Trabalhando no Mercado Público desde 11 anos, Marcelo Santana, de 55 anos, lembra daquela fatídica tarde de sexta-feira, no dia 3 de maio, quando a água começou a avançar em direção ao prédio no Centro Histórico de Porto Alegre.
“A gente observava, mas ninguém aqui acreditava que pudesse subir tanto”, recorda. “Por isso, a maioria só baixou as cortinas e foi para casa. Ninguém tentou salvar nada. Só que o inimaginável aconteceu”.
Santana é parte do grupo de trabalhadores que se esforça para garantir a reabertura do Mercado Público, marcada para a manhã desta sexta-feira (14), após 40 dias de atividades encerradas devido à inundação na capital.
A Secretaria Municipal de Administração e Patrimônio (Smap) de Porto Alegre organizou uma reabertura parcial, contando com 13 lojas que atuam no segundo piso do empreendimento. As bancas no térreo retornam no dia 18.
Segundo o secretário André Barbosa já é mais do que hora de recuperar a alma de Porto Alegre após duas semanas de trabalho intenso que contou com a colaboração ativa dos “mercadeiros” e clientes do Mercado.
“Foi um esforço muito grande, mas valeu a pena”, afirma. “O Mercado Público é a alma de Porto Alegre e acreditamos que esta reabertura represente uma retomada da economia na capital, sensivelmente abalada desde a cheia”.
Gerente do café Baden, que retoma atividades nesta sexta-feira, o viamonense Leomar Gonçalves, 35 anos, passou a quinta-feira (13) oferecendo cafés gratuitamente para quem estava trabalhando na retomada do Mercado.
“É uma satisfação muito grande poder voltar e me sinto honrado em fazer parte desta história de reconstrução”, diz. “O pessoal pegou junto e servir café é o mínimo que pude fazer para agradecer a este esforço”.
Economia
Com um movimento estimado de 300 mil pessoas por dia, o Mercado Público possui 132 lojas ocupadas e chegava a um faturamento médio de até R$ 600 mil diariamente, conforme a Secretaria de Administração e Patrimônio.
A abertura parcial, entende o secretário, não representa uma retomada garantida dos negócios. Isso porque é necessária a volta da circulação dos trens para que a circulação na área cresça novamente.
“A população das cidades da região metropolitana representa, no mínimo, 30% dos consumidores que circulam pelo Mercado Público. Sem os trens, os “mercadeiros” perdem esse movimento e, com isso, o faturamento”.
Barbosa lembra também que o prédio possuía 1.000 empregados diretos e mais 500 indiretos, contudo muitos ainda com dificuldades de retomar atividades devido à tragédia.
“Muita gente acabou perdendo a casa e ainda não conseguiu retornar ao serviço”, lamenta.
“O Mercado está mais limpo agora”
O secretário André Barbosa aponta um prejuízo de R$ 7 milhões devido à inundação do Mercado Público. Houve estragos nos elevadores, escadas rolantes, fiação elétrica e pintura interna e externa durante o período em que o prédio permaneceu com acúmulo de água.
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“Houve ajuda de grandes clientes na recuperação do espaço interno, porque o serviço de limpeza pesado não poderia ser feito simplesmente com água e sabão”, ressalta.
Barbosa complementa que todo o trabalho passou pelo aval da Vigilância Sanitária da capital, que garantiu não existir mais nenhum problema que impeça os clientes usuais do Mercado a retomar a circulação.
“Foi executado um trabalho pesado de limpeza”, defende”. “Podemos garantir que o Mercado Público está mais limpo agora que antes da inundação que atingiu o prédio”.
Crise, incêndio, pandemia e cheia
Há 45 anos com uma banca que se tornou referência em erva-mate na capital dos gaúchos, o hamburguense Roberson Groff, 52, aponta que, desde que herdou o negócio do pai, já passou por uma crise econômica, um incêndio, uma pandemia e, agora, uma cheia.
“Eu não sei mais o que falta acontecer”, desabafa. “A gente conseguiu salvar muito pouco da loja, mas estamos entusiasmados em poder reabrir ao público, porque o nosso público passa todo aqui pelo Mercado Público”.
Na avaliação do empresário responsável pela banca Rancho Gaúcho, não há culpados quanto ao que aconteceu, embora seja necessária uma reavaliação da situação das cheias no RS.
“Nosso problema é material e admito que me bateu uma tristeza muito grande quando consegui entrar no Mercado e ver o tamanho do estrago”, salienta. “Porém, os gaúchos morreram e devem ser tomadas medidas contra esse tipo de catástrofe”.