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ÔNIBUS LOTADOS E MUITA DEMORA

As dificuldades de quem usa a operação emergencial da Trensurb e trabalha em Porto Alegre

Passageiros reclamam de lotação dos ônibus e do tempo gasto para chegarem até o trabalho

Laura Rolim
Publicado em: 20/06/2024 às 18h:20 Última atualização: 20/06/2024 às 18h:38
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Ir até Porto Alegre usando a operação emergencial da Trensurb para percorrer parte do trajeto se tornou uma verdadeira jornada para o usuário do transporte público. Se antes a viagem costumava ser menos demorada e sem muitas complicações, agora, com estações entre Canoas e a capital fechadas por conta da enchente que atingiu a região em maio, há usuários que levam quase o triplo do tempo para chegar em seus compromissos.

 



 

Desde a retomada dos trens, no dia 30 de maio, quem pretende seguir viagem até Porto Alegre precisa embarcar em um ônibus da empresa Transcal no terminal da Estação Mathias Velho, em Canoas, que tem como destino final o Terminal Conceição. Com isso, o tempo de deslocamento aumentou, já que é preciso encarar o trânsito caótico da capital.

É o que relata a vendedora Maria Onilda, 56 anos, moradora de Sapucaia do Sul, que sai de casa todos os dias pouco depois das 6 horas para conseguir chegar no trabalho, em Porto Alegre, às 9h30. “Está muito demorado. É muita fila. Na maioria das vezes, preciso ir de pé depois de trabalhar o dia todo em loja”, relata.

A rotina é cansativa, afinal, a moradora só retorna para casa depois das 20h30, com sorte.

Maria Onilda, 56 anos | abc+



Maria Onilda, 56 anos

Foto: Laura Rolim/GES-Especial

“Sempre tem muita tranqueira. Chegar no horário está difícil. O patrão complica sempre”, afirma Maria.

Além de demorar mais tempo em cada trajeto, a vendedora também está gastando mais com os valores de passagem, mesmo com o trem gratuito. “Teria que ter mais ônibus em mais horários, e o trem ser mais rápido, mais ágil”, pede a trabalhadora.

Assim como a moradora de Sapucaia do Sul, outras milhares de pessoas enfrentam dificuldades com a inviabilidade de seguir com o Trensurb até Porto Alegre. Se antes o trajeto da Estação Novo Hamburgo até a Estação Mercado levava cerca de uma hora, agora, o passageiro pode levar 2h30 para conseguir completar todo o percurso e desembarcar no Terminal Conceição, em Porto Alegre.

Quem também teve a rotina alterada foi José Carlos Pereira de Souza, 50, morador do bairro Niterói em Canoas. Quando a operação dos trens era normal, ele saía de casa às 8h15, embarcava na estação Niterói e descia na Estação Mercado, onde trabalha em um prédio nas proximidades. A viagem durava no máximo 30 minutos.

José Carlos Pereira de Souza, 50 anos | abc+



José Carlos Pereira de Souza, 50 anos

Foto: Laura Rolim/GES-Especial

Agora, no entanto, ele leva quase três horas para conseguir chegar ao trabalho, pois pega um ônibus às 6 horas até a Estação Mathias Velho, onde faz a baldeação até o Terminal Conceição, e depois segue a pé até o destino final.

“Em dia de chuva é pior. Estou gastando R$ 2 a mais por dia, e antes eu não precisava sair tão cedo. É muito cansativo”, diz Souza. Além disso, ele afirma que a volta costuma ser ainda pior. “O ônibus lota muito rápido. Às vezes, tenho que esperar uns 20 minutos até vir o próximo. Chego em casa depois das 20 horas sempre”, descreve o síndico.

Trajeto mais demorado entre Novo Hamburgo e Porto Alegre

Para entender na prática como o trabalhador foi impactado após as enchentes que atingiram a região, a reportagem saiu da Estação Novo Hamburgo na quarta-feira (19), às 7h12, e desceu na última estação em funcionamento, a Mathias Velho, por volta das 7h50.

Até aí, o caminho parecia tranquilo e rápido. O trem começou a encher a partir da Estação Santo Afonso, mas foi na Estação Sapucaia que o fluxo de pessoas passou a ser maior.

“Sem muitos problemas aparentes na operação do trem, já que cumpriu o tempo previsto (22 minutos de intervalo entre as viagens), a reportagem desceu do vagão na Estação Mathias Velho junto com centenas de pessoas. Todos se dirigiram para o mesmo local: o terminal de baldeação dos ônibus.

Em dias de chuva, como na quarta, o passageiro é obrigado a se molhar até conseguir entrar na lotação, pois ao descer da passarela do trem, é preciso caminhar por alguns minutos em uma área sem cobertura. Ao chegar no terminal, filas quilométricas começam a se formar para entrar nos ônibus da Transcal, que encostam de três em três. Sem opção, muitos precisam aguardar na chuva até que chegue a sua vez de embarcar nos veículos.

Eles saem da Estação Mathias Velho lotados de pessoas sentadas e em pé, por isso, muitos acabam não conseguindo lugar para sentar. Para entrar no ônibus, demoramos cerca de 10 minutos. Depois de todos embarcarem, a lotação saiu do terminal por volta das 8h15.

Por conta do trânsito, esse trajeto de ônibus em horário de pico pode levar horas. Na quarta, a reportagem chegou a ficar mais de meia hora parada no entroncamento da free way. Isso porque, em dias de chuva, o trânsito fica mais carregado.

Naquele dia, por exemplo, chegamos ao Terminal Conceição, em Porto Alegre, às 9h40, 2h30 depois de sairmos de Novo Hamburgo rumo à capital, em um trajeto que antes levaria no máxima uma hora.

