HISTÓRIA DA RODOVIA

Há 70 anos, famosas corridas de carreteras fechavam a BR-116 aos domingos

A rodovia era de terra, com pista simples, e recebia pilotos em circuito que ia de Caxias do Sul a Porto Alegre; veja fotos da antiga BR-2

Publicado em: 25/03/2023 13:13
Última atualização: 26/02/2024 08:55

Em uma época em que tanto se fala sobre a necessidade de aumentar a capacidade da BR-116, que chega a receber 120 mil veículos por dia entre Novo Hamburgo e Porto Alegre, é difícil imaginar que essa rodovia pudesse ser fechada para receber eventos automobilísticos. Pois isso acontecia entre as décadas de 40 e 50 na antiga BR-2, a estrada federal que ligava Caxias do Sul a Porto Alegre.

A rodovia teve seu início na década de 30, projetada por Getúlio Vargas, para ser uma via que ligasse o Brasil de uma ponta a outra.

Corrida na BR-2 na esquina com a Rua 24 de Outubro, em Novo Hamburgo, em 1.º de março de 1953. Na foto, carro 32 do piloto Waldir Rabedrini Foto: Arquivo pessoal
Quem vivia às margens da estrada em Novo Hamburgo, como os moradores dos bairros Rincão, Primavera e Centro, procuravam um barranquinho e assistiam as corridas de "carretera" de camarote. Ainda mais em um tempo onde a televisão não existia no Brasil e nem se imaginava como seria um telefone celular, poder acompanhar uma disputa entre carros era um programa e tanto.

Essas são lembranças guardadas com carinho pelo empresário Ari Alfredo Harff, 72 anos, que quando criança morava na Rua Arariboia. Filho do marceneiro e artesão Alfredo Bruno Harff, Ari acompanhava com os amigos as corridas de baratinha*, populares naquele tempo. Seu pai, que tinha uma máquina Kodac e gostava de fazer retratos da família, aproveitava também para registrar o que acontecia na cidade. “Quando saía para passear de lambreta, sempre levava a Kodac junto”, recorda Ari.

Na pista simples, de chão batido, quando os carros passavam, levantavam poeira. Ari lembra que os pilotos mais famosos eram os irmãos Catharino e Julio Andreatta e o ex-presidente do Sport Clube Internacional, José Asmuz. Aliás, Catharino e Asmuz eram as maiores estrelas das corridas de "carreteras" na década de 50. Catharino fazia parte da Escuderia Galgos Brancos, equipe gaúcha de competição, que correu as Mil Milhas Brasileiras, em São Paulo, em 1956.


“Mas eram umas corridas mais ‘ligth’. Eles mexiam nos carros para ter mais potência, mas nada comparado ao que a gente vê hoje”, comenta Ari. Os veículos eram normalmente os cupês Ford ou Chevrolet, modificados com motores V8 de Corvette ou de Ford Thunderbird.

“E se tinha uma chance para ver eles passarem. Se perdeu, perdeu. Por isso, quando todos os carros terminavam de passar, o pessoal voltava para casa”, recorda.

O historiador Paulo Spolier, professor da rede municipal, também já se interessou pelo assunto e descobriu outras peculiaridades. “As corridas que passavam pela BR-116 eram narradas pelo jornalista Cândido Norberto da sacada do Abrigo Getúlio Vargas”, comenta. Este abrigo servia de rodoviária para os ônibus intermunicipais e interestaduais.

De acordo com ele, as corridas eram chamadas popularmente tanto de baratinhas como de "carretera". No entanto, a segunda opção ficou mais popular no Rio Grande do Sul porque foi adaptado das corridas que aconteciam no Uruguai e na Argentina. 

Para que essas memórias sobre a história de Novo Hamburgo não se percam, Ari decidiu doar as fotografias para o acervo da Fundação Ernesto Frederico Scheffel. “Sou filho único e herdei todas as fotos do meu pai. Decidi doar para que não se percam”, conta.

Conforme Spolier, a fundação está digitalizando acervos familiares, preservando a posse do acervo, mas compartilhando de forma digital com a comunidade. A instituição já tem mais de 10 mil registros catalogados. Quem quiser solicitar algum material pode entrar em contato pelo e-mail  museudeartescheffel@gmail.com.

Você sabia

  • A BR-116, de acordo com o Departamento Nacional de Infraestrutura e Transportes (Dnit), é a maior rodovia longitudinal do Brasil, com 4.566,5 quilômetros.
  • Ela foi inaugurada em 9 de novembro de 1941, chamada de Estrada Federal Getúlio Vargas, sob administração do antigo Departamento Nacional de Estradas e Rodagens (DNER).
  • A via vai de Fortaleza, no Ceará, a Jaguarão, no sul do Estado, junto à divisa com o Uruguai. A BR-116 passa ainda por Russas (CE), Jaguaribe (CE), Salgueiro (PE), Canudos (BA), Feira de Santana (BA), Vitória da Conquista (BA), Teófilo Otoni (MG), Muriaé (MG), Leopoldina (MG), Além Paraíba (RJ), Teresópolis (RJ), Rio de Janeiro (RJ, Barra Mansa (RJ), Lorena (SP), São Paulo (S), Registro (S), Curitiba (PR), Lages, Porto Alegre (RS) e Pelotas (RS). 
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