EM LAVOURAS DE ARROZ
Mais de 50 trabalhadores são resgatados em situação análoga à escravidão em Uruguaiana
Entre as vítimas encontradas durante operação conjunta da Polícia Federal, Ministério Público do Trabalho e Gerência Regional do Trabalho estão 10 adolescentes
Última atualização: 01/02/2024 14:36
Cinquenta e seis trabalhadores foram encontrados em situação análoga à escravidão em duas fazendas de arroz no interior de Uruguaiana, município localizado na fronteira do Rio Grande do Sul com a Argentina e o Uruguai. O resgate foi realizado na tarde desta sexta-feira, em uma operação conjunta entre a Polícia Federal (PF), o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Gerência Regional do Trabalho (GRT). Segundo dados da fiscalização do trabalho, este é o maior resgate já registrado na cidade.
A ação aconteceu depois que os órgãos receberam uma denúncia sobre a presença de jovens trabalhando sem carteira assinada em propriedades rurais. O grupo móvel de fiscalização foi até o local e encontrou os trabalhadores, todos homens, em situação degradante. Entre os resgatados, 10 deles adolescentes com idades entre 14 e 17 anos.
De acordo com a Polícia, além de precisarem percorrer a pé um trajeto de cerca de 50 minutos para chegar ao local de trabalho, eles faziam corte manual do arroz vermelho com instrumentos inapropriados (como faca doméstica de serrinha) e aplicavam agrotóxicos com as mãos, sem equipamentos. Em uma das propriedades, a aplicação de veneno era feita inclusive pelo método de "barra", em que dois trabalhadores aplicam o agrotóxico usando uma barra metálica perfurada conectada a latas do produto — tipo de atividade que exige equipamentos individuais de proteção.
Além disso, a comida e as ferramentas de trabalho eram por conta dos empregados. Conforme a PF, nessas condições, a comida estragava constantemente e os trabalhadores não comiam nada o dia inteiro. No entanto, se algum deles adoecesse, a remuneração era descontada.
O empregador foi preso em flagrante por redução à condição análoga a de escravo. Ele foi conduzido à Polícia Federal e será encaminhado ao Sistema Penitenciário.
Os trabalhadores, que eram da própria região, oriundos de Itaqui, São Borja, Alegrete e mesmo de Uruguaiana, foram encaminhados de volta a suas casas. Eles vão receber de imediato três parcelas de seguro-desemprego. Os empregadores também serão notificados para assinar a carteira de trabalho dos resgatados e pagar as devidas verbas rescisórias. Depois disso, o MPT vai pleitear pagamentos de indenizações por danos morais individuais e coletivos.
Estado acompanha o caso
As secretarias de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos (SJCDH) e de Trabalho e Desenvolvimento Profissional (STDP) estão acompanhando o fato desde sexta-feira.
Órgão da SJCDH, a Comissão Estadual para a Erradicação do Trabalho Escravo (Coetrae) foi imediatamente acionada, já a partir da articulação de grupo de trabalho criado por ordem de serviço do governador Eduardo Leite, após o caso ocorrido em Bento Gonçalves. “Estamos articulados para proporcionar que as vítimas de todos os episódios de exploração do trabalho sejam acolhidas da melhor maneira possível”, assegura o titular da SJCDH, Mateus Wesp.
Em paralelo, dentro da estratégia de enfrentamento transversal determinada pelo governo do Estado, a Secretaria de Trabalho e Desenvolvimento Profissional está atuando junto ao Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e ao Ministério Público do Trabalho (MPT) para garantir a liberação dos valores emergenciais a que os trabalhadores têm direito (seguro-desemprego), bem como para o devido pagamento das verbas rescisórias completas.
Equipes das duas secretarias estaduais deverão se deslocar para Uruguaiana na segunda-feira (13) para acompanhar no local os desdobramentos do episódio e colocar à disposição todos os serviços das pastas.