JULGAMENTO HISTÓRICO
Marco temporal: STF derruba tese e dá vitória a indígenas; veja como votou cada ministro
Maioria entendeu que o direito das comunidades a territórios que tradicionalmente ocupavam não depende de uma data fixa
Última atualização: 21/09/2023 18:46
O Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou, nesta quinta-feira (21), a tese do marco temporal, que diz que povos indígenas só poderiam reivindicar terras que ocupavam em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
O julgamento é histórico e começou em 2021, a partir de um caso específico que diz respeito a uma ação de reintegração de posse movida pelo governo de Santa Catarina contra o povo Xokleng. O resultado, contudo, deve determinar o futuro de mais 300 territórios ocupados por povos originários em todo o País.
Como votou cada ministro
- Contra o marco, votaram o relator do caso, Edson Fachin, assim como os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso, Dias Toffoli, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Rosa Weber. Os nove entendem que o direito das comunidades a territórios que tradicionalmente ocupavam não depende de uma data fixa.
- Os ministros Nunes Marques e André Mendonça votaram a favor da tese.
Aposentadoria
Como mostrou o Estadão, a ministra Rosa Weber, presidente do STF, vê o caso como uma pauta prioritária e fez o possível para concluir a votação antes de sua aposentadoria, que deve ocorrer nos próximos dias.
Rosa já demonstrou proximidade com a questão indígena. Ela foi a primeira presidente do STF a visitar uma tribo institucionalmente, ao ir ao Vale do Javari, em março, onde morreram o indigenista Bruno Pereira e o jornalista inglês Dom Phillips. Na ocasião, prometeu pautar o marco temporal. A ministra também visitou a tribo Yanomami e lançou a primeira Constituição brasileira traduzida para a língua indígena Nheengatu.
Divergências
Mesmo com a maioria, o julgamento não está concluído, já que mesmo entre os ministros que se opõem à proposta há divergências, principalmente no que diz respeito à indenização dos proprietários atuais do território. A tese será fixada na próxima semana.
Marco temporal no Congresso
A decisão do STF enterra a tese do marco temporal na Corte, mas não encerra a batalha institucional sobre o assunto. Isso porque, paralelamente ao julgamento, o Congresso também vota uma um projeto sobre o tema.
Demanda da bancada ruralista, o projeto de lei 490/2007, conhecido como PL do Marco Temporal, já foi aprovado em maio pela Câmara dos Deputados, sob protesto de parlamentares de esquerda e movimentos indígenas.
A proposta atualmente está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Em votação desta quarta-feira, 20, gerou discussões entre os senadores, que mandaram recado ao STF; ‘não somos menores que ministros’.
No entanto, especialistas ouvidos pelo Estadão avaliam que, com a decisão do STF, o projeto de lei será colocado em xeque. O PL trata de outros temas, que podem seguir tramitando, mas o trecho sobre o marco temporal precisará ser revisto.
“Entendo que o PL, internamente, até poderia tramitar contudo o STF poderia novamente declarar sua inconstitucionalidade. Ou seja, ele seria inócuo. Não surtiria efeitos na prática”, explica o constitucionalista Georges Abboud, sócio do Warde Advogados e professor da PUC de São Paulo.
Se os parlamentares insistirem na votação do PL, o Supremo Tribunal Federal tem pelo menos dois caminhos disponíveis. O primeiro, mais cauteloso, é aguardar a movimentação no Congresso e, se o projeto for promulgado, esperar o ajuizamento de alguma ação para eventualmente derrubar o texto. A segunda alternativa seria um controle prévio de constitucionalidade. A atuação preventiva acontece, via de regra, quando há risco de violação de cláusulas pétreas da Constituição.