“Aproveita a tua filha porque você tem só mais cinco meses de vida”. Essa foi a frase que Daiana Dambros, de 40 anos, ouviu em março de 2022. A “sentença” fez com que ela perdesse o rumo. Depois de meses de investigação, ela foi diagnosticada com câncer do colo do útero. Do choque, ela juntou forças e fé para encarar o desafio de lutar contra a doença. E está vencendo.
Natural de Espumoso, no norte do Estado, Daiana e a família moram em Gramado há oito anos. Ela recorda que fazia os exames ginecológicos de rotina e que nunca tinha tido nenhum tipo de alteração. O primeiro alerta para a doença foi um sangramento durante a relação sexual que foi aumentando com o passar do tempo e que não parava.
Daiana diz que a descoberta foi difícil. “Eu passei por cinco médicos e todos diziam que tinha uma alteração e que era preciso investigar. Até que o último me disse aquela frase. Eu saí do consultório desesperada”, lembra.
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Mas a agente de viagens foi buscar ajuda para entender mais o que estava acontecendo e quais os procedimentos que poderiam ser adotados. Ao longo do tratamento, foram 29 sessões de radioterapia, seis de quimioterapia e uma transfusão de sangue. “Os médicos tinham muito medo de eu ter metástase. No meu caso, não tive que remover o útero”, diz.
Apesar desses últimos anos de dificuldade, ela conseguiu vencer a primeira etapa. A doença teve remissão.
“Agora eu continuo em observação, fazendo consultas e exames com frequência. É aquela incerteza, mas eu ganhei uma vida nova”, salienta. Daiana comenta que procurou estudar sobre o tema nesses últimos anos. “É um assunto delicado e as mulheres acabam não falando por vergonha”, acentua.
O que é a doença?
Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), a infecção persistente pelo HPV (Papilomavírus Humano) é responsável por 99% dos casos de câncer do colo do útero. A doença tem um desenvolvimento lento e tem como sintomas os quadros de sangramento vaginal intermitente ou após a relação sexual, secreção vaginal anormal e dor abdominal.
“Com aproximadamente 570 mil casos novos por ano no mundo o câncer do colo do útero é o quarto tipo de câncer mais comum entre as mulheres”, afirma o Inca. O órgão de saúde federal descreve que a infecção pelo HPV é comum e a estimativa é que 80% das mulheres sexualmente ativas vão adquiri-la ao longo da vida. “A infecção pelo HPV é um fator necessário, mas não suficiente, para o desenvolvimento do câncer”, destaca o instituto.
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“É uma vida nova que estou levando”
Daiana reforça que passou por muitos obstáculos. “Acho que a parte mais difícil foi eu me convencer que eu ia viver, que eu tinha que viver, e que não estava atrapalhando a vida a minha filha e do meu marido”, destaca em lágrimas.
Os julgamentos também estavam sempre presentes. “Como eu não perdi o cabelo, as pessoas diziam que eu ‘nem estava tão doente’, é complicado o que temos que escutar. A gente acha que tem amigos e uma família grande, mas são poucos que permanecem ao nosso lado. Isso dói muito”, frisa.
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Ao longo desses anos, Daiana conta com o auxílio da Liga Feminina de Combate ao Câncer de Gramado. Por causa do tratamento, ela e o marido não conseguiam trabalhar e tiveram ajuda com alimentação, remédios. “A gente demora a se recuperar financeiramente. Eu ia todos os dias para Porto Alegre, tem os remédios que são caros. E o mais importante foi toda a ajuda psicológica que eu recebi”, declara.
Como uma maneira de retribuir a ajuda, Daiana auxilia a entidade de forma voluntária quando pode e também tem um projeto especial. “Eu tenho alguns rascunhos e a minha intenção é escrever um livro para contar a minha história e reverter parte da renda para ajudar a Liga, que tanto ajuda todo mundo”, prospecta.
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Daiana agora procura dar mais valor ao que realmente importa. “O que mais prezo é ter um tempo de qualidade com a minha família, porque eu era muito de trabalhar, trabalhar e trabalhar. Não podemos ficar deixando as coisas para outro dia. Quem sabe se vamos conseguir?”, pondera.
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“É uma vida nova que estou levando, é um dia de cada vez. Dos cinco meses que eu tinha, estou aqui há mais de dois anos e meio. É uma renovação”, assegura.
Liga oferece amparo para pacientes
Os pacientes que estão em tratamento do câncer em Gramado contam com o apoio da Liga Feminina. A entidade atende entre 180 a 200 pessoas rotineiramente, mas tem uma lista ativa com cerca de 300.
Todo o trabalho é realizado de forma voluntária, com o intuito de ajudar esses pacientes oncológicos, independente da idade ou sexo. Fundada há 48 anos na cidade, a Liga proporciona atendimento gratuito à comunidade, através de amparo emocional e financeiro aos pacientes de baixa renda com a doença.
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A proposta da entidade é fornecer ajuda para que as pessoas possam manter o tratamento, tanto na compra medicamentos e exames, como na alimentação e transporte. Ainda, oferece amparo psicológico, também com profissional voluntário.
A Liga fica localizada na casinha rosa do complexo do Centro de Cultura Arno Michaelsen, junto ao Lago Joaquina Rita Bier. O atendimento é sempre nas terças-feiras, das 13h30 às 15h30.
