FRAUDE FINANCEIRA

Herdeiros da Unick: Piramideiros lançam novos golpes pelas redes sociais

"Tem que entrar agora pra beber água limpa", convida influenciador digital que se diz vítima da empresa de Novo Hamburgo fechada em 2019

Publicado em: 20/07/2023 18:53
Última atualização: 27/09/2024 16:04

Dezenas de clientes que se dizem lesados pela Unick Sociedade de Investimentos — pirâmide financeira de Novo Hamburgo que movimentou R$ 28 bilhões entre 2017 e 2019 — estão aplicando o mesmo golpe pelo País. Divulgam, nas redes sociais, “novas empresas” que prometem ganhos irreais, muito acima dos praticados pelo mercado de capitais. Um membro avisa descaradamente: “Lembrando que é pirâmide. Tem que entrar agora pra beber água limpa. Quanto mais passa o tempo, mais perigo de perder”.

Fechada pela Polícia Federal em outubro de 2019, Unick movimentou R$ 28 bilhões Foto: Polícia Federal

Com a ruína da Unick, há quase quatro anos, operadores com título de “líder” e milhares de investidores de todo o País se juntaram em grupos no WhatsApp e Telegram. Entre lamentações pelas perdas e manifestações de saudosismo à Unick, as comunidades virtuais se tornaram escritórios insanos de novas pirâmides. “Eu perdi dinheiro lá, mas a Unick foi uma escola. Graças a ela eu aprendi a viver o mercado financeiro e fazer o dinheiro trabalhar para mim”, comenta um morador de Estância Velha.

“100% de lucro”

Um “piramideiro” de carreira, que se apresenta como uma espécie de influenciador digital, vem divulgando um “novo projeto”, lançado no último dia 4. Garante 100% de lucro em 15 dias corridos. O negócio também oferece um plano de carreira com base na quantidade de indicações e atração de investidores. Um link é publicado para acesso ao esquema, que vem recebendo cada vez mais adeptos.

Em outro grupo, uma mulher pergunta: “Gente, qual a melhor empresa do momento? Tão pagando direto?” E recebe várias sugestões com links de falcatruas para se cadastrar. “Ainda essa semana eu e minha esposa estaremos fazendo parte em nome de Jesus”, comenta um homem sobre outra pirâmide. Uma entusiasmada seguidora emenda: “Estou muito confiante nessa empresa, que o nosso Deus possa abençoar esse diretor”.

Crime compartilhado pirâmide

Não há indícios de envolvimento dos réus

Apesar de reunir remanescentes da “família Unick”, as recentes pirâmides não têm indícios de participação de diretores e gestores da empresa de Novo Hamburgo fechada em outubro de 2019 pela Operação Lamanai da Polícia Federal. O processo criminal, que corre na 7ª Vara Federal de Porto Alegre, tem 15 réus. Dez chegaram a ser presos na época.

“Dá pra ganhar ‘uns pila’ até ela quebrá

Empresa que vinha sendo divulgada em larga escala nas redes sociais, a Bonetto Investimentos entrou em colapso no mês passado. Em propagandas que envolviam transmissões ao vivo, ela se vendia como empreendimento sediado em São Paulo, mas o CNPJ é de Porto Alegre.

O site ReclameAqui contabilizava, até esta quinta-feira (20), 891 denúncias contra o negócio. Nenhuma foi respondida. “Coloquei dinheiro e o aplicativo da Boneto não abre quero meu dinheiro de volta tenho filhos pra criar e fiz esse investimento pensando neles”, postou um morador de Boa Nova, na Bahia, na semana passada.

Um morador do oeste de Santa Catarina, órfão da Unick e ativo divulgador de pirâmides nas redes sociais, mostrava-se empolgado com a Bonetto em textos e áudios. “Piramidinha nervosa”, conforme definia até o mês passado. A reportagem entrou em contato com a empresa, mas ninguém respondeu.

Propaganda em áudios

“Agora é o começo, é que nem a Unick. Tem que sentá a lenha agora, dobra todo mês. Vai até o 12º nível. É muito show. Tem que pinha os pila ali, e retirá o seu, reinveste e vai trabalhando com o dinheiro. Dá pra ganhá um pouco, só que não dá pra loqueá. Dá pra ganhar uns pila até ela quebrá.”

“Ô, galera, beleza? Tá bagual o negócio, empresa dois mês só… vou mandar um vídeo da Bonetto. Você pode entrá, se casdastrá e cadastrá outras pessoas. Pra fazê o saque não precisa ativá o pacote. Por isso que o negócio tá bombando. Não vôi falá ‘venda a casa e bota ali’, mas acho que é oportunidade pra gente ganhá uns pila. Desde a Unick tô esperando uma empresa pra estourá pra gente ganhar uns pila e acho que agora chegô a vez. Tô sentando a lenha aqui. Tá chovendo cadastro.”

Fique atento

Os piramideiros lançam negócios de aparência lícita, geralmente fachadas na área de investimentos, para atrair vítimas. Prometem rendimentos fantasiosos e comissões a quem conquistar clientes. A entrada de novos membros é o que sustenta o esquema, pois vão remunerando quem está no topo da pirâmide.

No início há distribuição de ganhos, mas fatalmente a estrutura chegará ao ponto em que não haverá adesões suficientes para pagar quem está acima e o negócio começa a ruir. É uma fraude financeira em que os golpistas ganham fortunas e a grande maioria dos clientes perde.

Assim como a Unick, as pirâmides sucessoras não têm registro na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia do governo federal que regula o mercado de capitais. Além de irregulares, incorrem em crimes contra o sistema financeiro nacional, estelionato, associação criminosa e lavagem de dinheiro.

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