Farinha de trigo, banha, ovos, sal, açúcar, fermento, água. Ingredientes simples, mas que misturados e com um toque especial ganham sabor e fazem sucesso em Gramado. Esses são os insumos básicos utilizados para a produção nos fornos coloniais, localizados na Praça das Etnias, no Centro. As cucas, pães e os pãezinhos com linguiça caíram no gosto dos turistas – e, claro, há muitos anos, da comunidade.
Com atendimento diário das 8 horas às 18h30, o ritmo de trabalho é intenso para 12 grupos, que representam diferentes linhas no interior gramadense. Formando a Associação dos Fornos de Gramado, em torno de 200 pessoas estão envolvidas de forma direta ou indireta. Os fornos funcionam em sistema de concessão da Prefeitura de Gramado. A entidade mantém a conservação do local, mas não paga aluguel.
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O grupo existe há mais de 20 anos, mas foi formalizado em 2015. Desde lá, os novos integrantes precisam ter renda da agricultura. A presidente Leila Lazaretti, de 52 anos, está na segunda gestão consecutiva à frente da entidade.
Controle de qualidade rigoroso
Representante da Linha Tapera, conta que os associados se reúnem a cada dois meses para montar o cronograma de trabalho. Nos dias de semana, um grupo atua. Nos finais de semana ou em período de maior movimento, dois. Ela reforça que cada comunidade tem a sua própria organização financeira. Na dela, por exemplo, depois que quitar os custos da produção, o lucro é dividido entre os membros.
E são muitas as gerações envolvidas. Leila trabalha junto com a mãe, Elsa Trentin, de 78 anos, e com o filho Felipe, de 17 anos. Ela destaca que existe um padrão de produção e um controle de qualidade rigoroso. “A gente vende aquilo que a gente gostaria de comprar”, declara.
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Para a presidente, os fornos representam uma renda extra aos produtores rurais. “O nosso primeiro serviço é na lavoura, nas agroindústrias. Aqui temos um ganho a mais para que possamos viver com um pouco mais de conforto”, aponta. “Só que em função de tudo que vem acontecendo desde o ano passado com essas chuvas, o trabalho aqui está sendo essencial”, declara Leila, ao citar as perdas no campo.
Agregar valor aos produtos é importante
Outro ponto considerado importante para a presidente é agregar valor aos produtos. Vender uma cuca de uva é mais rentável do que comercializar a fruta in natura. Além disso, os ingredientes ou são adquiridos dos próprios produtores, ou de estabelecimentos e vendedores de Gramado, o que fortalece a economia local.
Trabalhando desde os 17 anos na Festa da Colônia e nos fornos fazendo massas dos pães e cucas, Leila alega que o movimento no local está crescendo e que a associação não tem muita dimensão do sucesso nas redes sociais. Influenciadores têm compartilhado a dica e está sendo cada vez mais comum longas filas de turistas em busca desses sabores coloniais. “O pãozinho é um produto bom, alimenta e é barato. Isso acho que chama muito o pessoal”, atesta.
Milhares de pãezinhos vendidos
Entre os dias 19 e 22 de julho, somente a comunidade da Linha Tapera vendeu 6,5 mil pãezinhos recheados, 652 cucas de frutas e 821 recheadas. Foram 915 pães e mais 462 mini cucas. As cucas recheadas são vendidas por R$ 20 e as de fruta, R$ 15. Os pães por R$ 10 e os que são recheados com linguiça e queijo, saem por R$ 7 a unidade. Ainda há comercialização de biscoitos, por R$ 10 o pacote, e apfelstrudel, que é R$ 28.
“Dizem que tem que ter a mão boa”
Na Linha Quilombo, a responsável pela produção das massas é a produtora Adriana Brezolla Fritsch, de 53 anos.
Sobre o segredo de uma boa massa ela diz envergonhada: “Sei lá. Dizem que tem que ter a mão boa”, ressalta. Ela também atua nos fornos há quase 20 anos, e alia esse trabalho com a produção de morango e de pães e cucas para comercialização em mercados do município. “O pessoal diz que eu tenho ciúmes da máquina, porque fico sempre aqui”, brinca.
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Para que tudo fique pronto para a primeira fornada da manhã, ela e o grupo chegam por volta das 5 horas e a jornada dura até mais ou menos às 19 horas. “Apesar do cansaço, vale a pena. Dá um dinheirinho bom”, reitera.
Adriana frisa que a receita do pãozinho com linguiça foi adaptada do pão sovado, mas que leva um pouco mais de açúcar. Existem algumas medidas básicas, mas ela costuma medir os ingredientes “no olho” mesmo. Para a produção de massa para 100 pãezinhos a receita é: 10 quilos de farinha de trigo, quatro ovos, duas espumadeiras de banha de porco, dois “punhados” de sal, três xícaras de açúcar, duas xícaras de fermento e água morna até dar o ponto para enrolar. Depois disso, a máquina fica dez minutos sovando a massa, que é recheada e vai ao forno.
Novas gerações continuam o trabalho
E as novas gerações também estão interessadas em manter a tradição. Lucas Pereira tem 18 anos e há pouco mais de dois trabalha no local. Ele fica responsável por fazer o fogo e cuidar para que os produtos tenham a cocção ideal. “É normal lá na colônia ter esses fornos. Eu já sabia mexer e tinha uma base. Estavam precisando de um forneiro e eu vim”, conta.
Lucas pondera que a temperatura ideal é medida com a mão. “A gente coloca a mão e tem os segundos para saber quando está bom para cada produto”, alega. Em cada fornada, é possível assar 33 cucas e 30 pães, que ficam por 45 minutos, e 130 pãezinhos, por meia hora.
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Morador da Linha Marcondes, Lucas cultiva 18 tipos de pimenta, principalmente a dedo-de-moça, que depois são transformadas em patê e molho de origem vegetal. Ele começou no ramo aos 13 anos e é enfático ao dizer que vai continuar no meio rural. “Não saio da colônia. Lá é bom. Não me vejo na cidade”, atesta.
Turistas aprovam os produtos
Quem aprovou os sabores foi uma família de Blumenau, Santa Catarina, formada pela Ana Silva e os filhos Ariel e Léo Simão e a neta Eloá. Eles descobriram os pãezinhos através de vídeos na Internet, quando pesquisavam sobre dicas de Gramado. “Está muito bom. O pãozinho é famoso”, destaca Ariel.
Os moradores de Porto Alegre Gerson, Patrícia e Martin Oliveira garantiram produtos para levar para casa. “Maravilhosos os produtos. A gente só encontra aqui”, afirma Patrícia. A família está acostumada a fazer viagens para a cidade, mas, desta vez, ficou mais dias devido aos descontos para gaúchos em estabelecimentos da cidade.