Cerca de 60 famílias compõem a comunidade ucraniana que vive desde a década de 1940 em Canoas. Chegaram ao Brasil durante o período da 2ª Guerra Mundial, que causou a morte de milhões no Leste Europeu.
A maioria dos moradores da comunidade que vive na região da Paróquia Ortodoxa Ucraniana Santíssima Trindade, no bairro Niterói, acaba em luto ao saber da perda de parentes e amigos em bombardeios russos. Tudo devido a um conflito que consideram absurdo e que parece não ter fim.
Esta mesma comunidade considerou um “absurdo” também as manifestações de dois professores gaúchos falando sobre a guerra. O assunto foi revelado nesta quarta-feira (12) em reportagem do Grupo Sinos.
As manifestações de ódio difundidas em um vídeo divulgado pelas redes sociais causaram desconforto na comunidade ucraniana. Isso porque enquanto um professor pede o extermínio da Ucrânia e da Europa com armas nucleares, uma professora dá gargalhadas.
A conversa surgiu em um debate ao vivo no YouTube, no canal da professora Daniela Adriana Araújo, da rede municipal de São Leopoldo. Ela interage com o colega porto-alegrense Maurício Falavigna, que trabalha atualmente em São Paulo.
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O que dizem os ucranianos
Klara Salenko, 34 anos, está em Canoas desde o início do ano passado. Ela disse ter ficado chocada quando recebeu as manifestações compartilhadas por uma amiga. Chegou inclusive a questionar seriamente a amiga para saber se não era falso, mas terminou confirmando que o vídeo era real.
“Não tinha visto este vídeo antes e fiquei chocada”, diz. “Admito que nem conheço as pessoas, mas como disseram que são professores o absurdo é maior ainda. Porque acho que este tipo de comportamento é passado para as crianças e acaba gerando as crueldades que a gente está vendo nas escolas do Brasil”.
O assunto chegou até o presidente da Representação Central Ucraniano-Brasileira, Vitorio Sorotiuk, que disse ter ficado “profundamente entristecido” pelas manifestações terem partido de educadores esclarecidos e com uma bagagem cultural acima da média da população em geral.
“As pessoas acabam dizendo o que não devem, especialmente pelas redes sociais, mas quando se trata de dois educadores, a gravidade é maior. Até porque os comentários ferem a própria Constituição Federal, que em seu Artigo 4º trata da defesa da paz e da solução pacífica dos conflitos”.
Para o presidente, o mais grave no posicionamento dos professores foi a alusão a explosões de bombas atômicas no território europeu. Ao brincar com o genocídio de povos, os professores demonstram um profundo desconhecimento da história e passado do continente ao longo dos séculos.
“O comentário foi altamente reprovável”, observa. “A banalização em cima de conflitos atômicos precisa ser eliminada do vocabulário. Não há nada mais triste que o genocídio cometido por atos desta natureza. Imagine uma arma capaz de aniquilar uma determinada população, se lançada”.
Sem criminalização
Vitorio Sorotiuk salienta que não espera a criminalização dos professores, mas acredita ser importante que passem por uma “reciclagem”, tendo em vista o prejuízo que este tipo de comentário pode causar a estudantes.
“Ninguém quer ver um professor criminalizado e preso”, defende. “Acredito ser necessário somente um trabalho de reciclagem. Uma orientação melhor sobre o que um educador pode e o que não pode dizer, dado o papel que desempenha na sociedade”.
Ofendidos podem registrar ocorrência, diz delegada
Responsável pela 4ª Delegacia de Polícia (DP) de Canoas, que cuida de casos referentes a intolerância, a delegada Tatiana Bastos aponta que qualquer um que se sentiu ofendido pode prestar queixa.
“Quem se sentir ofendido ou prejudicado de alguma forma, pode fazer o registro e nós vamos apurar as circunstâncias dos comentários e se configuram apologia ao terrorismo ou mesmo racismo”.