Via de regra, são os filhos que aprendem com os pais ao longo da vida, desde os primeiros passos na infância a como fazer as tarefas burocráticas da vida adulta. Mas na prática os papéis acabam se fundindo, e são os filhos que passam a ensinar os pais, seja dando uma ajudinha para utilizar as redes sociais, mostrando como usar o controle do videogame ou até experimentar uma atividade nova pela primeira vez motivado pelo filho.
Com apenas 1 ano e 10 meses, a pequena Maria Rafaela Squena dos Santos já conseguiu fazer com que o pai saísse da zona de conforto e vivesse uma nova experiência por sua conta. O consultor de seguros Eduardo Silva dos Santos, 34, não era um grande amante de atividades aquáticas. Ele confessa que nunca foi daquelas pessoas que ficam horas na piscina ou que não percebem a hora passar quando entram no mar.
Entretanto, foi da vontade de fazer com que Maria Rafaela soubesse nadar desde pequena que ele e a mãe, a farmacêutica Anaína Squena de Oliveira, 36, optaram por colocar a pequena em aulas de natação. Só que, para isso, Eduardo precisou deixar de lado seu anseio com a água, já que ele seria o responsável por participar da atividade com a filha.
“Como eles são pequenos, durante as aulas os pais precisam estar juntos. Esse momento é nosso, a gente tem um tempo de qualidade, e com isso eu estou aprendendo a gostar mais da água por conta dela”, revela.
Todos os sábados a família, que reside em Novo Hamburgo, se desloca a uma academia de natação em Estância Velha. Eduardo conta que é ele quem prepara Maria, veste ela com o maiô e touca de natação.
Aproximação entre pai e filha
Do casal, Anaína é quem adora água, entretanto, o pai relata que ele optou por acompanhar a pequena para poder criar um vínculo maior com a filha e criar memórias entre os dois. “Eu busquei ser mais próximo dela porque os filhos, geralmente, têm uma proximidade maior com a mãe por conta da amamentação. Então, a natação foi uma forma de dar continuidade com esse processo”, diz.
E esse vínculo criado durante as aulas de natação é estendido para a rotina diária. As músicas que cantam juntos na piscina são a trilha sonora de outras atividades entre os dois. “É uma aula bem lúdica, cantamos músicas e estimulamos o bebê a fazer a performance de natação. Essas musiquinhas a gente canta quando vai na pracinha”, disse ele, revelando que, nas horas vagas, Maria pede para tocar as canções em casa e dança junto com os pais.
O professor universitário Guilherme Theisen Schneider, 43, revela que, desde que se tornou pai das filhas Isabela Mendieta Schneider, de 10 anos, e Paloma Mendieta Schneider, de 7 anos, tem aprendido todos os dias sobre o universo delas. Entre as habilidades que adquiriu, estão o cuidado com a pele, maquiagem, combinação de vestimentas, entre outros. “São coisas que eu nunca tive interesse, mas que elas gostam e eu aprendi por conta disso”, diz.
Essa iniciativa serve como uma aproximação entre os três. Schneider relata que passou a observar o que prendia a atenção das filhas em coisas banais, como as séries que assistiam. “Elas vêm com referências que eu não tenho e isso faz com que eu compreenda o universo delas. Elas vão me ensinando a gostar de coisas diferentes do que seria o meu cotidiano”, revela.
Dançar com o pai é trend
Nas redes sociais, coreografias e danças são comuns entre as publicações dos jovens. Mas o que virou trend – termo em inglês utilizado para se referir a tendência – foi os filhos ensinando os pais os passos que viralizam na internet. O pai e filha, Pablo Beck Puhle e Verônica Della Vecchia Beck Puhle, de apenas 10 anos, dançam juntos em frente ao espelho e encantam nas redes sociais. No TikTok, a dupla soma 5 milhões de seguidores e vídeos que superam 25 milhões de visualizações.
@pabloeveronicaoficial
Em Novo Hamburgo, antes mesmo das redes sociais terem o potencial que se tem, o professor de dança e proprietário de uma escola de dança em Novo Hamburgo, Alex Sandro Gomes, 46, já ensinava os primeiros passos do Hip Hop para os filhos. Ele conta que o caçula, Vinicius Gomes, de 19 anos, seguiu no caminho da dança e hoje é ele quem ensina Alex. “Hoje tem coisas dentro da dança que são tecnicamente muito aprofundadas e ele acaba estudando e me dá essa informação, me ensina o que eu ainda não sei”, relata.
Já o filho mais velho, Rafael Richter, 26, decidiu seguir um caminho diferente e hoje é empresário no ramo de tecnologia. Entretanto, Alex revela que é o conhecimento do primogênito que ajuda o negócio da família a se manter ativo nas redes sociais. “Eu não sou tão velho, mas para a tecnologia é algo que a minha geração já não domina tanto. A gente grava vídeo para a escola e precisa editar e eu já peço para o Rafa me ajudar”, admite ele, que se sente extremamente feliz em poder ter essa troca com os filhos.
Benéfico para todos
O processo de ensinar e aprender é uma via de mão dupla, como explica a professora de Psicologia da Universidade Feevale, Claudia Teixeira Goulart. Ela afirma que se tinha a ideia de que o adulto seria quem ensina e a criança quem deveria absorver a informação, mas isso tem mudado. “Quando a gente enxerga essa perspectiva de ensinar e aprender juntos, a gente abre essa perspectiva de que a aprendizagem circule”, destaca.
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Para Schneider, “pais que não querem aprender com os filhos estão perdendo de como entender a geração”. A psicóloga concorda e afirma que se permitir a experimentar algo novo proposto pelos filhos é uma ação benéfica para os dois indivíduos. Para os pais, segundo ela, produz uma sensação de pertencimento e para os filhos proporciona um sentimento de reconhecimento e de ser visto como alguém que também pode ensinar.