Em dezembro de 2023, João, de 28 anos, decidiu tirar a cidadania portuguesa por acestralidade. Para isso, ele precisava da certidão de casamento dos pais. E foi este documento que revelou apenas a ponta do iceberg de mentiras da família, inclusive sobre a própria identidade do jovem.
Sobre os pais, João afirmou nas redes sociais: “Eles me privaram de tudo que era essencial para ter crescido saudável. Agora, eu não sei onde eu nasci, eu não sei se a data de nascimento que está escrito na certidão é verdadeira, porque a cidade provavelmente também não é, nem meu mapa astral eu tenho direito.”
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A história, que começou com algumas descrepâncias em documentos, foi se revelando cada vez mais bizarra. Como o próprio disse nos vídeos, nem mesmo filmes fariam um roteiro tão cheio de plot twists.
Uma família escondida em Pelotas
Ainda no cartório, João começou a ler os documentos e se deparou com várias inconsistências entre o que a família havia contado e o que estava na certidão.
“A primeira coisa que eu reparei foi a idade da minha mãe”, contou ele nas redes sociais. Na certidão, ele pode ver que a mãe era nove anos mais velha do que dizia.
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Mas a informação mais bizarra de todas foi a data do casamento. O jovem descobriu que os pais se casaram apenas em 2006.
“O que não fazia sentido, já que eu nasci em 1996. E eu sei que eles estão juntos desde o meu nascimento, segundo a história que eles me contavam, que estavam tentando engravidar pelo menos 4 anos antes de eu nascer”, disse no TikTok.
Ele também notou que a mãe, que dizia nunca ter estado com outro homem sem ser o pai de João, era divorciada e que eles haviam se casado em Balneário Camburiú, cidade de Santa Catarina. Para eles, ambos contavam que passaram a vida em Guarapava, Paraná, onde ele nasceu.
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“Tudo isso aqui me gerou um alerta vermelho”, explicou. “Tem alguma coisa acontecendo aqui e eu vou descobrir”, concluiu no primeiro de mais de cinco vídeos que postou nas redes, contando a história.
A partir deste momento, João, que até então era Dias, foi atrás da verdade. A busca se tornou uma série de publicações nas redes sociais, com a que mais viralizou sendo: “O dia que eu descobri que a minha família era muito suja”.
Nome falso e história fabricada
O jovem médico decidiu ir atrás dos documentos sobre os avós maternos, dos quais não sabia muita coisa, apenas as histórias que a mãe contava.
Ela dizia que os pais dela faleceram antes dele nascer, mas as certidões mostravam que era outra mentira: o avô morreu em 2011 e a avó em 2020. “Eu já fiquei desesperado com isso aí.”
A avó, na verdade, viveu em uma colônia de italianos, em Pelotas, Rio Grande do Sul. Isso era drasticamente diferente das histórias que ouviu enquanto crescia, de que os avós eram ricos, fazendeiros com muitas terras e que, após a morte de um deles, o outro teria “enlouquecido” e perdido tudo.
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Ainda, a mãe já havia tido, pelo menos, três nomes diferentes, contando com o que usava atualmente. E, apesar de afirmar ser filha única, tinha mais cinco irmãos. Com os nomes dos tios em mãos, João foi atrás de pelo menos um, para descobrir o que estava acontecendo.
Encontrando a família da mãe
Procurando pela internet, João encontrou alguns irmãos da mãe dele e tentou contato. Na mensagem para os tios, o médico contou a história toda, inclusive, a parte em que a existência dos parentes havia sido omitida durante toda a sua vida.
Assim, ele descobriu que a mãe havia ido embora de Pelotas, dizendo que estava indo para o Paraná, e nunca mais entrou em contato. “Eles tentaram encontrar ela, mas era uma família muito humilde, naquele tempo não existia internet, eles não tinham celular”, explica.
Em 2024, no carnaval, João encontrou com os tios e disse que, apesar de tudo, ganhou uma família.
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Confrontando os pais
Após confrontar os pais e não obter respostas, João decidiu que iria compartilhar a história nas redes sociais. O primeiro post que fez acabou viralizando e, a partir de então, eles começaram a se afastar dele.
“Depois disso, meu pai tomou atitudes horrorosas, começou a falar para as pessoas mentiras sobre mim”, desabafa. “Que eu era um drogadito, um bandido, delinquente, mentiroso.”
Eles se negaram a fazer testes de DNA. Então, restou a João fazer um e colocar em bases de dados, como a Genera, para tentar encontrar a verdade.
De gravidez de trigêmeos à adoção ilegal
“Eu sempre achei que tinha alguma coisa estranha acontecendo. Desde criança, eu sempre perguntava se era filho adotivo e eles sempre, prontamente, respondiam que não.”
