INVESTIGAÇÃO ENCERRADA
CLÍNICA CLANDESTINA: Polícia pede prisão de três pessoas no caso de idosos mantidos em condições desumanas; saiba os detalhes
Dois homens e uma mulher são indiciados por associação criminosa, tortura, cárcere privado e retenção de documentos
Última atualização: 14/11/2023 11:57
Um mês e dez dias após a descoberta de clínica clandestina de idosos no interior do município de Taquara, onde dez pessoas foram resgatadas desnutridas, com fome e convivendo com porcos, galinhas e cães no mesmo ambiente, a Polícia Civil concluiu o inquérito.
De acordo com o delegado Valeriano Garcia Neto, responsável pela investigação, o caso será remetido à Justiça ainda nesta semana com o indiciamento de três pessoas, todas moradores de Porto Alegre.
Os dois principais alvos da Polícia desde o início da investigação serão indiciados por associação criminosa, tortura, cárcere privado e retenção de documentos. A esposa de um deles também figura na lista final de indiciados. O delegado explica que a investigação identificou importante participação dela na administração dos negócios da família, por isso, também responderá pelos mesmos delitos.
A decisão de encerrar o inquérito foi tomada na segunda-feira (13) após os investigados ficarem em silêncio durante interrogatório na Delegacia de Polícia de Taquara. “Foi a primeira vez que foram chamados e tiveram a oportunidade de esclarecer tudo, mas preferiram ficar quietos”, afirma Neto.
Polícia pedirá pela terceira vez a prisão dos investigados
Ao encaminhar o caso à Justiça, o delegado avisou que pedirá, novamente, a prisão preventiva dos suspeitos. As provas obtidas pela Polícia ao longo da apuração do caso, como a confirmação de que os responsáveis pela clínica ficavam com todos os benefícios financeiros dos idosos, é que embasam o pedido. “Há comprovação documental da saída de recursos da conta bancária dos idosos e da transferência destes valores para a conta de um dos indiciados”, revela.
Esse é o terceiro pedido de prisão que a Polícia Civil fará contra os alvos da investigação. O segundo pedido, que teve parecer favorável do Ministério Público, foi negado na última semana, dia 9, pelo juiz Rafael Silveira Peixoto, da Comarca de Taquara.
A representação pela prisão preventiva dos suspeitos havia sido feita dia 20 de outubro. Na decisão, o magistrado disse que as novas provas trazidas pela Polícia não são suficientes para justificar a prisão dos investigados.
O juiz também fez uma profunda análise do caso e apontou lacunas na investigação, embora concorde que os fatos apurados são graves e reprováveis. “Embora consideráveis os argumentos apontados pela autoridade policial e acolhidos pelo Ministério Público, entendo que muitos pontos da investigação ainda precisam ser aprofundados”, escreveu. “Primeiro, tenho que a investigação ainda não definiu de forma clara e individualizada quais delitos foram, em tese, praticados por cada um dos suspeitos”, assinalou o magistrado.
O primeiro pedido de prisão dos suspeitos ocorreu no dia seguinte à localização da clínica, mas também foi indeferido pelo juiz Rafael Silveira Peixoto.
Clínica clandestina estava sem água e com pouca comida quando foi descoberta
Na tarde do dia 2 de outubro, uma ação da Polícia Civil resultou na localização de uma clínica clandestina no Distrito de Santa Cruz da Concórdia, que fica na zona rural e a 15 km de distância do Centro de Taquara. Ao chegar no local, após denúncia anônima, os policiais se depararam com um cenário de horror, com idosos em condições desumanas, desnutridos, convivendo com porcos, galinhas e cães no mesmo ambiente.
Os alimentos eram escassos e a casa estava há dois dias sem água potável. “Os pacientes estavam sedentos e relataram que passavam fome”, explicou, na época, o delegado Valeriano Garcia Neto. Os indícios de maus-tratos contra os idosos não pararam por aí. O forte odor de urina e fezes, as condições precárias do lar e até pacientes deitados ao lado de poças de vômito fazem parte deste contexto.
Na casa, foram encontradas 10 pessoas, sendo oito idosos, um adulto incapaz (acamado) e uma funcionária que vivia em situação análoga a escravidão. Em depoimento, a mulher de 42 anos revelou que era estuprada pelo patrão e pelo enteado dele duas vezes por semana há, pelo menos, dois anos. "Ele [patrão] chegava de madrugada na casa, me pegava à força e me abusava. Normalmente ele estava bêbado. O enteado também me estuprava, mas nunca estava bêbado", contou.
O sumiço de idosos também chegou ao conhecimento da Polícia, que realizou uma operação para escavar o pátio onde funcionava a clínica no intuito de verificar se não haviam corpos enterrados no local. Até um cão farejador do Corpo de Bombeiros participou das buscas.