Presidente da entidade, Nelsi Salvador reforça que só é possível realizar esse aporte por causa das doações, ações beneficentes de empresas, venda de produtos, brechós e eventos sociais. Ela conta que o maior gasto é com medicamentos. “No mês passado a gente não conseguiu pagar, mas no retrasado a conta nas farmácias fechou em R$ 68 mil”, atesta.
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Para quem quiser ajudar a entidade, pode ser com voluntariado, adquirindo produtos da loja ou com doações em itens de alimentação, higiene pessoal e limpeza. A entidade também recebe doações em dinheiro, via Pix. A chave é ligadegramado@gmail.com.
A Liga divulga as ações que realiza durante todo o ano no perfil no Instagram @ligafemininagramado.
Mulheres precisam conhecer o próprio corpo para se prevenir
O diagnóstico precoce do câncer é o que pode ajudar a salvar vidas. A Sociedade Brasileira de Mastologia recomenda que a mamografia anual seja realizada a partir dos 40 anos pelas mulheres. Mesmo que o Ministério da Saúde recomende o exame de dois em dois anos após os 50, a entidade aponta que estudos mostram que o rastreamento antecipado pode melhorar diversos aspectos, como passar por um tratamento menos agressivo e com maior chance de cura.
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O médico mastologista e especialista em cirurgia da mama, Eduardo Carvalho, explica que o câncer de mama tende a acometer, majoritariamente, mulheres com mais de 50 anos. Por isso, com as mamografias antes dessa idade, é possível diagnosticar uma possível doença ainda no estágio inicial.
De acordo com a Sociedade de Mastologia, uma em cada oito mulheres desenvolverá o câncer de mama ao longo da vida. Dentre as doenças oncológicas, é a principal causa da morte das mulheres no País. Assim, a mamografia é a primeira ferramenta utilizada pelos médicos para encarar essa batalha.
Eduardo, que é médico há 11 anos, diz que alguns fatores não conseguem ser modificados em relação à propensão em desenvolver o câncer de mama: a idade, a herança genética e o sexo. “Os homens também são acometidos, mas é algo baixo, em torno de 1% dos diagnósticos”, destaca o médico.
Entretanto, o especialista pondera que um estilo de vida saudável ajuda. Dessa forma, é recomendada a busca por uma alimentação sem industrializados, enlatados de um modo geral e com poucas frituras. “Sabemos da realidade que temos no Brasil, mas o ideal é uma dieta com comida mediterrânea, rica em fibras, legumes e vegetais”, analisa.
Outro ponto de observação, segundo o médico, é o controle do sobrepeso, pois a obesidade é um fator de risco, assim como o consumo de álcool e cigarros. “E aliar isso com a atividade física. Não é para ninguém ser atleta do dia para a noite, mas ir criando essa rotina”, aconselha.
Autocuidado
Para o mastologista, o toque nas mamas e axilas é importante para que as mulheres conheçam o próprio corpo e, consequentemente, percebam qualquer pequena alteração. Eduardo cita que esse autocuidado deve ser feito sempre e que não existe um dia correto ou associação com o ciclo menstrual. “Na suspeita de qualquer mudança, algo diferente, uma pequena nodulação, deve-se procurar um médico”, reforça.
O primeiro contato é com um ginecologista, que é especialista na saúde da mulher como um todo. Porém, Eduardo diz que o mastologista pode ser procurado, pois as doenças benignas da mama também devem ser tratadas por um mastologista.
“A chance de cura é mais de 90%”, diz especialista
Eduardo comenta que o câncer de mama pode ser tratado, de uma forma geral, de três maneiras. A primeira é a cirúrgica.
“Se a gente faz um diagnóstico precoce e temos uma possibilidade de cura para essa paciente, fazemos o procedimento. Pode ser a mastectomia, que é a retirada de toda a mama, mas, hoje em dia, a gente acaba deixando a mastectomia para casos muito selecionados. Temos um arsenal cirúrgico, técnicas para deixar a mama do jeito que está. A gente faz mínimas incisões para retirar os nódulos”, corrobora o médico, que também atua com a oncoplastia, que é a associação de técnicas de cirurgia plástica ao tratamento cirúrgico do câncer de mama.
Também há a possibilidade de tratamento com os chamados “remédios”, que incluem as terapias, como quimioterapia, hormonioterapia, imunoterapia e terapia-alvo. Por fim, a radioterapia. “A radioterapia é complementar ao tratamento cirúrgico, pois realiza o controle local do tumor, e os remédios o controle sistêmico do corpo todo”, relata Eduardo.
“Se a gente faz um diagnóstico precoce, a chance de cura é mais de 90%, é uma taxa alta para a descoberta em estágio inicial. Por isso que a gente incentiva tanto a mamografia. Além disso, o risco de morte por câncer de mama com o uso da mamografia regular e frequente diminui em 30%”, complementa o médico.
Conforme o mastologista, apesar de ser um tratamento difícil, as mulheres conseguem ter uma qualidade de vida muito boa, após a doença.
Eduardo atua na Santa Casa, em Porto Alegre, mas está realizando atendimentos também em Gramado, na Clinivitta. As consultas, por enquanto, são particulares, mas está iniciando processos de credenciamento junto a planos de saúde e Secretaria da Saúde da cidade.
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