Mundo animal
Cientistas investigam curiosa epidemia de 'cigarras zumbis'
Fungo altera comportamento dos insetos como forma de proliferação
Última atualização: 08/06/2024 10:28
Uma doença bizarra está afetando um inseto cujo ciclo de vida, em si, já é altamente curioso. Cientistas estão acompanhando um fungo que infectou as cigarras periódicas, um inseto que eclode em massa a cada 17 anos nos Estados Unidos e no Canadá.
A infecção está causando comportamentos estranhos. Os animais foram apelidados de "cigarras zumbis" ou "saleiros voadores".
No norte dos Estados Unidos, em regiões como Maryland e Virginia, cientistas vinham se preparando há anos para acompanhar a eclosão das cigarras (por lá, chamadas de "cicadas") da espécie Magicicada septendecim, também conhecida como "cigarra periódica". Como muitas cigarras, esta espécie passa a maior parte da vida no subsolo, como ninfa (uma espécie de larva). Depois de adulto, o animal desenvolve asas e vai para a superfície. No caso da Magicicada septendecim, ela eclode em massa a cada 17 anos.
Nas regiões em que ocorre, a eclosão das cigarras pode envolver milhões de insetos, que formam nuvens. Cientistas acreditam que se trata de uma estratégia evolucionária de sobrevivência. Com tantos animais no ar ao mesmo tempo, os predadores não conseguem acabar com todos e há mais chance de que vários se reproduzam.
Comportamento bizarro
A curiosidade é que na eclosão que está acontecendo agora em 2024, foi observada uma infecção esbranquiçada na parte posterior de vários insetos. Identificou-se que se trata de um fungo, o Massospora cicadina. O fungo já era conhecido, e vinha sendo estudado há anos, mas sua ocorrência foi bem maior do que o esperado - em alguns casos, de 20% a 30% dos insetos foram infectados. É este fungo que está produzindo as "cigarras zumbis".
O termo "cigarra zumbi" está sendo usado, de forma bem-humorada, até por cientistas especializados no inseto, como Matt Kasson, especialista da Universidade de West Virginia. É que a infecção pelo fungo destrói o aparelho reprodutor dos insetos, mas, ao mesmo tempo, sobrecarrega o animal com um patógeno que tem o efeito de uma anfetamina.
Os insetos, mesmo sem capacidade reprodutiva, entram em uma furiosa atividade de acasalamento, que acaba espalhando o fungo mais rapidamente. Este comportamento alterado lembra o frenesi dos zumbis ou mortos-vivos nos filmes de terror.
Além disso, a progressão da infecção aumenta o tamanho da área contaminada no corpo do inseto. Devido à atividade de acasalamento, a sacola ou bolha com o fungo se rompe na parte posterior das cigarras e elas começam a soltar um pó branco enquanto voam. Kasson comentou em suas redes sociais: "presenciem o saleiro voador". Além do contato dos insetos uns com os outros, o fungo se espalha também por esta pulverização dos esporos no ar, que posteriormente vai infectar as cigarras na fase de ninfa.
Não há perigo, dizem autoridades
Autoridades já informaram que não há risco de contaminação humana nem de animais de estimação, embora ainda esteja sendo acompanhado o efeito da ingestão das cigarras contaminadas por parte de alguns predadores do ecossistema, como pássaros. Mesmo assim, cientistas explicam que o patógeno não produzirá em animais maiores o mesmo efeito que tem no corpo de um inseto, até pela diferença de tamanho.
O comportamento alterado dos insetos atingidos pelo fungo é bem conhecido no meio científico e no mundo animal. É esta ocorrência comum entre insetos que originou a fantasia da ficção científica "The Last of Us", que narrava o aparecimento de uma fictícia variante de fungo capaz de induzir seres humanos ao mesmo comportamento anormal. "The Last of Us" era uma história de zumbis. Um ano depois da série, o aparecimento dos insetos infectados acabou produzindo o apelido de "cigarras zumbis".