Esportes
Arábia Saudita pode se tornar patrocinadora da Copa Feminina; entenda a polêmica
Última atualização: 24/01/2024 14:35
A Arábia Saudita, por meio de sua entidade de turismo, pode ser a principal patrocinadora da Copa do Mundo Feminina, que será disputada entre julho e agosto, na Austrália e na Nova Zelândia. No último mês, o jornal The Guardian afirmou que a "Visit Saudi" poderia se juntar a outras marcas, como Coca-Cola e Adidas, nas campanhas de divulgação da Fifa ao redor do mundo. A possibilidade de o paÃs do Oriente Médio se tornar um dos maiores investidores na competição gerou preocupação em confederações e nas atletas, por causa dos casos de desrespeito aos direitos humanos - em especial das mulheres - em solo saudita.
Alex Morgan, atleta dos Estados Unidos e campeã mundial em 2019, repudiou o patrocÃnio da Arábia Saudita. "Moralmente, é algo que não faz sentido. É bizarro que a Fifa aceite um patrocÃnio para visitar a Arábia Saudita enquanto eu, Alex Morgan, não seria apoiada ou aceita naquele paÃs. Não compreendo", afirmou a jogadora. "Quanto à Fifa, espero que tome a decisão certa."
As confederações de futebol da Austrália e Nova Zelândia também se posicionaram contra esta possibilidade. "A confederação neozelandesa de futebol tomou conhecimento de reportagens que sugerem que a Visit Saudi, a autoridade oficial de turismo da Arábia Saudita, deve ser anunciada como patrocinadora oficial da Copa do Mundo Feminina, o maior evento esportivo feminino do mundo. Se esses relatórios estiverem corretos, estamos chocados e desapontados ao ouvir isso, já que a Nova Zelândia não foi consultada pela Fifa sobre esse assunto. Como coorganizadores da Copa do Mundo, a Nova Zelândia e a Austrália escrevem em conjunto para que a Fifa esclareça a situação com urgência", diz a nota.
No direcionamento da Fifa quanto aos patrocÃnios, o dinheiro da "Visit Saudi" seria investido para o desenvolvimento do futebol feminino ao redor do mundo. Na Arábia Saudita, além de desrespeitos aos direitos humanos - o paÃs é um Estado islâmico organizado em uma monarquia absoluta, na qual o rei é o chefe do estado e o chefe de governo -, o paÃs só passou a ter uma seleção feminina de futebol no último ano.
Assim como outras nações do mundo árabe, o regime saudita possui, em sua essência, leis fundamentalistas, com base nos textos sagrados do Alcorão, desde 1979. Uma visão que, entre outras áreas, permite poucos direitos à s mulheres. As sauditas não possuem liberdade religiosa, sexual ou até de ir e vir. Recentemente, Mohammad bil Salman, prÃncipe herdeiro ao trono e primeiro-ministro saudita, promoveu mudanças nas leis do paÃs. Algumas tiraram a obrigatoriedade das mulheres de receberem permissão do marido para transitar livremente em locais públicos e exercer sua cidadania.
Arlene Clemesha, historiadora do mundo árabe e professora doutora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH-USP), aponta ao Estadão que, muitas destas mudanças nas legislações são meios de "suavizar" o regime saudita, uma ditadura teocrática. "É uma maneira de transparecer uma preocupação do governo com as mulheres, para ter menos resistência comercial de outros paÃses, como EUA e Israel", afirma.
"A liberdade feminina ainda é um problema latente do regime", aponta Arlene. De acordo com a Human Rights Watch e a Anistia Internacional, as mulheres na Arábia Saudita ainda sofrem discriminação em relação ao casamento, famÃlia e divórcio, apesar das reformas. No relatório do Fórum Econômico Mundial, a respeito da desigualdade entre gêneros, a Arábia Saudita ficou em 127º lugar entre 153 paÃses.
