Reconhecido pela dedicação à cultura gaúcha e por ter sido modelo para a estátua do Laçador – um dos monumentos mais divulgados do Estado –, Paixão Côrtes passa a contar com mais um símbolo em sua homenagem. O tradicionalista virou tema de um mural de arte urbana inaugurado nesta semana em Porto Alegre. A obra fica no 4º Distrito da capital gaúcha e está visível e acessível para todos que passarem pela Rua Almirante Tamandaré, número 100, próximo à Avenida Voluntários da Pátria.
A obra foi criada por Eduardo Kobra, que tem três mil murais em cerca de 35 países e em diversas cidades e Estados brasileiros. O artista, que tem um novo projeto de resgate, manutenção e valorização das culturas regionais, cria murais destacando grandes nomes que contribuíram para a história e cultura do nosso País, como o compositor e poeta Zacarias Mourão (autor de “Pé de Cedro”), retratado em Coxim, no Mato Grosso do Sul.Para este mural, que está inserido no projeto, conta que estudou sobre Paixão Côrtes antes de iniciar os esboços para a imagem retratada na obra. “Foi uma honra fazer um mural de uma pessoa que contribuiu tanto para a cultura do gaúcho. Antes de pensar na arte, fiz uma pesquisa bem intensa sobre a vida e obra de Paixão Côrtes. Fizemos diversos esboços e mesmo quando julguei ter chegado ao desenho final, acabei mudando cores e alguns elementos depois de chegar na cidade. Espero que os gaúchos e turistas que visitarem o mural gostem do trabalho e se interessem ainda mais por essa personalidade tão marcante”, diz Eduardo Kobra.
Foi uma honra fazer um mural de uma pessoa que contribuiu tanto para a cultura do gaúcho.
Responsável por convidar Kobra para criar o mural, o CEO da ABF Developments, Eduardo Fonseca, recepcionou os cerca de 200 convidados no Galpão 4D – espaço onde fica a obra e que receberá, até o fim do ano, uma série de operações gastronômicas. Recepcionados no espaço externo do galpão, o público se mostrou surpreso e encantado com a imagem de 16 metros de largura e 10 metros de altura.
“Esse era um sonho de muito tempo e faz muito sentido o mural ser no 4º Distrito, pois é um espaço que está sendo revitalizado, valorizando a região e trazendo um novo ponto turístico para Porto Alegre”, afirmou Fonseca.
Conheça a obra em detalhes
Com as características inconfundíveis dos murais assinados por Kobra – imagens realistas, com cores fortes e contrastantes e elementos geométricos–, a obra apresenta uma imagem gigante de Paixão Côrtes segurando a Chama Crioula, tradição iniciada por ele em 1947. Também integra a arte a figura do Laçador, de Antônio Caringi, estátua para a qual o tradicionalista serviu de modelo em 1954.
“Ter Paixão Côrtes ao lado do Laçador e da Chama Crioula que ele acendeu há 75 anos, ver ele, junto de símbolos do Rio Grande, faz com que as pessoas tenham vontade de saber quem foi essa figura, saber mais sobre o trabalho dele e conhecer o que ele fez”, disse emocionado Carlos Paixão Côrtes, filho do homenageado, que estava acompanhado de outros membros da família. Antonella Caringi, neta do escultor Antônio Caringi, também prestigiou o evento.
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Artista expõe a céu aberto
Em todos os trabalhos, Kobra busca democratizar a arte e transformar as ruas, avenidas, estradas e até montanhas em galerias a céu aberto. Dois desses murais entraram no Guinness World Record como o “maior mural do mundo”. Primeiro “Etnias – Todos Somos Um”, no Rio de Janeiro, com cerca de três mil metros quadrados e, depois, o “Mural do Chocolate”, localizado na rodovia Castello Branco, em Itapevi, em São Paulo, com 5.742 metros quadrados. Em 2018, pintou 20 murais nos Estados Unidos, 18 deles em Nova York.
Em setembro de 2022, o artista inaugurou um mural em uma das fachadas da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, e realizou, em San Marino, o impressionante mural de 1.300 metros quadrados que conta a história e a lenda do país e do Monte Titano. Já em novembro, fez o primeiro mural de um artista brasileiro no Walt Disney World Resort, e no mesmo mês, foi inaugurado, na zona Sul de São Paulo, um mural sobre o heptacampeão de Fórmula 1 Lewis Hamilton.
O legado de Paixão
João Carlos D’Ávila Paixão Côrtes – ou Paixão Côrtes, como ficou conhecido – dedicou sua vida à pesquisa, construção e difusão da cultura do Rio Grande do Sul. Foi, com Luiz Carlos Barbosa Lessa e Glauco Saraiva, um dos idealizadores do movimento tradicionalista no Rio Grande do Sul. Sua trajetória se confunde com lugares e acontecimentos igualmente representativos: viveu em Uruguaiana e em Porto Alegre, onde estudou no IPA (Instituto Porto Alegre), no Colégio Júlio de Castilhos e graduou-se em Agronomia pela Ufrgs.
Inquieto, muito jovem, aos 20 anos, Paixão Cortês se aventurou pelo Rio Grande do Sul para registrar a história, os hábitos e os costumes de homens e mulheres que habitavam o Estado. Com seu trabalho e pesquisas, contribuiu para que a cultura gaúcha fosse conhecida não só em outros estados e países, mas também no próprio Rio Grande do Sul. As danças, vestimentas e culinária, por exemplo, que em muitos lugares estavam esquecidas, foram “regatadas” por ele.
Paixão Côrtes iniciou os costumes da Chama Crioula, do Desfile dos Cavalarianos e da Ronda Crioula (depois transformada em Semana Farroupilha); fez parte da criação do primeiro CTG (Centro de Tradições Gaúchas) da história, em 1948; e também contribuiu para a difusão da música gaúcha no País e no Exterior.
Foi apresentador da rádio Gaúcha, gravou e lançou diversos LPs, apresentou prêmios e venceu outros, como o de Melhor Realização Folclórica Nacional e Melhor Cantor Masculino de Folclore do Brasil. Também recebeu a Ordem do Mérito Cultural. Entre as inúmeras entrevistas, falou à BBC de Londres sobre o panorama da música gaúcha e brasileira.
Eclético e sem medo de ousar, atuou como ator nos filmes Paixão de Um Gaúcho, em 1958; e Um Certo Capitão Rodrigo, em 1971, de Anselmo Duarte, baseado na obra do escritor gaúcho Érico Veríssimo, no papel de Pedro Terra. Em 2009 foi agraciado com o título de Cônsul Cultural do Sport Club Internacional, seu time do coração. Em 2010, foi escolhido patrono da 56ª Feira do Livro de Porto Alegre.
Faleceu no dia 27 de agosto de 2018, aos 91 anos.
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