“Olha, achei minhas agulhas de costura. Mas não tem como usar elas mais”, disse, cabisbaixa, a aposentada Geni Moura da Silva, de 85 anos, moradora do bairro Campina, em São Leopoldo, na segunda vez em que voltou à sua casa após a enchente de maio. Na residência da idosa a água chegou ao telhado e a moradia ficou mais de 2 metros submersa durante 24 dias.
Na última semana, ela e o filho Diego Moura da Silva, 39 anos, acompanharam a tão aguardada vistoria na residência, feita por uma das arquitetas contratadas pelo Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU-RS) para auxiliar no processo de avaliação de casas afetadas pelas cheias e de consequente realização dos laudos técnicos sobre elas.
100 arquitetos
Presidente do CAU/RS, Andréa Hamilton Ilha explicou que o conselho apresentou uma série de propostas de ações a médio e longo prazo que entendeu importantes para a reconstrução das cidades. “Mas ainda está sendo necessário o atendimento de uma demanda muito grande e urgente de elaboração de laudos atestando a situação das casas que foram atingidas, para possibilitar o acesso aos recursos disponibilizados pelo governo federal”, colocou.
Por isso, de acordo com Andréa, o CAU/BR disponibilizou R$ 1 milhão e, junto com o CAU/RS, fez a contratação de 100 arquitetos, que estão fazendo 2 mil laudos dentro do programa Assistência Técnica de Interesse Público (ATIP), nas cidades de São Leopoldo e Canoas. O conselho paga os honorários dos arquitetos e as prefeituras indicam os endereços e dá apoio para os profissionais contratados realizarem os trabalhos em campo.
“Os laudos elaborados pelos arquitetos permitirão aos moradores saber se suas casas podem ser habitadas ou se oferecem riscos e servirão de base para as famílias se habilitarem em programas de moradia do Governo Federal, como o Minha Casa Minha Vida – Reconstrução”, completou a presidente. A execução das vistorias vem acontecendo durante o mês de outubro e o projeto deve encerrar na próxima quinta-feira (31).
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Laudos devem ser entregues em 20 dias
A ação na casa de Geni contou com as presenças da Defesa Civil municipal, com servidores da Superintendência de Urbanismo da Secretaria Municipal de Habitação (Semhab) e colaboradores do CAU.
“A gente organizou um credenciamento a nível nacional de profissionais de arquitetos para estarem fazendo vistoria e elaborando o laudo técnico desses imóveis atingidos pelas enchentes”, detalhou a representante do CAU, Sandra Becker, lembrando que eles passam por capacitação antes de iniciar o trabalho.
O titular da Superintendência de Urbanismo, João Henrique Dias, ressaltou a importância do laudo para comprovar a situação de sua casa. “Para a pessoa que teve sua casa atingida, receber os recursos do Minha Casa Minha Vida, teria que comprovar que sua casa não poderá ser recuperada. Para isso, é necessário que um responsável técnico faça esse laudo, para que a pessoa receba o recurso necessário”, afirmou.
Os laudos devem ser entregues em 20 dias, depois passam por um procedimento de conferência dentro da prefeitura, confirmação das informações com os moradores, e, após, vão pro cadastro nos programas federais. Segundo a Semhab, a análise final é de um técnico do governo federal, ou da Defesa Civil nacional ou do Ministério das Cidades. Não há prazo para que essa análise aconteça.
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Edificação insegura
A arquiteta responsável por avaliar a casa de dona Geni, Estefânia Duha, constatou que a residência não é segura. “É uma situação bastante recorrente nas vistorias que eu fiz: casas em alvenaria, de um pavimento, com fundações rasas ou blocos em pedra, em que a erosão do solo fez com que essas fundações cedessem, gerando rachaduras e fendas, em dimensões que a gente pode até enxergar a luz do lado de fora. A estrutura está bastante comprometida”, afirmou.
“Podemos perceber também infiltração pelo telhado, quer dizer que esse telhado sofreu movimentação. O contrapiso também está cedendo, o piso quebrando. Isso torna a edificação insegura, deixa essa estrutura bastante fragilizada, e, em muitos casos, o mais considerável é a demolição e reconstrução”, concluiu.
“Nunca tinha pego enchente aqui”
A aposentada Geni morava sozinha na casa, que fica na Rua dos Motoristas, há mais de 30 anos. “Nunca tinha pego enchente aqui”, comentou a idosa. “Entrei aqui (no sábado, 4 de maio) para buscar a mãe com água só no pé. Levantamos algumas coisas, pegamos documentos dela e uma TV. Em uns 10 minutos, a água já estava passando o joelho”, comentou Diego.
Depois que a água baixou, a casa foi invadida e teve tomadas, fiação elétrica e um fogão a lenha furtados. Diego reforçou as trancas e deixou a moradia como estava, à espera da vistoria. Durante a ação, Geni pode observar o estrago deixado pela inundação, encontrando fotos e objetos que já não deve recuperar.
Agora, enquanto aguarda o laudo, a idosa mora numa peça de aluguel custeada com ajuda do filho. “Estou esperando aluguel social”, disse.
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Quase 5 mil vistorias solicitadas
Além da iniciativa do CAU, vistorias foram feitas também pela prefeitura, por arquitetos e engenheiros voluntários, e outros convênios, como com a Unisinos.
A Defesa Civil Municipal recebeu, desde maio, mais de 4,9 mil pedidos de vistorias, dos quais cerca de 3 mil já foram atendidos. A previsão é que, com a parceria dos arquitetos do CAU, mais mil vistorias sejam realizadas, e os laudos entregues aos moradores até novembro.
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