Paulo Ricardo de Souza Soares, 36, morador do bairro Igara, em Canoas, foi um dos passageiros que chegou 1h30 depois no trabalho por conta da demora no deslocamento.

Segundo o diagramador, o tempo de atraso terá de ser descontado do banco de horas. “Eu sempre acabo chegando atrasado e às vezes preciso ficar trabalhando depois do horário”, diz.

Paulo Ricardo de Souza Soares, 36 anos | abc+



Paulo Ricardo de Souza Soares, 36 anos

Foto: Laura Rolim/GES-Especial

Conforme Soares, ele também está gastando mais com transportes por aplicativo. “Eu chego muito tarde na estação na volta para casa. Aí, preciso gastar com Uber porque os ônibus não têm muita regularidade e eu demoraria ainda mais tempo para chegar”, afirma.

O diagramador também reclama da segurança durante a noite. “Não é muito seguro pegar um Uber ali. Só vi uma vez a Polícia na região”, observa Soares.

Ônibus lotados, atrasos e gastos extras

As principais reclamações dos usuários são relacionadas à lotação dos ônibus e à dificuldade da volta, em que muitos precisam aguardar mais de 20 minutos até a chegada do próximo ônibus, pois todos saem lotados dos terminais.

Para não correr riscos de atrasos, muitos passageiros, assim como Paulo, estão precisando desembolsar com transporte de aplicativo. Além disso, mesmo sem a cobrança da passagem do trem, os usuários estão gastando mais, já que o valor da tarifa do ônibus é de R$ 6,85.

Débora Peletti, 28, por exemplo, paga quatro passagens por dia, sendo que anteriormente eram apenas duas, quando pegava o trem na Estação Canoas e seguia até o Mercado. Agora, ela precisa pegar um ônibus até a Estação Mathias e depois a baldeação até o Terminal Conceição. Ela também reclama das filas na volta para a casa.

“Sempre preciso esperar na fila, que faz a volta no terminal. Temos que esperar uns dois ônibus e pegar o terceiro”, relata. Como sugestão, Débora pede que os atrasos nos ônibus sejam evitados. “Talves tenha muita gente para pouco ônibus”, completa.

Sem trânsito carregado, retorno a Novo Hamburgo foi mais rápido

Já na volta para Novo Hamburgo, o trajeto demorou um pouco menos. A reportagem pegou o ônibus às 10h07 no Terminal Conceição e chegou às 10h30 na Estação Mathias Velho. Embarcamos no trem às 10h48, e a chegada na Estação Fenac foi às 11h26.

A professora Janaíne da Luz Pereira, 52, era uma das passageiras que fazia o trajeto de Porto Alegre para São Leopoldo, onde dá aula em uma escola municipal. Assim como tantos outros, ela também tem passado dificuldades no deslocamento para a região metropolitana.

 Janaíne da Luz Pereira, 52 | abc+



Janaíne da Luz Pereira, 52

Foto: Laura Rolim/GES-Especial

“Esse caos alterou tudo na vida da gente. Deveriam disponibilizar mais ônibus da Transcal. Um ônibus a mais faz bastante diferença. Parece que mandam à conta gota os veículos”, reclama. Ela normalmente espera a chegada do transporte, pois se recusa a enfrentar a viagem toda em pé. “Se eu tiver que ir em pé eu não aguento. É muita peregrinação para o meu gosto”, expõe Janaíne.

Ela também reclama sobre a falta de segurança no Terminal Conceição quando volta para a casa. “Aquele viaduto é uma insegurança fora do normal. A Transcal nunca nos deixa embaixo do viaduto, então precisamos caminhar ainda mais, olhando para os lados, com medo de ser assaltada”, conta Janaíne.

Ela aproveita para pedir que a logística dos terminais sejam repensadas. “Agora que as águas baixaram, por que não transferir esse terminal lá em Porto Alegre para o Mercado Público? É um local que nós nos sentimos mais seguros, fica mais acessível e mais fácil para todo mundo”, questiona a professora.

Transporte de ônibus de Novo Hamburgo a Porto Alegre

Uma opção para quem não quiser enfrentar tanta logística é ir de ônibus metropolitano de Novo Hamburgo a Porto Alegre, através da Central Transportes. Há saídas de Canudos, às 5h40 e às 15h20, e da Rodoviária Velha, às 5h50 e 17 horas.

Já de Porto Alegre para Novo Hamburgo, com saída do Viaduto da Conceição, os horários são: 6h20, 7 horas, 7h30, 15 horas, 17 horas, 17h40, 18h10 e 18h35.

Linha do tempo da operação da Trensurb

3 de maio – Trensurb recolheu todos os trens e interrompeu as viagens na região metropolitana por conta da enchente que atingiu o Rio Grande do Sul;

28 de maio – Depois de mais de 20 dias fora de operação, a estatal confirmou a retomada das operações;

30 de maio Retomada do serviço, com fluxo entre as Estações Novo Hamburgo e Mathias Velhos (Canoas), com tarifa gratuita, entre às 8 horas e às 18 horas, com intervalos de 35 minutos e transbordo na Estação Unisinos;

3 de junho – Trensurb amplia horário da operação, das 6 horas às 20 horas diariamente, entre as Estações Mathias Velhos e Novo Hamburgo, intervalo entre as viagens de 35 minutos e transbordo na Estação Unisinos.

13 de junho – Trensurb reduz intervalos entre as viagens para 20 minutos e amplia horários de operação para das 6 às 21 horas. Com o recolhimento dos trens que estavam na via para o pátio da empresa, foi eliminada a necessidade de transbordo na Estação Unisinos.

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