O ano de 2025 promete ser incrível para o torcedor brasileiro apaixonado por velocidade. Após sete temporadas sem representação fixa no grid, o País voltará a ter um piloto titular na Fórmula 1. Paulista de Osasco, Gabriel Bortoleto, de 20 anos, conquistou feitos raros nas categorias inferiores, empilhou troféus e cansou as pernas por tantas vezes subir ao lugar mais alto do pódio. As ultrapassagens e as reviravoltas em corridas dadas como perdidas encheram os olhos de pilotos e equipes e convenceram a Audi em escolhê-lo como um dos símbolos de uma nova era da montadora alemã.
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Oficialmente em 2025, Bortoleto pilotará pela Sauber. Mas a tradicional escuderia suíça foi adquirida pela Audi, que ingressa na Fórmula 1 em 2026 como fornecedora de motores e dona de equipe. No fim do último ano, o fundo soberano de investimentos oficial do Catar (QIA) – que já investe no Grupo Volkswagen, dono da Audi, há certo tempo – comprou participação minoritária no time e injetou valores importantes.
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Confiante no futuro, o brasileiro prefere a modéstia em suas primeiras apresentações na Fórmula 1. “Realista”, como julga ser, Bortoleto revelou, em entrevista ao Estadão, suas perspectivas para 2025 e repetiu em diversas oportunidades a palavra “adaptação”. Campeão da Fórmula 2 e Fórmula 3 de forma consecutiva como estreante em ambas, o piloto contou com o apoio substancial do bicampeão mundial Fernando Alonso e um “dedinho” do ex-chefão da F-1 Bernie Ecclestone para alcançar um feito que se tornou raro para os pilotos do Brasil.
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Há uma nova realidade para o piloto, com a qual ainda vai se habituar. Decisões ainda serão tomadas. Ele passará muito tempo na Suíça, base do time, mas sua moradia, por ora, continua na Itália. Em seu curto tempo em São Paulo para aproveitar as festas de fim de ano com a família, Gabriel Bortoleto deixa à parte, momentaneamente, seus afazeres de pista e suas quase 10 horas diárias de simulador para atender a reportagem e gravar campanhas publicitárias para marcas, como Malbec, de O Boticário, que visualizam em sua figura “ambição e autenticidade”. Para o brasileiro, sobra orgulho por levar as cores do País de volta ao grid e por ter sido escolhido por “uma das melhores equipes do futuro”.
Entrevista:
A Sauber foi a lanterna em 2024, mas foi comprada pela Audi, que assume definitivamente a equipe em 2026. Como dosar as expectativas em sua chegada à fórmula 1 sabendo que não está em uma equipe de ponta hoje?
Não será uma temporada frustrante, porque a equipe apresentou uma melhora na reta final de 2024. Obviamente, sabemos que a equipe não vai ganhar o campeonato mundial neste ano. Acredito que a temporada será de aprendizado da minha parte, em que a equipe também vai se adaptar ao meu estilo como piloto. O objetivo é que eu aprenda e melhore para chegar em 2026, quando se tornar efetivamente Audi, e eu já ter experiência e poder buscar bons resultados. É um trabalho a longo prazo.
A Fórmula 1 passará por grandes mudanças em 2026, com nova motorização e alterações aerodinâmicas. Como aproveitar 2025 sabendo que em breve um novo carro estará em suas mãos?
A equipe tem muitas pessoas trabalhando, mais até na fábrica do que na pista. Isso difere das categorias de base. Quando você sobe para a F-1, uma das principais diferenças é saber com quem conversar, expressar certas opiniões e onde melhorar. Na F-1, as áreas são muito específicas. O carro também é muito mais rápido, diferente. Mas, com quatro rodas e um volante, a gente dá o nosso máximo e tenta extrair o que der.
O que você traça como meta pessoal e da equipe em 2025?
Minha meta não tem a ver com o resultado. Porque isso não depende só de mim. Meu objetivo é progredir como piloto ao longo da temporada. A gente sabe que a F-1 não é fácil, e a gente melhora muito nas primeiras temporada. Quero ser melhor pessoa e profissional. Quando a gente tiver possibilidade de lutar pelo título, não sei em quantos anos, tenho de estar pronto para esse momento. Não coloco resultado, porque não faz sentido nesse momento.
Como você se sentiu nos primeiros testes com o carro da Sauber?
Na Fórmula 1 existe melhora, mas existe muito adaptação. Estou batendo muito nessa tecla da adaptação. O carro de Fórmula 1 é personalizado para os pilotos, então havia muitas coisas nos testes que queria mudar para mim. Para o Nico eram boas, mas para mim seria melhor ter um botão em outra posição. Pequenas coisas fazem diferença. Foi isso que levei para a equipe, que respondeu positivamente pelo feedback que me deram. Mostrei que realmente estou interessado. Temos trabalhado bastante para chegar o mais confortável possível para o início da temporada.
