FUMAÇA DE VOLTA

Queimadas fazem com que Feevale registre maior índice de poluição já captado no Centro de Tecnologias Limpas

Níveis de material particulado por metro cúbico é 10 vezes maior do que o recomendado pela Organização Mundial da Saúde

Publicado em: 23/09/2024 19:37
Última atualização: 23/09/2024 19:38

As fumaças das queimadas pelo País retornaram ao Rio Grande do Sul. O céu voltou a ficar branco, mas, além do visual, o que se agrava são os riscos à saúde por conta da poluição no ar. Tanto é que, nas últimas semanas, alunos do Programa de Pós-Graduação em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale registraram o maior índice de poluição já captado no Centro de Tecnologias Limpas da Feevale, em Novo Hamburgo.


Cleisson Bueno analisa as amostras coletadas do ar Foto: Dário Gonçalves/GES-Especial

Conforme a professora Daiane Berlese, existem dois tipos de material particulado envolvidos na qualidade do ar, que podem ser trazidos pela fumaça. Um de diâmetro de 2,5 micrômetros ou menos (MP2,5), que são as partículas finas, e outro de 10 ou menos (MP10), referente às partículas grossas.

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Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), o máximo aceitável é de 15 microgramas de metro cúbico de MP2,5 e 45 de MP10. Contudo, os estudos dos acadêmicos Cleisson Guimarães Bueno, Ana Carolina de Quadros Duarte, Morgana Aline Weber, Leila Elisa Gartner e Joelma Silva Hoch registraram valores de MP2,5 de 63,95 g/m³, enquanto o MP10 apresentou níveis alarmantes de 423,90 g/m³ — ou seja, quase 10 vezes acima do aceitável.


À direita, o filtro como está 48 horas monitorando a qualidade do ar; à esquerda, um filtro após 24 horas Foto: Dário Gonçalves/GES-Especial

“O MP10 suspenso na atmosfera fica retido na via aérea superior, causando coceira e irritação. Ele é cinco vezes menor que um fio de cabelo. Já o MP2,5, é 20 vezes menor que o diâmetro de um fio de cabelo e pode conter pólen, fuligem, poeira, microplástico, entre outros. Esse é o grande problema, porque ela vai para os pulmões e para o sangue, podendo causar obesidade, diabetes, problemas cardiovasculares, prematuridade, entre outros problemas de saúde”, alerta Berlese.

Conforme a Metsul Meteorologia, as cenas de céu mais acinzentado e com aspecto fosco devem continuar ao longo desta semana em todo o Sul do Brasil, mas principalmente no Rio Grande do Sul. “O número de focos de calor por queimadas neste mês no Brasil já chega a 71.019, já acima da média histórica de setembro de 64.052. Se o mês terminasse hoje, já seria o setembro com mais fogo da série histórica do monitoramento de satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais desde 2010”, diz o site.

Tendência é de melhora com a chuva

Segundo dados do site suíço IQAir, o índice de qualidade do ar registrado em Porto Alegre nesta segunda-feira (23) é de 147, levando em conta o MP2.5 como poluente principal. “A concentração de PM2,5 em Porto Alegre é atualmente 10,8 vezes maior que o valor da diretriz anual de qualidade do ar da OMS”, afirma o IQAir.

O índice, considerado insalubre para grupos sensíveis, deve continuar nesta terça-feira (24), com a marce de 107. A queda para um índice moderado ocorre na quarta-feira (25), com o índice de 90, e ainda mais na quinta com a chegada da chuva, baixando para 51. Na sexta-feira, também em dia de chuva, o índice deve voltar a ser considerado bom, com a marca de 20.

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A Metsul explica ainda que, conforme a tabela de AQI (Air Quality Index), valores entre 0 e 50 (verde) são bons. Entre 51 e 100 (amarelo) são considerados moderados. Nesta faixa, a qualidade do ar é aceitável. No entanto, pode haver risco para algumas pessoas.

Já valores entre 101 e 150 (laranja) indicam má qualidade do ar e insalubre para grupos sensíveis. Marcas entre 151 e 200 (vermelho) são insalubres e, nesta faixa, algumas pessoas do público em geral podem sofrer efeitos na saúde e membros de grupos sensíveis podem sofrer efeitos mais sérios. Índices entre 201 e 300 (púrpura) apontam para condições muito insalubres. Neste caso, o risco de efeitos na saúde pela poluição atmosférica é aumentado para toda a população.

O que pode ser feito?

Conforme a professora Daiane Berlese e o mestrando Cleisson Guimarães Bueno, este é um problema macro, que só pode ser resolvido com políticas públicas visando a recuperação do meio-ambiente. “A orientação, então, é que as pessoas não pratiquem exercícios ao ar-livre nesses dias. Quem for mais suscetível, que use máscara, mantenha os ambientes fechados, use o ar-condicionado do carro, já que ele passa por filtros”, orienta Bueno.

Para Berlese, o cenário ideal é que cada município, ao menos cada região, tenha esse monitoramento para poder identificar o foco poluente e agir contra ele. “Hoje, nós temos apenas 13 estados com monitoramento no Brasil. O equipamento que temos é único no país e veio da Espanha. Com ele, não conseguimos parar as queimadas ou melhorar o ar, mas identificamos que essa poluição é referente à fumaça”, afirma.

Estação de monitoramento da qualidade do ar instalada próximo ao Câmpus II da Universidade FeevaleDário Gonçalves/GES-Especial
Professora Daiane Berlese e o aluno de mestrado, Cleisson Guimarães BuenoDário Gonçalves/GES-Especial
Estação de monitoramento da qualidade do ar instalada próximo ao Câmpus II da Universidade FeevaleDário Gonçalves/GES-Especial
Estação de monitoramento da qualidade do ar instalada próximo ao Câmpus II da Universidade FeevaleDário Gonçalves/GES-Especial

Os dados do Centro de Tecnologias Limpas (CTL) da Feevale não são públicos, pois basicamente são obtidos a partir de trabalhos acadêmicos e divulgados em revistas científicas. O trabalho é feito por demanda, identificando os fatores poluentes, de onde eles vêm e, assim, definir o que pode ser feito.

Além da estação fixa presente no CTL, há também uma móvel, usada pelos alunos, para trabalhos de campo. E foi com ela que os acadêmicos identificaram o índice de 423,90 g/m³ em setembro de 2024, em Novo Hamburgo. Para se ter uma ideia, no mesmo mês, em 2022, o índice era de 22,88 g/m³. O monitoramento é feito a uma altura entre 1,60m e 1,70m, para simular a altura de um nariz humano.

“Quando vemos uma água escura, a gente não toma. Mas quando isso ocorre no ar, não temos o que fazer, somos obrigados a respirar e isso pode nos trazer sérias consequências de saúde, tanto imediatamente, quando a longo prazo e passando a futuras gerações”, finaliza a professora.

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