CENÁRIO MUNDIAL
Dólar volta a subir com aversão global ao risco
Real foi castigado pela onda de aversão ao risco que tomou conta dos mercados globais
Última atualização: 03/09/2024 18:46
O dólar apresentou alta firme nesta terça-feira (3), voltando a fechar perto do nível técnico de R$ 5,65. O real foi castigado pela onda de aversão ao risco que tomou conta dos mercados globais após dados fracos da indústria americana avivarem temores de recessão nos EUA.
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Investidores abandonaram bolsas e divisas emergentes para buscar abrigo nos Treasuries e em moedas tipicamente vistas como refúgio em momentos de turbulências, como o iene e o franco suíço. O minério de ferro amargou mais um dia de forte baixa, diante de preocupações com a economia chinesa, e os contratos do petróleo recuaram quase 5%.
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Nas primeiras horas de negociação, o real chegou a ignorar o tombo das commodities e esboçou uma apreciação pontual, depois de o resultado acima do esperado do PIB brasileiro no segundo trimestre reforçar a perspectiva de que o Banco Central inaugure um novo ciclo de alta da taxa Selic neste mês.
Com mínima a R$ 5,5771 e máxima a R$ 5,6527 o dólar à vista encerrou o dia em alta de 0,46%, cotado a R$ 5,6404 - maior valor de fechamento desde 6 de agosto. O real, que costuma ser mais castigado em episódios de aversão ao risco, desta vez teve perdas menores que moedas pares, como o peso chileno e o rand sul-africano.
"Tivemos um movimento de aversão ao risco bem grande hoje. O minério de ferro e o petróleo caíram com força. O mercado já vinha preocupado com a China e os PMIs nos EUA acabaram exacerbando a fuga do risco, principalmente de emergentes", afirma o economista-chefe da Frente Corretora, Fabrício Velloni.
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Divulgado no fim da manhã, o índice de gerentes de compras (PMI, na sigla em inglês) da indústria dos EUA, medido pelo Instituto para Gestão da Oferta (ISM) subiu de 46,8 em julho para 47,2 em agosto, aquém do esperado por analistas (47,5). Leituras abaixo de 50 indicam contração da atividade. Além disso, os investimentos em construção nos EUA recuaram 0,3% em julho, quando a expectativa era de alta de 0,2%.
Ferramenta de monitoramento do CME Group mostrou que houve aumento das apostas em corte de 50 pontos-base dos juros pelo Federal Reserve neste mês, embora as chances de redução menor, de 25 pontos-base, sigam majoritárias. As atenções se voltam agora aos indicadores do mercado de trabalho, em especial o relatório mensal de emprego (payroll) de agosto, que sai na sexta-feira, 6.
"Um payroll mais fraco que o esperado, especialmente se mostrar desaceleração mais pronunciada do mercado de trabalho, poderia incitar o Fed a adotar uma postura mais agressiva no corte de juros", afirma o head de câmbio da B&T Câmbio, Diego Costa.
Por aqui, o IBGE informou que o PIB avançou 1,40% no segundo trimestre em relação ao primeiro, acima da mediana de Projeções Broadcast (-0,9%). Investimento e consumo das famílias puxaram o resultado positivo, sob a ótica da demanda agregada. Na comparação com o segundo trimestre de 2023, o PIB cresceu 3,3%, superando também a mediana de Projeções Broadcast (2,6%).
Para Velloni, da Frente Corretora, com a economia rodando acima das expectativas e a bandeira vermelha para tarifa de energia em setembro, não há perspectiva de alívio da inflação. "É preciso entender como o Banco Central vai se comportar nesse cenário, ainda mais porque o Brasil tem um quadro fiscal mais deteriorado que pressiona o câmbio", diz Velloni, que não descarta uma nova escalada do dólar para além de R$ 5,70 no curto prazo.
Casas relevantes, como Citi e Barclays, elevaram a projeção para o PIB deste ano após o resultado do segundo trimestre e estimam altas da taxa Selic. O Barclays vê um ciclo de aperto monetário de 1,5 ponto porcentual. O Citi trabalha com quatro altas seguidas de 0,25 ponto, a partir de setembro.
