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MEMÓRIA DOS DIQUES

Conheça o responsável por guardar os estudos que deram origem ao sistema de proteção de cheias da região

Antônio Geske carrega experiência de ter participado de parte dos levantamentos feitos por banco de fomento alemão, o que faz com que geólogo aponte caminhos para melhoria do sistema

Eduardo Amaral
Publicado em: 18/07/2024 às 18h:10 Última atualização: 18/07/2024 às 18h:11
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Construído em 1900 na antiga região do Cais do Porto de São Leopoldo, o Casarão que hoje serve como sede da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Semmam) guarda as memórias dos projetos do sistema de proteção contra cheias na região. São incontáveis documentos que vão de ofícios, estudos e apontamentos feitos por brasileiros e grupos de alemães que durante cerca 30 anos estruturaram e viram ser construído o sistema de diques e casas de bombas pensado após a enchente de 1941.

Antônio Geske defende a criação de um órgão semelhante ao antigo DNOS para gerir o sistema de proteção | abc+



Antônio Geske defende a criação de um órgão semelhante ao antigo DNOS para gerir o sistema de proteção

Foto: Eduardo Amaral/GES-Especial

Todo este material, que chegou a se ver abandonado e esquecido por um período, está sob a tutela do geólogo Antônio Geske, ex-funcionário do extinto Departamento Nacional de Obras de Saneamento (DNOS), que hoje cumpre a função de guardião da memória do projeto que por décadas garantiu a proteção de São Leopoldo contra enchentes.

“Hoje estou aqui para ficar aqui com memória viva da coisa”, resume, ao falar do papel que vem cumprindo nos últimos anos. Oficialmente, o cargo de Geske é o de diretor municipal de Controle de Cheias de São Leopoldo.

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O geólogo começou a trabalhar com o tema da prevenção de enchentes no final da década de 1980, se integrando então ao trabalho que vinha sendo desenvolvido desde a década de 1950. Depois da extinção do órgão federal, que era o responsável por coordenar os estudos e a construção do sistema de proteção da região metropolitana. O geólogo testemunhou de dentro o processo que levou à extinção do DNOS e abandono do projeto original.

Foram cinco anos de projeto abandonado logo após a extinção do DNOS durante o governo Fernando Collor de Mello. “Houve uma luta para que todo o acervo técnico do projeto não fosse perdido e a gente ficou guardião. Conseguimos retomar o projeto no advento do governo Fernando Henrique Cardoso através de convênios com a prefeitura”, relembra Geske, que se tornou, tempos depois, o responsável pela guarda de toda a documentação elaborada ao longo de mais de três décadas.

Memória preservada, projeto retomado

“Me sinto um privilegiado por ter a guarda de tudo isso”, afirma o geólogo, que passa os dias envolto entre livros e estudos antigos. Lá estão cálculos, apontamentos, desenhos em papel manteiga, além de mapas de ocupação e inundações da cidade. O trabalho de guarda desse material foi fundamental para auxiliar a população de São Leopoldo a se reorganizar ainda nos anos 1980 para conseguir a finalização das obras dos 20 quilômetros de dique na cidade e mais 2,4 mil metros em Novo Hamburgo.

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Do início dos estudos sobre como proteger a região entre Porto Alegre e Novo Hamburgo até o início das obras foram quase 10 anos para que a região começasse a ver as obras que deram origem ao famoso Muro da Mauá, em Porto Alegre, e ao sistema de diques utilizado em São Leopoldo e Novo Hamburgo. E a demora se repetiu para a conclusão, parcial, do projeto, que até hoje não foi plenamente finalizado, pois o mesmo previa a chegada dos sistemas de proteção até parte de Campo Bom – o que nunca aconteceu.

Mesmo assim, Geske garante que o sistema funcionou dentro do projetado, ao menos até as enchentes de maio mostrarem que a sociedade e os governos precisarem encarar as consequências de políticas ambientais e habitacionais pouco preocupadas com a preservação. “Os estudos foram válidos e as obras foram executadas de acordo com as necessidades definidas nos projetos.”

Paralisia e retomada

Com a extinção do DNOS o projeto de construção ficou parado por cinco anos, e só foi retomado após a pressão realizada pela comunidade. Geske lembra e inúmeras romarias e encontros das populações mais afetadas para que as obras do dique fossem retomadas, o que aconteceu ainda durante o primeiro governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), entre 1995 e 1999.

Só que sem um órgão federal responsável pela coordenação e realização das obras, se optou por um modelo de convênios com as prefeituras. Foi assim que o sistema de proteção que começou a ser estudado ainda na década de 1950, chegou finalmente até Novo Hamburgo, sendo constituído pelo dique e a Casa de Bombas do Santo Afonso. Mas essa demora também evitou que todo modelo pensado décadas atrás não fosse concluído.

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“Não foi executado, nem foram estudados, a nível de projeto executivo, a sequência do rio acima, a área de Campo Bom, onde o rio tem uma mudança na sua dinâmica de correntes”, destaca Geske. Com a experiência de quem acompanhou o processo e vive como o guardião da memória, Geske considera fundamental que se tenha um novo órgão capaz de pensar a proteção de todas as cidades da região.

Para o geólogo seria importante ter um órgão desvinculado de decisões político/partidárias para gerir o sistema de proteção a cheias. “É o sistema que temos e precisamos cuidar bem dele”, resume Geske, que também reconhece a necessidade de melhorias, como aumento dos diques em alguns pontos, como no caso de São Leopoldo, e também criação de áreas de alagamento ao longo do percurso.

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