Como foram seus primeiros contatos com o seu futuro companheiro de equipe? De alguma forma, o desempenho do Nico Hülkenberg vai servir de parâmetro de comparação com você. Como você enxerga esse primeiro desafio?
O Nico foi um cara muito legal comigo no teste. É muito reservado, na dele, mas abriu informações que ele tinha, trouxe novidades para a equipe e aprendi muita coisa. Sempre tem essa ideia de ‘bater o companheiro de equipe’. Isso é uma realidade, queremos ser um melhor que o outro, afinal temos o mesmo carro. Acaba se tornando uma comparação. Mas ele é um dos mais experientes na Fórmula 1. Ele vai para sua 15ª temporada na F-1. É muito tempo. O interessante para mim é o que vou aprender com ele. Não estou pensando em chegar na primeira corrida e superá-lo. Se eu entrar com essa mentalidade na Fórmula 1, estarei com a mentalidade errada. Não é assim que as coisas funcionam. Deve-se ter respeito pelas pessoas que lá estão. São todos pilotos de ponta. É um piloto que é sempre colocado no topo por todos. Vou pensar em aprender melhor e, então, trazer os melhores resultados para a equipe.
Como você pretende se impor na pista e adquirir respeito dos outros pilotos?
Impor respeito é mostrar que você chegou, mas não é por estar disputando com um campeão do mundo que vai deixá-lo passar. Você trata a todos de forma igual, com respeito na pista, e muitos pilotos retribuem. E, claro, se não for recíproco, a gente também faz a mesma coisa, não tenho problema em jogar os dois jogos que há no modo de correr. O importante na Fórmula 1 é ser bem falado, um bom companheiro de equipe. Fórmula 1 é muito sobre planos a longo prazo. Nosso objetivo é ter bons resultados no futuro e preciso criar esse ambiente dentro da equipe.
O que te diferencia de outros brasileiros que tentaram e não conseguiram chegar à Fórmula 1?
O único motivo de eu estar hoje na Fórmula 1 é porque ganhei a F-3 e a F-2 de forma consecutiva, como estreante. Isso impressionou a Audi, que tem visão de longo prazo pelo projeto. Eles me viram como a pessoa que pode ser o futuro da equipe. Há pilotos brasileiros, como Felipe Drugovich, que ganhou a F-2 e merece uma chance na F-1. Espero um dia vê-lo no grid.
Além de chegar à Fórmula 1, um dos grandes desafios para brasileiros é ficar na categoria. O que faz um piloto convencer a categoria de que você merece ficar por mais tempo?
O principal fator é resultado: ser rápido, trazer pontos e progresso. Se você tiver resultado, a sua e outras equipes vão te querer. Sem resultado, você está fora.
Como você trabalha a questão de perspectiva de carreira? É possível olhar além da próxima corrida?
Sou uma pessoa que foca no agora. Sou uma pessoa sonhadora, mas realista. Tenho meu desejo de ser campeão do mundo, assim como todos os pilotos. Sei que, para chegar lá, tenho de trabalhar. Então, não penso em como será daqui cinco ou seis anos. Miro no dia seguinte, na próxima corrida, no próximo dia de simulador para extrair o máximo que eu tenho, porque se eu extrair 100% de cada dia, daqui cinco ou seis anos, os resultados terão valido a pena. Pensar no agora é o mais importante no automobilismo.
O que significa para você ser o escolhido para estar em um novo projeto de uma montadora de tanto renome na Fórmula 1?
Estou muito orgulhoso da equipe para a qual estou indo. Estou em uma das melhores equipes do futuro, uma construtora, equipe vitoriosa em todas as outras categorias. Tudo o que fizeram ganharam. Claro que a Fórmula 1 é diferente. Não é um projeto fácil e depende de muitas coisas. Sinto confiança quando lembro do nome Audi e vejo ótimos resultados em outras categorias. Estou muito confiante de que foi a melhor escolha da nossa parte. Fico muito feliz de ser o piloto escolhido para seguir esse projeto com eles.
É verdade que o ex-chefão da Fórmula 1 Bernie Ecclestone ajudou a te colocar na Sauber? Qual fator você entende como mais importante que te levou a esse posto?
Houve muitas pessoas envolvidas na minha entrada. O Bernie foi muito legal. Se não me engano, ele ligou para o Mattia Binotto (chefão da Sauber) para falar: ‘Conhece o garoto’. A gente sabe que a Fabiana Ecclestone é brasileira e importante na FIA. O Bernie não fez negociação. Mas a palavra de uma pessoa tão grande como ele, com tanta história na F-1 vale muito. Houve pessoas que participaram mais das negociações. O Bernie teve um dedinho, mas não foi porque ele ligou que minha contratação foi definida.
Se eu não ganhasse as categorias de base, poderia ligar o papa para quem quer que fosse que não conseguiria. Resultados definem o seu futuro. Até chegar à F-2 foi um trabalho muito duro da minha família para ajudar a pagar por essa carreira, com grandes patrocinadores.
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