Em tese, a combinação de corte de juros pelo Fed com elevação da taxa Selic tende a beneficiar o real, já que aumenta a atratividade para as operações de carry trade. Analistas ponderam, contudo, que as incertezas sobre o ritmo da atividade nos EUA pode manter os investidores na defensiva e limitar o apetite por moedas emergentes com o real.
Ibovespa
Desde que atingiu os 137 mil pontos em nível recorde de fechamento na última quarta-feira - em série de renovações de máximas iniciada, no intradia, em 15 de agosto, então aos 134,5 mil -, o Ibovespa chegou à quarta sessão consecutiva em baixa, hoje de 0,41%, aos 134.353,48 pontos. Considerando a proximidade com o topo histórico, o índice da B3 voltou a mostrar resiliência na sessão, tendo em vista o nível do câmbio - hoje a R$ 5,64 no fechamento, em alta de 0,46% - e a forte correção observada nos índices de ações em Nova York, após o feriado de ontem pelo Dia do Trabalho nos Estados Unidos.
Por lá, os principais índices mostraram perdas de 1,51% (Dow Jones), 2,12% (S&P 500) e de 3,26% (Nasdaq) no encerramento desta terça-feira. Por aqui, destaque pela manhã para a leitura acima do esperado para o PIB no segundo trimestre, em expansão de 1,4% na margem, que alimenta a expectativa de que o crescimento brasileiro possa chegar bem perto ou mesmo à casa de 3% este ano.
Apesar do câmbio ainda em alta, o dia foi de relativa acomodação para a curva do DI, em baixa na sessão, o que contribuiu para o desempenho de parte das ações associadas ao ciclo doméstico, como Lojas Renner (+1,71%) e Assaí (+2,04%). Na B3, o Ibovespa oscilou entre 134.171,30 e 135.010,55 pontos, da mínima à máxima do dia, com giro a R$ 22,5 bilhões. Em terreno negativo nas últimas quatro sessões, o índice fica perto de neutralizar o ganho no ano, hoje a 0,13%.
Destaque da agenda, "a composição do PIB veio positiva, com serviços e consumo firmes - e a retomada da indústria é uma surpresa benigna. Com a piora nos termos de troca, o real continuará pressionado, e podemos ver uma pressão na inflação de bens adiante, por conta da indústria", diz Guilherme Jung, economista da Alta Vista Research. "A taxa Selic atual, de 10,50% ao ano, se mostra pouco restritiva. E, com as condições de inflação distantes da meta, expectativas desancoradas e fiscal deteriorado, a possibilidade de uma alta de 25 pontos-base na próxima reunião do Copom nos parece mais plausível", acrescenta.
"O 'PIBão' traz de um lado certa tranquilidade pela resiliência da atividade mesmo com política monetária restritiva e também um certo temor de que a Selic fique ainda mais alta", observa Pedro Lang, economista e sócio da Valor Investimentos, acrescentando que o Copom permanece "data driven" e deve confirmar, na próxima reunião, aumento de 25 pontos-base para a taxa de juros, em um contexto no qual a política fiscal continua a injetar "combustível na economia".
"O PIB do segundo trimestre deve, de fato, resultar em avanço das projeções de crescimento para o ano, mais próximo de 3%. PIB mais forte traz também um grau maior de incerteza com relação à política monetária, tendendo a gerar mais inflação à frente", aponta Cristiane Quartaroli, economista do Ouribank.
Na ponta ganhadora do Ibovespa nesta terça-feira, destaque para a recuperação parcial em Azul (+10,20%), vindo de perdas na casa de dois dígitos nas duas sessões anteriores. A ação da companhia aérea puxou hoje a lista de ganhos, à frente de IRB (+5,35%) e de Carrefour (+3,59%). No lado oposto, 3R Petroleum (-5,28%), Prio (-5,16%), Pão de Açúcar (-4,21%), Bradespar (-3,86%) e Vale (-3,73%), em dia de queda acima de 4% para o minério de ferro na China e também para o petróleo, tanto em Londres (Brent) como em Nova York (WTI).