"Apesar dessas reformas, o governo saudita ainda mantém polÃticas de repressão à s manifestações femininas e a ativistas na internet", analisa. Uma das mudanças, aprovada pelo regime no último ano, permitiu que mulheres pudessem conduzir um veÃculo por conta própria. Ainda há a obrigatoriedade do uso do hijabe, vestimenta que permite apenas que os olhos sejam visÃveis, pelas mulheres na nação.
No âmbito esportivo, assim como a seleção saudita feminina, a primeira liga nacional para as mulheres no futebol surgiu apenas em 2020. Na última Copa do Mundo, no Catar, mulheres foram vistas torcendo pela equipe masculina nas arquibancadas. A seleção saudita ganhou da Argentina, na estreia do Mundial, mas foi eliminada ainda na fase de grupos.
SPORTSWASHING DA ARÃBIA SAUDITA
O possÃvel patrocÃnio da Arábia Saudita na Copa do Mundo Feminina é mais um dos casos recentes de sportswashing, o uso estratégico e polÃtico do esporte para melhorar sua reputação no mundo, da nação árabe. Recentemente, a contratação de Cristiano Ronaldo pelo Al-Nassr e a compra do Newcastle, por 300 milhões de libras (cerca de R$ 2,2 bilhões na cotação da época) por um grupo liderado pelo Fundo Soberano da Arábia Saudita, administrado pelo prÃncipe herdeiro saudita.
O paÃs também planeja, nos próximos anos, sediar importantes eventos esportivos e fomentar o turismo na região - por causa disso o patrocÃnio no Mundial feminino. A Supercopa da Espanha, Superclássico das Américas e a Supercopa da Itália são alguns dos torneios que foram disputados no Oriente Médio nos últimos anos. O Mundial de Clubes de 2023 terá como sede a Arábia Saudita.
Os planos são de que o paÃs receba a Copa do Mundo de 2030 e os Jogos OlÃmpicos de 2032. Para isso, a Arábia Saudita busca estreitar seus laços, tanto com a Fifa quanto com o Comitê OlÃmpico Internacional (COI). Em 2029, o paÃs será a casa dos Jogos OlÃmpicos de inverno da Ãsia pela primeira vez na história.
A Arábia Saudita, por meio de sua entidade de turismo, pode ser a principal patrocinadora da Copa do Mundo Feminina, que será disputada entre julho e agosto, na Austrália e na Nova Zelândia. No último mês, o jornal The Guardian afirmou que a "Visit Saudi" poderia se juntar a outras marcas, como Coca-Cola e Adidas, nas campanhas de divulgação da Fifa ao redor do mundo. A possibilidade de o paÃs do Oriente Médio se tornar um dos maiores investidores na competição gerou preocupação em confederações e nas atletas, por causa dos casos de desrespeito aos direitos humanos - em especial das mulheres - em solo saudita.
Alex Morgan, atleta dos Estados Unidos e campeã mundial em 2019, repudiou o patrocÃnio da Arábia Saudita. "Moralmente, é algo que não faz sentido. É bizarro que a Fifa aceite um patrocÃnio para visitar a Arábia Saudita enquanto eu, Alex Morgan, não seria apoiada ou aceita naquele paÃs. Não compreendo", afirmou a jogadora. "Quanto à Fifa, espero que tome a decisão certa."
As confederações de futebol da Austrália e Nova Zelândia também se posicionaram contra esta possibilidade. "A confederação neozelandesa de futebol tomou conhecimento de reportagens que sugerem que a Visit Saudi, a autoridade oficial de turismo da Arábia Saudita, deve ser anunciada como patrocinadora oficial da Copa do Mundo Feminina, o maior evento esportivo feminino do mundo. Se esses relatórios estiverem corretos, estamos chocados e desapontados ao ouvir isso, já que a Nova Zelândia não foi consultada pela Fifa sobre esse assunto. Como coorganizadores da Copa do Mundo, a Nova Zelândia e a Austrália escrevem em conjunto para que a Fifa esclareça a situação com urgência", diz a nota.
