Mesmo com a baixa do nível do Rio dos Sinos, muitas residências ainda seguem embaixo d’água no bairro Santo Afonso, em Novo Hamburgo. Com isso, o que se vê na região são contrastes de realidades: pessoas que começaram a limpar suas residências para tentar voltar e aqueles que permanecem nas áreas alagadas por medo de furtos.
Para ajudar os moradores que seguem no segundo andar das casas, voluntários do próprio bairro se revezam para entregar suprimentos aos que fazem a vigilância dos lares.
Marcos Rodrigues da Silva (conhecido como Marquinhos), 40, é um dos que está fazendo a frente para ajudar a comunidade. Ele, outros moradores e empresários do bairro Santo Afonso – também atingidos pela enchente – estão desde quinta-feira (2) prestando apoio aos vizinhos.
Nesta quarta-feira (8), o vento dificultou os trabalhos, já que a correnteza na região era forte. Entre idas e vindas, ele, o irmão, João Fernando Rodrigues, 41, e outro morador, Rogério Bittencourt, 47, utilizaram uma lancha para levar água, comida, ração para animais e até gás de cozinha para os vizinhos.
Os três foram totalmente atingidos pela enchente. Conforme conta Silva, quando a água começou a subir no bairro, ele se preocupou em ajudar o pessoal a sair das casas. “Quando o dique estourou, aí eu não consegui tirar nada nosso, meus carros, caminhões da empresa, ficou tudo debaixo da água, porque eu estava ajudando o pessoal e achei que teríamos tempo”, relembra o sócio da Transporte João de Deus.
Mesmo tendo sido afetado pela água, ele segue na linha de frente dos trabalhos junto com outros moradores. Questionado sobre de onde busca força para seguir ajudando, ele prontamente respondeu: “Nós ainda vamos ter como recomeçar, mas mais de 100 famílias que eu vi aqui na Santo Afonso não vão ter para onde ir, porque as casas caíram, viraram”, lamentou.
Muitos moradores de casas mais altas também têm voltado para suas residências para buscar alguns pertences, como documentos e até mesmo eletrodomésticos. Foi o caso de um homem flagrado pela reportagem, que com ajuda de um barco, buscou a geladeira e o galo que ainda permaneciam na residência.
Já o morador Guilherme Vicente Neves, 26, conta que segue fazendo a segurança da casa com o pai Flávio Vicente Neves. Durante o dia, eles saem para se alimentar e ao fim do dia retornam para casa com a ajuda de voluntários. “Estamos ficando no segundo andar da casa para evitar que roubem. Tem três casas de dois pisos na rua e tá todo mundo lá. Pegamos os alimentos aqui e levamos para lá”, explica.
Durante a manhã, ele e o pai saíram para levar roupas para a mãe, que está abrigada no bairro Vila Nova. “Nos revezamos para dormir. Viemos aqui, pegamos as marmitas e depois voltamos. Estamos esperando a água baixar”, diz, esperançoso. “Vamos dar a volta por cima. O que importa é que estamos com saúde”, completa Neves.
O que se vê
A reportagem circulou com os voluntários pela área da Vila Palmeira, que segue completamente alagada e em alguns locais com água até o telhado. Os próprios moradores acabam tendo dificuldade para circular pelas ruas que viraram rio. Há muitos fios baixos e a correnteza também atrapalha a circulação. Nesta quarta-feira, a recomendação era que somente barcos com motor fizessem a travessia.
Durante o percurso, a lancha precisou resgatar a equipe de voluntários do Grupo de Resgate Animal de Belo Horizonte (GRABH). Eles buscavam dois cachorros da raça Golden e não conseguiram voltar para a parte seca do bairro por conta da correnteza.
Vídeo mostra operação dos moradores:
Doações de colchões para moradores do bairro
Além da ajuda com os resgates e a entrega de suprimentos, o grupo coordenado pelo Marquinhos também segue preocupado com as doações, já que, conforme a água recua das casas, outro problema vem à tona: a falta de itens básicos em um lar, como colchões para dormir.
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Foi pensando nisso que Silva se reuniu com outros empresários do bairro para adquirir colchões e doar para a comunidade afetada. A entrega foi feita nesta quarta, e beneficou pessoas abrigadas na casa de parentes e aqueles que já estão tentando voltar para suas residências.
“Estamos arrecadando para fazermos a distribuição. Os colchões e coisas que estamos entregando são para o pessoal daqui. Os colchões são para quem está dormindo na casa de parentes, para terem um conforto. E para os que já começaram a retomar para suas casas também”, explica.
A dona de casa Regina da Silva Barbosa, 59 anos, foi uma das dezenas de pessoas que aproveitaram para levar um colchão para casa. “Esse pessoal está desde o começo ajudando o povo. Se não fosse eles, muitos empresários e muitas outras pessoas, eu não sei o que seria de nós”, agradeceu a moradora da Vila Palmeira, que reside no local há 35 anos.
Desde sexta-feira (3) fora de casa, ela está abrigada na casa de um filho, em Canudos. “Nós não temos nada. Perdemos tudo. Saímos com a roupa do corpo. Mandaram a gente evacuar a área e sair”, relembra. “Estou tirando forças de Deus. Sou depressiva, nem sei como estou conseguindo me manter forte”, completa.