Nesta quarta-feira (4) é celebrado o Dia Mundial do Braille. Comemorada desde 2018, a data homenageia o aniversário do inventor do sistema de escrita tátil utilizado por pessoas cegas ou com baixa visão, Louis Braille.
O canoense Leonardo dos Santos Oliveira, 30, ficou cego dos dois olhos aos 11 anos de idade devido ao glaucoma congênito, uma condição rara que afeta a visão. Conhecido por Léo, o jogador profissional de futebol de cinco (para cegos) atua na posição de ala ofensiva no time da Associação Gaúcha de Futsal para Cegos.
“Fui alfabetizado em braille um ano depois de perder totalmente a visão, eu tinha 12 anos na época. Me formei no ensino médio por meio do braille. Estudei em escola regular, tinha uma sala de recursos em que eu fazia as provas e testes”, conta Léo.
O jogador relembra o período em que foi telefonista. “Sem o braille eu seria analfabeto na condição em que me encontro. Como perdi a visão depois de ter sido alfabetizado, primeiro eu aprendi a escrita normal. Para um cego isso não faz mais sentido, para ler e escrever precisamos do braille”, reflete.
Léo conta que fez o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) todo em braille. Embora tivesse direito de um auxiliar para leitura, ele optou por fazer as provas no formato tradicional para cegos. “Se eu não tivesse me alfabetizado em braille, não conseguiria fazer várias coisas sozinho. Desde pegar um elevador a fazer um teste”, destaca.
O jogador crítica a falta de braille em lugares comuns da sociedade. Ele explica que ainda existem espaços em que não há serviços e produtos com braille. “Na verdade, a maioria não tem. É raro termos embalagens com escrita para cegos, muitos restaurantes também não têm cardápio adaptado”, expõe Léo.
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Ferramentas de ensino
Em sua alfabetização em braille, Léo aprendeu as 64 combinações entre letras e números. “A punção e a reglete eram os materiais que utilizava”, relembra.
A reglete é uma prancha com uma régua que contém as células do alfabeto para qualquer letra. Ela é usada em conjunto com a punção que faz a marcação de pontos em relevo.
O camisa sete explica que uma página de um livro comum é equivalente de três a quatro páginas em braille. “Um livro de 50 páginas se torna um de 200. As pessoas com mais idade, por terem mais dificuldade com a tecnologia, ainda preferem os registros escritos. Mas a meu ver, isso tem mudado com o passar dos anos.”
Tecnologia aliada para fomentar o bem-estar
A tecnologia tem sido uma forte aliada para quem nasceu e/ou perdeu a visão. Programas de computador e aplicativos para celular estão cada vez mais populares entre as pessoas cegas.
“Sou um exemplo, há 10 anos que quase não leio um livro em braille. Embora tenha feito provas escritas nos últimos anos, no dia a dia pouco faço uso. A acessibilidade que o celular proporciona é muito vantajosa”, aponta Léo.
O programa para notebooks e computadores NVDA é um dos mais populares entre os gratuitos, explica o jogador. Já o TalkBack é o mais usado em aparelhos com o sistema Android e a Siri no modelo IOS. “Por virem de forma nativa, eles levam vantagem. Hoje me locomovo tranquilamente pela cidade, respondo as mensagens, utilizo diversos aplicativos e funções do smartphone como qualquer outra pessoa, porém de forma diferente”, ressalta.
Léo fala que quando mais novo era comum o uso de máquinas em braille, o equivalente à máquina de escrever. “Por serem muito grandes e pesadas, caíram em desuso, é raro encontrá-las.”
Inclusão na sociedade e nas cidades do Estado
Léo faz um alerta para a falta de inclusão e acessibilidade em setores da sociedade. “Não é exclusivo de Canoas, as cidades de modo geral não foram pensadas para quem é cego. As dificuldades estão aí para todos verem, isso soa irônico até. Mas é preciso que a sociedade não nos considere como pessoas incapazes, e sim como parte dela”, desabafa.
O canoense esclarece que itens comuns como uma caixa de remédio possuem escrita em braille, mas com ressalvas. “Geralmente é o nome, a marca, a quantidade, mas outras informações necessárias, por exemplo, a composição, para que serve, não se tem. E o que existe só tem porque é obrigatório. Se o que lei já é difícil de respeitar, imagina o que não é.” O jogador diz que apesar das adversidades é importante incentivar quem ficou cego a aprender braille. “É fundamental para a nossa independência”, conclui.
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