No direcionamento da Fifa quanto aos patrocÃnios, o dinheiro da "Visit Saudi" seria investido para o desenvolvimento do futebol feminino ao redor do mundo. Na Arábia Saudita, além de desrespeitos aos direitos humanos - o paÃs é um Estado islâmico organizado em uma monarquia absoluta, na qual o rei é o chefe do estado e o chefe de governo -, o paÃs só passou a ter uma seleção feminina de futebol no último ano.
Assim como outras nações do mundo árabe, o regime saudita possui, em sua essência, leis fundamentalistas, com base nos textos sagrados do Alcorão, desde 1979. Uma visão que, entre outras áreas, permite poucos direitos à s mulheres. As sauditas não possuem liberdade religiosa, sexual ou até de ir e vir. Recentemente, Mohammad bil Salman, prÃncipe herdeiro ao trono e primeiro-ministro saudita, promoveu mudanças nas leis do paÃs. Algumas tiraram a obrigatoriedade das mulheres de receberem permissão do marido para transitar livremente em locais públicos e exercer sua cidadania.
Arlene Clemesha, historiadora do mundo árabe e professora doutora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH-USP), aponta ao Estadão que, muitas destas mudanças nas legislações são meios de "suavizar" o regime saudita, uma ditadura teocrática. "É uma maneira de transparecer uma preocupação do governo com as mulheres, para ter menos resistência comercial de outros paÃses, como EUA e Israel", afirma.
"A liberdade feminina ainda é um problema latente do regime", aponta Arlene. De acordo com a Human Rights Watch e a Anistia Internacional, as mulheres na Arábia Saudita ainda sofrem discriminação em relação ao casamento, famÃlia e divórcio, apesar das reformas. No relatório do Fórum Econômico Mundial, a respeito da desigualdade entre gêneros, a Arábia Saudita ficou em 127º lugar entre 153 paÃses.
"Apesar dessas reformas, o governo saudita ainda mantém polÃticas de repressão à s manifestações femininas e a ativistas na internet", analisa. Uma das mudanças, aprovada pelo regime no último ano, permitiu que mulheres pudessem conduzir um veÃculo por conta própria. Ainda há a obrigatoriedade do uso do hijabe, vestimenta que permite apenas que os olhos sejam visÃveis, pelas mulheres na nação.
No âmbito esportivo, assim como a seleção saudita feminina, a primeira liga nacional para as mulheres no futebol surgiu apenas em 2020. Na última Copa do Mundo, no Catar, mulheres foram vistas torcendo pela equipe masculina nas arquibancadas. A seleção saudita ganhou da Argentina, na estreia do Mundial, mas foi eliminada ainda na fase de grupos.
SPORTSWASHING DA ARÃBIA SAUDITA
O possÃvel patrocÃnio da Arábia Saudita na Copa do Mundo Feminina é mais um dos casos recentes de sportswashing, o uso estratégico e polÃtico do esporte para melhorar sua reputação no mundo, da nação árabe. Recentemente, a contratação de Cristiano Ronaldo pelo Al-Nassr e a compra do Newcastle, por 300 milhões de libras (cerca de R$ 2,2 bilhões na cotação da época) por um grupo liderado pelo Fundo Soberano da Arábia Saudita, administrado pelo prÃncipe herdeiro saudita.
O paÃs também planeja, nos próximos anos, sediar importantes eventos esportivos e fomentar o turismo na região - por causa disso o patrocÃnio no Mundial feminino. A Supercopa da Espanha, Superclássico das Américas e a Supercopa da Itália são alguns dos torneios que foram disputados no Oriente Médio nos últimos anos. O Mundial de Clubes de 2023 terá como sede a Arábia Saudita.
Os planos são de que o paÃs receba a Copa do Mundo de 2030 e os Jogos OlÃmpicos de 2032. Para isso, a Arábia Saudita busca estreitar seus laços, tanto com a Fifa quanto com o Comitê OlÃmpico Internacional (COI). Em 2029, o paÃs será a casa dos Jogos OlÃmpicos de inverno da Ãsia pela primeira vez na história.