Um passeio por Novo Hamburgo, em um dia quente de dezembro, foi o primeiro de uma cadeia de eventos que culminou numa das tragédias mais emblemáticas da crônica policial do Rio Grande do Sul.
É o que aponta uma das hipóteses trazidas por um livro de não ficção recém-lançado que resgata os detalhes do Caso Kliemann, episódio que envolve dois homicídios que chocaram o Estado na década de 1960: o assassinato da esposa de um deputado e, um ano depois, a morte do marido dela, baleado em um estúdio de rádio – com a emissora ao vivo.
Em “O Caso Kliemann e seus personagens misteriosos”, o jornalista Ricardo Düren mergulha nos bastidores das investigações e mostra que tudo pode ter começado no Vale dos Sinos.
Oficialmente, as investigações policiais se iniciaram na noite de 20 de junho de 1962, quando o corpo de Margit Kliemann, esposa do deputado Euclydes Kliemann, foi encontrado no palacete da família em Porto Alegre.
Mas o inquérito foi um desastre. A polícia nunca chegou ao verdadeiro assassino, perdida em uma lista interminável de suspeitos e testemunhas, tais como uma certa “dama de vermelho”, personalidades da high society porto-alegrense e até uma cartomante.
No livro, Düren sustenta que o fiasco das investigações, à época, culminou na segunda tragédia. Euclydes Kliemann, outro integrante dessa lista de suspeitos, acabou baleado ao invadir o estúdio de uma rádio, revoltado com o discurso de um antagonista político que o acusara, ao vivo, de ser o provável assassino da esposa. O crime foi em 31 de agosto de 1963 em Santa Cruz do Sul, no Vale do Rio Pardo, cidade natal dos Kliemann.
A suspeita sobre o sobrinho bad boy
Mas o que Novo Hamburgo tem a ver com tudo isso? A cidade entra na história por uma das hipóteses detalhadas por Düren, a de que Margit tenha sido vítima de um latrocínio (roubo com morte).
Mas o assassino não teria sido um ladrão qualquer, e sim um sobrinho de Euclydes. O garoto de 17 anos era uma espécie de bad boy dos anos 60 – integrava uma gangue, tinha antecedentes por furtos e predileção por drogas.
Para entender essa hipótese, é preciso voltar ainda mais no tempo, até uma manhã de dezembro de 1959, quando Margit saiu com as três filhas à caça de sapatos para a família.
O destino era Novo Hamburgo, onde as quatro fizeram uma peregrinação por lojas e fábricas de calçados em busca dos últimos lançamentos. Mas aquele dia não terminaria bem.
Na volta, Margit se desequilibrou, caiu e machucou uma das pernas. O que parecia um tombo corriqueiro se transformou em uma rotina de sofrimento – as dores foram aumentando e nenhum tratamento convencional surtia efeito.
A melhora só veio com medicação pesada – cogita-se que, inclusive, com morfina, droga que também havia se tornado modinha das gangues de Porto Alegre. E o estoque de medicação que Margit mantinha em casa entrou no radar do sobrinho.
Indo além das conjecturas, no livro Düren traz mais elementos que apontam para uma possível tentativa de assalto ao palacete dos Kliemann, que acabou em tragédia.
Ou seja, tanto a morte de Margit quando a de Euclydes teriam sido fruto de uma cadeia de eventos que, nos moldes de um efeito borboleta, começaram na viagem a Novo Hamburgo.
Mas estaria solucionado o Caso Kliemann? Düren sinaliza que essa não é a única hipótese plausível e dá pistas de que, passados mais de 60 anos, o mistério segue em aberto.
Onde comprar o livro
“O Caso Kliemann e seus personagens misteriosos” (Clube de Autores, 2024, 248 páginas) é uma obra de não ficção, fruto de 15 anos de pesquisa e ilustrado com dezenas de fotografias e reproduções dos jornais da época. O autor, Ricardo Düren, é jornalista, escritor e doutor em Letras.
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Lançado exclusivamente em formato impresso, o livro pode ser adquirido no site do Clube de Autores (clique aqui para acessar), com distribuição em todo território nacional.