Assim, Petrobras também cedeu terreno na sessão, com a ON em baixa de 1,05% e a PN, de 1,21% no fechamento. O desempenho negativo das gigantes das commodities foi compensado, em parte, pelo avanço das ações de grandes bancos na sessão, com destaque para Bradesco (ON +1,43%, PN +1,09%) e Itaú (PN +1,62%).
"O dia foi de aversão a risco global, o que piorou hoje com a retomada da liquidez a partir dos Estados Unidos, após o feriado de ontem lá. Há uma certa ansiedade para os dados que virão nos próximos dias. Os dados de atividade chineses - e também nos Estados Unidos - têm vindo um pouco abaixo do esperado, o que traz alguma frustração com relação à demanda, afetando assim os preços de commodities como o petróleo, em sessão muito ruim hoje", diz Matheus Spiess, analista da Empiricus Research, destacando o peso do setor sobre o desempenho do Ibovespa nesta terça-feira. "Aqui no Brasil estamos com uma dinâmica distinta, com atividade ainda aquecida e PIB acima do esperado."
Por outro lado, acrescenta o analista, o cenário de resiliência da atividade doméstica reforça a possibilidade de que a Selic venha a subir para reancorar as expectativas de inflação, em momento no qual o mundo tem se preparado para juros mais baixos nos Estados Unidos, com começo de ciclo de afrouxamento por lá aguardado para este mês de setembro. "Incerteza sobre o nível dos juros domésticos traz indecisão para o investidor" com relação à renda variável, diz Spiess.
Juros
O Produto Interno Bruto (PIB) acima do esperado no segundo trimestre ajudou a consolidar as apostas do mercado de uma alta da taxa Selic já na reunião de setembro, desenhando uma desinclinação na curva de juros vista desde cedo. Na parte da tarde, as taxas de Depósito Interfinanceiro (DIs) de curto renovaram mínimas, mas continuaram resistentes perto dos ajustes da véspera, e os vértices longos seguiram em baixa com a expectativa de que o se o Comitê de Política Monetária (Copom) atuar agora, pode haver espaço para flexibilização da política monetária no longo prazo.
"A última vez em que a curva ficou assim juros curtos mais resistentes, queda nos vértices médios e longos foi na divulgação do IBC-Br", afirma Santiago Schmitt, especialista em renda fixa da Manchester Investimentos. O dado, divulgado em 16 de agosto, mostrou alta de 1,37% em junho ante maio, quase no teto das expectativas do mercado (1,40%).
Desta vez o PIB cresceu 1,4% ante o primeiro trimestre, acima da mediana de 0,9% e perto do teto, de 1,6%, do Projeções Broadcast. Inclusive, casas como Barclays, Bradesco, BTG Pactual, Citi e Goldman Sachs elevaram a projeção para o PIB de 2024 ao se depararem com uma atividade real ainda forte.
"A atividade se mostrando mais aquecida reitera a necessidade de o Banco Central ter mais cautela. Maior consumo traz maior efeito inflacionário. O mercado como um todo reitera apostas em juros mais altos no curto prazo. Os DIs curtos estão totalmente correlacionados com a expectativa de alta da Selic, e a ponta longa cai porque, dada a sinalização do Copom de que se preciso vai aumentar os juros, isso pode acabar aliviando as coisas à frente", complementa Schmitt.
Com isso, a curva de DIs indica que o mercado precifica que a probabilidade de uma alta de 0,5% da Selic em setembro já está em 80%, segundo Caio Schettino, head de alocações da Criteria. "Mercado está bem ancorado na expectativa de alta de 0,5% em setembro. A curva também mostra aumento de 0,5% nas reuniões de novembro e dezembro, e mais uma alta de 0,25% na Selic em janeiro para 'fazer pente fino'", afirma.
Na avaliação de Alan Martins, analista da Nova Futura Investimentos, as taxas curtas renovaram mínimas no período da tarde, ainda oscilando perto dos ajustes da véspera, por conta de um "ajuste intraday".
A taxa do contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2025 fechou em 10,975%, na mínima perto dos 10,998% do ajuste de ontem, e o DI para janeiro de 2026 subiu a 11,925%, ante 11,886% do ajuste. A taxa do DI para janeiro de 2027 caiu para 11,960% de 11,977% do ajuste, e a de janeiro de 2029 recuou a 12,130%, ante 12,166% de ontem.