Dezenas de clientes que se dizem lesados pela Unick Sociedade de Investimentos — pirâmide financeira de Novo Hamburgo que movimentou R$ 28 bilhões entre 2017 e 2019 — estão aplicando o mesmo golpe pelo País. Divulgam, nas redes sociais, “novas empresas” que prometem ganhos irreais, muito acima dos praticados pelo mercado de capitais. Um membro avisa descaradamente: “Lembrando que é pirâmide. Tem que entrar agora pra beber água limpa. Quanto mais passa o tempo, mais perigo de perder”.
Com a ruína da Unick, há quase quatro anos, operadores com título de “líder” e milhares de investidores de todo o País se juntaram em grupos no WhatsApp e Telegram. Entre lamentações pelas perdas e manifestações de saudosismo à Unick, as comunidades virtuais se tornaram escritórios insanos de novas pirâmides. “Eu perdi dinheiro lá, mas a Unick foi uma escola. Graças a ela eu aprendi a viver o mercado financeiro e fazer o dinheiro trabalhar para mim”, comenta um morador de Estância Velha.
“100% de lucro”
Um “piramideiro” de carreira, que se apresenta como uma espécie de influenciador digital, vem divulgando um “novo projeto”, lançado no último dia 4. Garante 100% de lucro em 15 dias corridos. O negócio também oferece um plano de carreira com base na quantidade de indicações e atração de investidores. Um link é publicado para acesso ao esquema, que vem recebendo cada vez mais adeptos.
Em outro grupo, uma mulher pergunta: “Gente, qual a melhor empresa do momento? Tão pagando direto?” E recebe várias sugestões com links de falcatruas para se cadastrar. “Ainda essa semana eu e minha esposa estaremos fazendo parte em nome de Jesus”, comenta um homem sobre outra pirâmide. Uma entusiasmada seguidora emenda: “Estou muito confiante nessa empresa, que o nosso Deus possa abençoar esse diretor”.
Não há indícios de envolvimento dos réus
Apesar de reunir remanescentes da “família Unick”, as recentes pirâmides não têm indícios de participação de diretores e gestores da empresa de Novo Hamburgo fechada em outubro de 2019 pela Operação Lamanai da Polícia Federal. O processo criminal, que corre na 7ª Vara Federal de Porto Alegre, tem 15 réus. Dez chegaram a ser presos na época.
“Dá pra ganhar ‘uns pila’ até ela quebrá”
Empresa que vinha sendo divulgada em larga escala nas redes sociais, a Bonetto Investimentos entrou em colapso no mês passado. Em propagandas que envolviam transmissões ao vivo, ela se vendia como empreendimento sediado em São Paulo, mas o CNPJ é de Porto Alegre.
O site ReclameAqui contabilizava, até esta quinta-feira (20), 891 denúncias contra o negócio. Nenhuma foi respondida. “Coloquei dinheiro e o aplicativo da Boneto não abre quero meu dinheiro de volta tenho filhos pra criar e fiz esse investimento pensando neles”, postou um morador de Boa Nova, na Bahia, na semana passada.
Um morador do oeste de Santa Catarina, órfão da Unick e ativo divulgador de pirâmides nas redes sociais, mostrava-se empolgado com a Bonetto em textos e áudios. “Piramidinha nervosa”, conforme definia até o mês passado. A reportagem entrou em contato com a empresa, mas ninguém respondeu.
Propaganda em áudios
“Agora é o começo, é que nem a Unick. Tem que sentá a lenha agora, dobra todo mês. Vai até o 12º nível. É muito show. Tem que pinha os pila ali, e retirá o seu, reinveste e vai trabalhando com o dinheiro. Dá pra ganhá um pouco, só que não dá pra loqueá. Dá pra ganhar uns pila até ela quebrá.”
“Ô, galera, beleza? Tá bagual o negócio, empresa dois mês só… vou mandar um vídeo da Bonetto. Você pode entrá, se casdastrá e cadastrá outras pessoas. Pra fazê o saque não precisa ativá o pacote. Por isso que o negócio tá bombando. Não vôi falá ‘venda a casa e bota ali’, mas acho que é oportunidade pra gente ganhá uns pila. Desde a Unick tô esperando uma empresa pra estourá pra gente ganhar uns pila e acho que agora chegô a vez. Tô sentando a lenha aqui. Tá chovendo cadastro.”
Fique atento
Os piramideiros lançam negócios de aparência lícita, geralmente fachadas na área de investimentos, para atrair vítimas. Prometem rendimentos fantasiosos e comissões a quem conquistar clientes. A entrada de novos membros é o que sustenta o esquema, pois vão remunerando quem está no topo da pirâmide.
No início há distribuição de ganhos, mas fatalmente a estrutura chegará ao ponto em que não haverá adesões suficientes para pagar quem está acima e o negócio começa a ruir. É uma fraude financeira em que os golpistas ganham fortunas e a grande maioria dos clientes perde.
Assim como a Unick, as pirâmides sucessoras não têm registro na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia do governo federal que regula o mercado de capitais. Além de irregulares, incorrem em crimes contra o sistema financeiro nacional, estelionato, associação criminosa e lavagem de dinheiro.
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