FIM DAS CARROÇAS

Carroceiros de Campo Bom começam a receber auxílio

Benefício de meio salário mínimo será pago por pelo menos seis meses para quem procurar o CRAS da cidade

Publicado em: 21/12/2023 08:00

Os primeiros carroceiros beneficiados com o auxílio para mudar de profissão em Campo Bom receberam nesta terça-feira (19) os cartões com os quais poderão movimentar o valor de meio salário mínimo. A medida foi a forma encontrada para incentivar a mudança de atividade profissional já que a circulação de veículos movidos por tração animal está proibida na cidade. A entrega foi realizada na prefeitura da cidade no final da tarde.


Primeiros cartões com benefício foram entregues a três carroceiros da cidade Foto: Eduardo Amaral/GES-Especial

Neste primeiro momento os beneficiados são Cleber Ezequiel Canabarro, 38 anos, Gilberto Vargas Ferreira, 68, e José Elói da Silva, 78. Há décadas o trio trabalha recolhendo material reciclável com as carroças puxadas por cavalos. Mesmo mais velho, Ferreira não pretende deixar de trabalhar com materiais recicláveis, mas agora sem o uso de animais.

“Vou ficar com a carrocinha, é mais difícil porque com a carroça pequena a gente não faz muita coisa”, afirma ainda se lamentando. Morador do bairro 25 de Julho, Ferreira diz ter trabalhado durante toda a sua vida com a reciclagem de materiais.

Durante a reunião onde foi oficializada a entrega dos cartões com o benefício, Elói da Silva chegou a chorar quando falou sobre a possibilidade de ter de se desfazer de seu cavalo. “Meu cavalinho, eu vou falar a verdade, nem por R$ 10 mil eu não vendo”, afirmou ele mais de uma vez, sendo tranquilizado na sequência ao saber que não precisaria se desfazer do animal.

Ao contrário dos colegas, Elói da Silva se dedicou a transportar lenha durante os anos na atividade como carroceiro. Mas, assim como Ferreira, ele também pretende seguir no mesmo trabalho. “Vou comprar uma motinha pra mim dessa bateria e um ‘carroçãozinho’ pra fazer alguma coisinha que puder fazer”, projeta.

Mudar de profissão

Ficar com o cavalo que o acompanhou no trabalho também é o objetivo de Cleber Ezequiel Canabarro, genro de Ferreira. “O cavalo eu vou aposentar, nem estou botando ele mais na carroça. Vou ficar cuidando dele. Ele nasceu e se criou lá em casa, não tem como deixar ele.”

Contudo, ele já demonstra vontade de mudar de ofício para garantir o sustento dos seis filhos. Durante a reunião, Canabarro manifestou o desejo de trabalhar com roçadas na cidade. “Vou tentar uma roçadeira, qualquer outra coisa aí pra me fazer uma limpeza de pátio, jardinagem, alguma coisa eu tenho que fazer, porque eu tenho seis filhos pra sustentar

Mesmo com a mudança, Canabarro se mostra favorável a nova lei que vai impedir o uso de cavalos no transporte de cargas. “Não condeno eles aqui de fazer a lei aqui, porque muita gente faz o mal pros bichos mesmo.

Como funciona o benefício

Para conceder o benefício, que tem duração inicial de seis meses, o governo municipal fechou um acordo com o Banrisul. O banco forneceu o cartão magnético com o qual os beneficiados podem realizar compras no comércio local, não há possibilidade de saque do dinheiro.


José Elói da Silva chora ao pensar que teria que abandonar seu cavalo Foto: Eduardo Amaral/GES-Especial

Cada beneficiário receberá meio salário mínimo por seis meses, podendo ser renovado por mais seis caso não tenham conseguido encontrar uma nova fonte de renda e sigam vivendo na cidade. “Vou lá mostrar pra eles o cartão e dizer pra eles (carroceiros) que pode se cadastrar, que o troço é real”, conta Canabarro ao falar sobre a desconfiança dos colegas de profissão para se cadastrar e receber o benefício.

O cadastro para receber o benefício deve ser feito no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) de Campo Bom. No local ele serão orientados sobre documentos e comprovações que precisam apresentar para poder ter acesso. Os animais serão microchipados e, apenas em caso de maus tratos, serão retirados de seus tutores.

Mudança social

No final de 2022 a Câmara de Vereadores da cidade votou aprovou o projeto de lei que proíbe a circulação de carroças na área urbana da cidade. O texto é de autoria da vereadora Kayanne Braga (PTB), que reconhece as dificuldades que alguns dos carroceiros terão na troca de atividade.


Primeiros cartões com benefício foram entregues a três carroceiros da cidade Foto: Eduardo Amaral/GES-Especial

“Temos um entendimento que para muitos deles vai ser bem difícil, pois já estão muito tempo acostumados. Sabemos que um tele entulho, por exemplo, é entre R$ 200 a R$250 reais, e muitos deles, às vezes, cobravam R$ 50”, aponta a vereadora. Mesmo assim, ela acredita que a alteração era necessária para que a cidade se adequasse aos novos tempos.

“É uma mudança que muitas cidades do Estado vem fazendo e que a gente não podia ficar para trás.” Quanto ao tema da garantia de fonte de renda dos carroceiros, Kayanne considera ser um papel que cabe ao governo. “Desde o início dessa política,era sabendo que todas as secretarias teriam que estar envolvidas, para que eles tenham alguma renda e para que muitos deles possam se reingressar no mercado de trabalho. O meu trabalho era legislar, propor a lei, e hoje eu agradeço ao Executivo por fazer essa execução da forma que a gente ache a forma correta para essas famílias.”

Prefeito da cidade, Luciano Orsi (PDT), diz que o Executivo já trabalha para que os carroceiros e carroceiras da cidade possam encontrar novas oportunidades no mercado de trabalho. “Vamos trabalhar vendo qual é a aptidão que eles têm, se eles têm alguma questão que gostariam de fazer e possam colocar, para que possamos oferecer algum tipo de capacitação.”

Orsi diz que o município estuda até mesmo um ação direta com as empresas terceirizadas que são responsáveis pelo paisagismo da cidade. “Vamos procurar a parceria das empresas para que dê uma prioridade para essas pessoas, para que eles dêem uma oportunidade e eles possam se recolocar no mercado de trabalho.”

Segundo o prefeito, a forma como essa parceria será realizada ainda está em análise. “A gente não pode obrigar, mas a gente vai fazer um contato, vai pedir para eles darem uma possibilidade e vai acompanhar também”, afirma Orsi dizendo que a empresa responsável pelas podas no município precisará de mais funcionários.

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