que foram açoitados em direções diferentes. A aplicação foi testemunhada por uma multidão, estimulada a hostilizar o criminoso.
Este é o centro da polêmica, porque acordos internacionais proíbem, agora, execuções por métodos cruéis, que são consideradas atrocidades. As autoridades do Alabama alegam que é necessário possuir um método eficaz e acessível para aplicar a pena de morte, para dissuadir o crime. Já os opositores alertam que está acontecendo uma infração à instituição da execução sem sofrimento. A polêmica deve perdurar. Outros dois estados norte-americanos já aprovaram o mesmo método de execução.