Com 65 anos, Jorge Furtado é um dos maiores cineastas brasileiros. Gaúcho, fundou na década de 1980 a Casa de Cinema de Porto Alegre, referência audiovisual na produção de curtas e longas-metragens no País. Além de diversos Kikitos, é vencedor do Urso de Prata de melhor curta por Ilha das Flores no Festival de Berlim e conta com duas premiações do Grande Prêmio Cinema Brasil de melhor roteiro original e uma de direção.
Agora, será homenageado em seu próprio Estado. Ele receberá nesta sexta-feira (16), a partir das 18 horas, no Palácio dos Festivais, em Gramado, o Troféu Eduardo Abelin. A honraria do Festival de Cinema é dedicada aos diretores e entidades de cinema, pelo trabalho realizado e que beneficia o segmento.
Além de ter esse reconhecimento, outros dois momentos especiais ocorrem nesta noite: Jorge entrará para a Calçada da Fama e terá a première mundial de seu novo filme Virgínia e Adelaide, em sessão especial, exibido no telão no cinema.
Orgulho de ser gaúcho
Jorge conversou com a imprensa durante a tarde, no Buona Vitta Resort. Ele contou que a ideia de abrir a Casa de Cinema de Porto Alegre surgiu a partir de uma necessidade dos realizadores, que, na época, precisavam se deslocar para São Paulo ou Rio de Janeiro, para finalizarem suas obras.
Furtado sempre valorizou o Rio Grande do Sul e, por isso, mesmo diante de tantos sucessos no cinema e na televisão, mantem-se morando na capital. “O que mudou de quando mais novo para cá são apenas 500 metros de distância”, brinca.
Ele, que é diretor e escreve roteiros, inclusive, para a TV Globo, revela que filmar fora é diferente de estar no seu próprio ambiente. “Fora me sinto muito turista. No Rio de Janeiro, olhar para o morro, ou ver como aquela praia é linda, sendo que para eles é tão normal”, reitera.
O cineasta, inclusive, recebeu convite de um produtor internacional. “Ele me ligou e disse ‘sei que tu é um cara muito ocupado, eu sou também, então vou ser direto e objetivo, quer gravar aqui nos Estados Unidos?’, eu só disse ‘não'”, revela.
Apesar disso, também explica que em certos momentos, acha-se um “gaúcho meio falso”. “No campo campo nunca filmei, nunca nem subi num cavalo.”
“Sou um contador de histórias”
Jorge Furtado também trouxe uma curiosidade: “se eu desenhasse tão bem como o Laerte, faria quadrinhos”. Apesar da fala, afirma que as duas profissões têm missões distintas: contação de histórias.
“Sou um contador de histórias, gosto de contar. A história emociona, a história educa, ensina sobre nós mesmos. A gente se transforma, e isso, em qualquer formato”, afirma.
Entre os desafios para contar as histórias – e tantas – está o medo da repetição. “Maior risco é imitar a si mesmo, por isso tento fazer coisas diferentes. Às vezes, o estilo trai, o texto também”, coloca.
Com a gravação de Virginia e Adelaide, uma coprodução com a Globo Filmes e que tem direção, ainda de Yasmin Thayná, ele revela que a nova parceria o mantém jovem. “Eu brincava que na minha lápide ia estar que filme de sonho não era filme e que nunca ia usar zoom. Fiz agora um filme de sonho e usei zoom”, comenta.
“Agora, vai ter que estar nunca botei alguém falando sozinho ou nunca alguém ouvindo atrás da porta”, atualiza.
Cinema: a realização e o futuro
Furtado iniciou na televisão pelo canal TVE, em 1982. Para ele, o pensamento das duas linguagens audiovisuais – tv e cinema – é o mesmo. O que muda, contudo, é como ver. “É uma leitura em sanduíche, com várias camadas. No cinema, tem o som, um detalhe, que podem ser mais observados do que na televisão. Mas essa produção, no fim, vai ir para ela”, explica.
Jorge considera que o cinema vive um momento complicado, mas também de transição. “Estamos num momento difícil, mas a experiência do cinema é diferenciado, tu ir ver um filme numa sala. Só que hoje estamos num mundo com Tik Tok, Instagram, com coisas rápidas, que não são arte, entretenimento, é distração. É o gato caindo da escada, uma criança chupando um limão. Talvez seja preciso repensar o cinema”, argumenta.
Apesar de grandes blockbuster ainda lotarem as salas no Brasil, ele conta que gosta de filmes humanizados. “Eu não vi nenhum Homem Aranha, super-heróis não me convencem”, frisa.
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“Cinema é a arte do encontro, não dá para fazer sozinho. Nasce de encontros de pessoas, para fazer e ver o filme. A gente se encontra e espero que isso não se perca”, emociona-se Jorge, com a voz embargada.
Para ele, o futuro será de movimentação. “Mais de 500 longas-metragens brasileiros, se confirmar a verba, são lançados nos próximos dois anos. É preciso diálogo com o público, ver interesse, que tipo de ensinamentos. Claro que nesses 500, vão ter filmes ruins. Mas também vão ter os muito bons. Quantidade também traz qualidade”, reitera.
Em 25 de dezembro, com a estreia de Auto da Compadecida 2, onde trabalhou como roteirista, espera uma grande presença de espectadores. “Está emocionante, engraçado. Tenho certeza que vamos festejar bastante e que temos um público enorme”, afirma.