A mãe de João sempre contou a ele que estava grávida de trigêmeos, dos quais ele era um. Mas, eles haviam morrido ainda no útero e apenas ele nasceu, inclusive, em casa e prematuro. “Eu nunca consegui acreditar nessa hitória toda.”
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Sobre a infância, ele relembra como teve apoio financeiro, mas nunca emocional e afetivo. “Apanhei muito. Tiveram momentos em que eu já fui levantado pelo pescoço pelo meu pai. Ele bebia muito quando eu era criança.”
Foi uma pessoa próxima à família que contou algo revelador: as chances eram grandes de que ele tenha sido roubado ou adotado ilegalmente. “A história que eu recebi é a seguinte: o meu avô, pai do meu pai, simplesmente trouxe uma criança de Cornélio Procópio pro meu pai e minha mãe cuidar”, contou.
Cornélio Procópio, no Paraná, é a cidade que o pai de João Dias nasceu e também onde os avós paternos moravam.
As hipóteses que pairavam na cabeça do jovem era de que ele pudesse até ser filho do avô, já que fisicamente é parecido com a família. “É o tipo de coisa que eu sei que meu avô faria.”
Ele lembra ainda que os pais chegaram a cogitar a adoção ilegal da irmã dele, quando ainda estavam no processo, mas não conseguiram.
E, com o teste de DNA, ele conseguiu ver: João não tinha qualquer ligação genética com os pais ou outras pessoas da família. Mas, então, de onde ele veio?
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Afinal, João descobriu a origem?
Após meses de procura incessante, João finalmente descobriu a origem. Em um vídeo, públicado nas redes sociais, ele anuncia: “Eu sei o que aconteceu comigo e da onde eu vim”.
E isso só foi possível por conta do primeiro vídeo que ele postou nas redes, que chegou até a pessoa que foi parte fundamental da história.
Em 22 de janeiro de 1996, essa pessoa, que ele decidiu manter anônima, foi chamata até um hospital de Guarapuáva para pegar uma criança: João. Ela deveria levá-lo para a família que, por fim, o criou.
No hospital, uma mulher entrou no carro com João, no colo, e uma sacola plástica. Ao chegar na rodoviária da cidade, ela desembarcou, deixando o bebê. “E nunca mais se ouviu falar dela”, terminou ele. Porém, esse não é o final.
João encontra os pais biológicos
Com os resultados do exame de DNA que João havia feito, ele foi buscando graus de parentesco que fossem mais próximos, junto com outras pessoas, e acabou achando, possivelmente, os tataravós.
E, assim, eles desconfiaram que João pudesse ter vindo de um dos filnhos de Marino Mallman, o Adão. Eles começaram, então, a perguntar para os descendentes se havia uma história na família de alguma criança que foi adotada ou vendida.
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João conseguiu encontrar um homem que acreditava que João fosse filho do irmão dele. Eles fizeram um exame de DNA, que confirmou a suposição.
Este homem havia tido uma relação extraconjugal com uma funcionária da chácara onde moravam, em Turvo, no Paraná. Quando ela ficou grávida, a família voltou ao Rio Grande do Sul.
Ele quem disse também as informações para que João encontrasse a mãe, Ana Maria. Ela mora em Apucarana, no Paraná. Eles fizeram um exame de DNA que confirmou o parentesco.
Um reencontro emocionante
Os dois se encontraram pessoalmente e o Fantástico mostrou o reencontro de mãe e filho, 28 anos depois que Ana entrou no carro da mulher anônima e entregou João.
Ela contou que foi sozinha para a maternidade e lá uma enfermeira a convenceu que entregar o bebê seria o melhor, já que a família era rica e poderia dar uma vida melhor do que ela.
“Eu me senti mais nojenta”, disse ela ao programa. “Eu vendi meu filho. Era isso que eu pensava”, concluiu. Mas João não vê assim, apenas uma mulher com poucas condições, passando por uma situação complicada.
Agora, ele pretende mudar de nome legalmente e, nas redes sociais, já usa o sobrenome da família que descobriu ter: Mallman.
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O que dizem os pais adotivos de João
Para o Fantástico, os pais se manifestaram pelo advogado. “O João é deixado na porta daquele lar e é acolhido por aquela família. Sequer a família conhece a família biológica de João ou a pessoa que entregou o João para que eles pudessem adotá-lo”, afirma Marinaldo Ratter, advogado dos pais adotivos”, escreveu.
Ainda, eles afirmam que há uma “história verdadeira”, que não foi contada ainda para João, por medo de magoá-o.