Com o auditório da Escola Senador Salgado Filho lotado, os moradores do bairro Piratini se reuniram com as equipes da Prefeitura de Gramado para entender o andamento dos estudos sobre os deslizamentos que aconteceram no local e as primeiras ações propostas pelo poder público.
Unindo as famílias das ruas Santo André, Henrique Bertoluci, Afonso Oberherr, Guilherme Dal Ri e Getúlio Vargas, 687 pessoas estavam fora de casa. Durante o encontro, na noite da terça-feira (11), os moradores da Getúlio Vargas foram informados sobre a autorização para que pudessem voltar às residências.
Na parte mais crítica do bairro, que está identificada como de alto risco, os profissionais propuseram algumas medidas iniciais, como a criação de uma força-tarefa para retirada de bens, já que há a estimativa de dois a três meses de estudos para que soluções definitivas possam ser apresentadas.
“A gente não fez esse encontro antes, porque não tínhamos muito o que dizer, infelizmente. Eu sei que tem muita gente fora de casa, que está aflito, e concordo plenamente. É um drama. A gente está com uma experiência difícil, nova, muito complicada”, afirma o prefeito Nestor Tissot.
O chefe do Executivo municipal lançou uma ideia no encontro que é fazer a desapropriação dos terrenos nas áreas em que não será mais possível retornar e indenizar os proprietários.
“Nós vamos desapropriar esses terrenos com as escrituras e a gente vai pagar esse valor para cada escritura que nos for apresentada”, aponta. Segundo ele, o plano é considerado o mais viável, pois se for destinada uma área pública, teria que ser construída uma infraestrutura no entorno, como escola, posto de saúde, sistema de água e esgoto, o que demoraria.
Monitoramento
A secretária do Meio Ambiente, Cristiane Bandeira, fez um apanhado do monitoramento que aconteceu no bairro ao longo do mês. As primeiras casas foram interditadas na Henrique Bertoluci no dia 2 de maio.
“Quero dizer que não foi fácil para a equipe chegar no local, analisar e pedir para que as pessoas desocupassem as suas casas. A gente compreende que a casa da gente contém não só o nosso patrimônio, mas a nossa história de vida. E é por isso que a gente tem tentado compreender aquilo que está acontecendo no nosso município. Procura-se muitos culpados. Até agora, não identificamos um único culpado”, descreve a secretária.
Conforme Cristiane, a convicção que se tem até o momento é que as fortes chuvas foram responsáveis pelos problemas apresentados em todo o município. Dados apresentados, mostram que choveu em torno de 848 milímetros no mês, com grande concentração nos dias 2 e 12.
Com auxílio de um drone, foi possível identificar os locais mais críticos, que formam praticamente um triângulo no bairro.
“Quando a gente fala desses eventos causados pela natureza, eles têm uma complexidade. E para eu entender essa complexidade, eu preciso de dados, medições, de monitoramentos. A gente não pode de forma alguma autorizar o retorno sabendo que vocês podem ainda correr algum risco de dano na edificação”, explica, ao informar o porquê as casas continuam interditadas.
Criação de uma força-tarefa para retirada de bens
A empresa BSE Engenheria foi contratada pela Prefeitura para realizar os estudos na área. Os especialistas em geotecnia, os engenheiros Luiz Bressani e Eduardo Simões, já estavam trabalhando em outros locais na cidade, como o Loteamento Orlandi e na Rua Nelson Dinnebier, também no bairro Piratini. Assim, tinham algum conhecimento sobre a geologia do município.
Para Bressani, que tem mais 40 anos de experiência na área, o grande desafio é que cada local possui uma particularidade. “A cor do solo, o tipo de rocha, a resistência do material, a permeabilidade. E, por causa disso, cada área oferece um tipo de comportamento”, adianta.
“Gramado é uma situação muito especial. Ela é bonita, é famosa porque é muito íngreme. Tem um topo rochoso, e embaixo é um sanduíche de maionese. Esse sanduíche, com muita chuva, começou a romper”, atesta.
Com as primeiras evidências encontradas, Bressani pondera que a primeira medida proposta é a criação de uma força-tarefa para a retirada de bens dos moradores. Nessa etapa, o intuito é buscar itens de primeira necessidade da comunidade. “Nós temos que ter a coragem de tentar fazer e a cautela de não correr risco demais”, afirma.
O engenheiro conta que é possível perceber que o movimento fica acelerado com a chuva e praticamente para nos dias secos. “Dá pra conviver com grau que a gente chama de risco tolerável”, cita.
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“A gente pode fazer um suporte provisório, tirar os bens e depois a gente faz uma coisa que é dura, que é demolir por segurança, se a casa estiver muito danificada”, prospecta.
A retirada desses pertences será realizada por uma equipe técnica. A cada dia, novas famílias que se cadastraram serão chamadas. A Prefeitura ressalta que não é obrigatório que as pessoas façam a retirada. Além disso, somente após os estudos é que será definido o futuro da localidade. “O que a gente está oportunizando é retirar alguma coisa que esteja fazendo falta, por exemplo, uma documentação, um medicamento, um aparelho. Isso não significa que a casa foi condenada”, complementa Cristiane.
As intervenções iniciaram na manhã desta quarta-feira (12), com a Secretaria de Obras fazendo a limpeza da rua. À tarde, cerca de cinco famílias cadastradas participarão no processo de retirada dos bens. Depois que todos forem chamados, as casas colapsadas serão demolidas.
“Todos os dias nós reavaliamos a situação e vamos começar a mudar o cenário”, avalia Cristiane, sobre a possibilidade de retorno dos moradores de áreas que não apresentarem risco crítico.
Risco de desmoronamentos
De acordo com Bressani, as rupturas não aparecem nas casas e sim nas ruas. “Mesmo que não tenha fissura, não dá para liberar as casas. As evidências que nós temos é que as casas lá de cima (Rua Santo André) podem vir a romper. As casas embaixo estão sendo empurradas. E são evidências absolutamente técnicas que nós trabalhamos, não é achismo”, comenta.
Ainda conforme o engenheiro, existem duas linhas de falhas na geologia no bairro. Uma ainda desconhecida.
“Nós vamos ter que entrar com monitoramento para conseguir o que a gente chama de virtualização do deslocamento. Aí eu consigo entender os movimentos e a profundidade. Depois a gente entra com todo o monitoramento. Isso vai levar talvez dois, três meses, para só depois propor uma solução”, salienta.
Respostas
Os moradores estão formalizando uma associação dos atingidos. O representante é o Jardel Costa. Para ele, reuniões são sempre importantes, mas poucas novidades foram apresentadas.
“A gente sabe que é uma situação bem complicada de resolver, porém alguns casos acho que a Prefeitura poderia já agilizar. Chamar os proprietários desses lotes que terão que ser desapropriados para uma primeira conversa. Seria uma ação interessante”, diz.
Ainda, Jardel destaca que será necessário buscar auxílio jurídico para entender melhor sobre a proposta de desapropriação.
“Entender se cabe ou não somente a desapropriação no valor do terreno, e qual vai ser a valorização usada. Minha mãe comprou aquele lote com muito esforço há quase 60 anos. Ele tem uma boa localização, justamente por ser perto do Centro, da escola, do comércio. Então a gente ficou preocupado com essa avaliação”, desabafa.
“As pessoas querem saber quando elas vão voltar pra casa, quando o estudo vai terminar. Estamos criando a associação por entender que é uma forma de atender às demandas da comunidade junto ao poder público”, acrescenta.