Alvo de ataques negacionistas durante a pandemia de Covid-19, as vacinas perderam adeptos em várias partes do mundo, mas, no Brasil, ainda têm amplo apoio da população. Enquanto movimentos contra a imunização ganharam força em todo o planeta, entre os brasileiros, no último ano, houve mobilização pela incorporação de novos imunizantes no Sistema Único de Saúde (SUS).
Mãe de um bebê de 1 ano de idade, Juliane Fetzer iniciou, em julho deste ano, uma campanha pela inclusão da vacina meningocócica B no calendário do Programa Nacional de Imunizações (PNI) após perder o filho, vítima de meningite bacteriana. Atualmente, a vacina para esse tipo de meningite está disponível apenas na rede privada, a um custo de cerca de R$ 600 a dose.
Em um abaixo-assinado online, em menos de três meses, Juliane obteve o apoio de mais de 115 mil pessoas pela inclusão da meningo B no SUS. Mas, além da ampliação de tipos de imunizantes no calendário nacional, ela alerta para a necessidade de que os pais garantam a vacinação básica dos filhos. Depois da morte de Arthur, Juliane mobilizou Estância Velha, onde foi feito um mutirão de checagem das cadernetas de vacinação das crianças.
Dados do Ministério da Saúde mostram que, embora as vacinas tenham ampla adesão no País, nos últimos anos as coberturas têm apresentado queda. No caso específico de imunizantes que previnem a meningite, as coberturas variaram entre 57% e 90% da população-alvo. A maior cobertura é alcançada pela BCG, com 90,06% do público-alvo vacinado em 2022. Depois, vem a pneumocócica, com 81,51%; a meningogoco C, com 78,63%; e a pentavalente (contra difteria, tétano, etc) com 77,24%.
A pior cobertura entre as vacinas de meningite é a da meningocócica ACWY, disponível apenas para adolescentes, com somente 57,98% do público-alvo vacinado.
“É importante entender que não é só a questão da meningite, mas todas as vacinas são extremamente importantes. Infelizmente, nos últimos anos ou meses as pessoas foram muito ‘poluídas’ com algumas desinformações na época da covid. Vacinas para crianças são estudadas e, por causa delas, são anos de diminuição gritante de todas doenças que antes existiam em uma magnitude maior. Vacinas previnem”, defende Juliane.
De janeiro de 2022 a julho deste ano, somente na plataforma Change.org, que reúne abaixo-assinados sobre diversas causas, foram abertas 16 petições para ampliar o acesso aos imunizantes no País. O escopo de pedidos é amplo e inclui desde a disponibilização de vacinas contra o vírus do herpes-zóster até maior conscientização a respeito da vacinação de bebês prematuros.
“Por entender que vacinas salvam vidas e por saber que o calendário vacinal do prematuro é específico, a gente precisa informar que não é sair do hospital e seguir o calendário básico. Tem imunizações específicas para ele”, argumenta Denise Suguitani, diretora da ONG Prematuridade.com.
A nutricionista criou uma petição para buscar promoção de campanhas relacionadas às especificidades do calendário vacinal do prematuro e divulgação dos protocolos de acesso a vacina e pontos de referência no serviço. Outra demanda é pela ampliação da cobertura de vacinas independentemente da quantidade de semanas do bebê prematuro.
O infectologista Eder Gatti, diretor do Departamento de Imunização e Doenças Transmissíveis do Ministério da Saúde, afirmou ao Estadão que a pasta analisa a atualização do calendário do PNI, mas que o processo leva em consideração critérios importantes que devem ser observados.
“O processo de incorporação de vacinas precisa obedecer a várias etapas. Primeiro, a gente precisa ter um cenário epidemiológico que justifique a incorporação da vacina. A gente precisa ter a garantia de que o produtor vai abastecer o Brasil, e isso demanda escala. Precisamos de planejamento orçamentário e de transferência de tecnologia, que, muitas vezes, ajuda a garantir abastecimento com produção nacional. Hoje, o programa vislumbra, sim, atualizar seu calendário, mas essa é uma discussão que deve obedecer todos esses critérios”, explica.
Aumento da cobertura vacinal
Gatti argumenta ainda que retomar a cobertura vacinal dos imunizantes que já estão no calendário é fundamental para o sucesso da política de imunização no Brasil. No ano passado, por exemplo, a cobertura da vacina contra a poliomielite ficou em 77,19%, bem abaixo da meta de 95%.
“Antes de discutir qualquer nova incorporação, a gente precisa garantir que, em relação ao que oferecemos no País, a vacinação aconteça numa condição ótima”, disse Gatti. “Neste ano, a gente espera reverter a tendência de queda das coberturas vacinais”.
Para ampliar a cobertura vacinal no País, o Ministério da Saúde está utilizando duas estratégias: o microplanejamento, que consiste em traçar estratégias locais para efetivar a vacinação, e a multivacinação, uma espécie de mutirão para atualizar as cadernetas de vacinação dos brasileiros.
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A pediatra e diretora da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Isabella Ballalai, afirma que a pasta precisa garantir que as pessoas que buscam vacinas consigam de fato se vacinar, o que inclui melhorar a dinâmica de funcionamento das unidades básicas de saúde e a formação dos profissionais que estão na ponta.
“Tem na cultura do brasileiro a lembrança de que a vacinação mudou o País, que a gente deixou de ter a mortalidade infantil que tinha. Os avós viram isso, os bisavós, os mais jovens não viram essas doenças, mas têm isso na sua cultura. Temos uma cultura muito sólida de vacinação. É claro que ela foi abalada pelas fake news. Mas, apesar de tudo isso, durante a pandemia, a gente foi um dos países que atingiu cobertura vacinal mais rápido do que muitos países que tinham vacinas antes. A gente precisa ter uma comunicação empática. O ministério precisa mostrar que está preocupado com as pessoas e não com a cobertura vacinal”, pontua.
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