DEZ ANOS DEPOIS
Familares de vítimas da Kiss cobram responsabilização dos culpados pela tragédia
Passada uma década, quatro pessoas foram apontadas como responsáveis pelo incêndio na boate, em Santa Maria; mesmo assim, ainda não há condenação definitiva
Última atualização: 22/01/2024 09:17
Nesta sexta-feira, 27 de janeiro de 2023, a tragédia da Boate Kiss, em Santa Maria, completa dez anos. Desde a noite do incêndio, familiares e amigos buscam manter viva a memória dos entes queridos vitimados por aquela que foi a maior tragédia do Estado e uma das maiores do País, com 242 vidas perdidas.
Além de homenagens e vigílias, a última década foi marcada por protestos em prol de justiça – a demora na responsabilização dos culpados é um dos principais motivos de revolta dos pais. Em dezembro de 2021, quatro réus chegaram a ser condenados, gerando alívio momentâneo às famílias enlutadas. Meses depois, porém, o júri foi anulado, e a angústia, devolvida à comunidade, que clama por respostas.
Noite na memória
Moradora de Santa Maria, Ligiane Righi da Silva ainda lembra do dia em que a filha Andrielle Righi da Silva saiu para comemorar o aniversário de 22 anos, completados poucos dias antes, na Boate Kiss. "A última lembrança é ela saindo de casa dando gargalhada, junto com as amigas", recorda. Para ela, a semana que antecede o aniversário da tragédia tem um diferencial, já que é também a semana na qual a filha, nascida em 24 de janeiro, completaria mais um ano de vida.
Durante os últimos anos, Ligiane e a família sempre estiveram junto aos movimentos que buscam preservar a memória dos que partiram e também acompanhando as idas e vindas do processo judicial. Seu marido, Flávio Silva, inclusive esteve à frente da Associação dos Familiares de Vitimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM).
Junto com a saudade, o sentimento que fica, dez anos depois da tragédia, é de indignação pela falta de responsabilização legal pelo incêndio. "As pessoas acham que a gente quer se vingar. Se quiséssemos vingança, teríamos feito na época. Queremos justiça, não vingança."
O que levou à anulação do julgamento
Os sócios da boate, Elissandro Spohr e Mauro Hoffmann, o vocalista da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo de Jesus dos Santos, e o auxiliar Luciano Bonilha Leão foram condenados pelo Tribunal do Júri a penas de 18 a 22 anos e seis meses de prisão. Sob o argumento de descumprimento de regras na formação do Conselho de Sentença, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ/RS) anulou a sentença e revogou a prisão dos réus em agosto de 2022.
A decisão de anulação do julgamento foi tomada com base em ações conduzidas pelo juiz Orlando Faccini Neto, que presidiu o júri. "O que foi decisivo para a anulação foi o fato de o juiz ter sorteado 25 pessoas para o júri, quando o correto seriam 21, e ter realizado uma reunião com os jurados sem a presença das partes", explica o ex-promotor de Justiça Cláudio Brito, jornalista do Grupo Sinos.
As defesas dos réus apresentaram 19 pedidos de anulação do júri, todas rejeitadas pelo relator da relator do julgamento na 1ª Câmara Criminal do TJ/RS, o desembargador Manuel José Martinez Lucas. Entretanto, os outros dois desembargadores, José Conrado Kurtz de Souza e Jayme Weingartner Neto, acolheram parte do pedido.